Esta empresa faz a diferença
06/08/2004
- Opinión
Michael Haradom era soldado do exército de Israel. Pelo que viu
e viveu, tornou-se pacifista. Veste-se inteiramente de branco,
sempre. Veio para o Brasil em 1975. Fundou em São Paulo uma
empresa de produtos químicos: a Fersol.
Em 1995, Haradom devia US$ 10 milhões. Todos os amigos o
aconselharam a fechar a empresa. Ousado, reuniu os funcionários
e comunicou que, a partir daquele dia, o piso salarial seria de
R$ 500. O aumento elevou a auto-estima dos trabalhadores. A
produção aumentou. Neste ano, a Fersol faturará US$ 100 milhões.
Hoje, o piso salarial na empresa é de R$ 1.350. Dos
funcionários, 61% são mulheres (ocupam, inclusive, a função de
motoristas, dirigindo todos os veículos da empresa); 38%
afrodescendentes; 26% têm mais de 45 anos, e 3% são portadores
de talentos especiais. Não há restrição para admitir portadores
de HIV.
A Fersol, que visitei há pouco, vai além da legalidade. Pratica
justiça, pois não considera direitos do trabalhador como
privilégios. A mãe que fica em casa seis meses para amamentar
seu bebê merece dois meses de licença do pai, para que ele possa
acompanhá-los. O benefício inclui pais e mães de bebês adotivos.
O valor do auxílio-creche, de R$ 200, ultrapassa o estabelecido
em lei e beneficia crianças até cinco anos.
A ginástica laboral visa prevenir lesões por esforços
repetitivos (LER) e reduziu em 60% as horas antes consumidas em
tratamentos médicos e repousos. A cada quatro meses a empresa
organiza visitas a reservas ambientais, abertas a familiares e
amigos dos funcionários. Em suas casas passa, semanalmente, o
caminhão de coleta de lixo reciclável, separado pela família.
A Fersol participa do Fome Zero. Cada funcionário destina,
voluntariamente, 1% de seu salário à aquisição e distribuição de
cestas básicas aos assentamentos rurais da região. São cerca de
3 toneladas de alimentos por mês.
Em 1996, foi criada a Escola Fersol, que desenvolve o programa
Analfabetismo Zero e oferece cursos supletivos baseados na
Cultura da Paz e na metodologia de Paulo Freire. A escola,
edificada no terreno da empresa, atende até 500 alunos,
inclusive familiares e pessoas da comunidade. Oferece ainda
ensinos fundamental e médio. Possui biblioteca com mais de 1.200
títulos, salas de informática e meio ambiente (onde funciona o
Museu Ecológico Chico Mendes).
A Fersol supera a responsabilidade social empresarial. Promove
cursos de Formação Política, com o intuito de despertar em seus
funcionários o espírito crítico e a participação militante na
vida social. Nas aulas, abertas à comunidade, são debatidos
temas como história do Brasil, partidos políticos, políticas
públicas, corrupção, globalização, democracia etc. Desde 1998,
em anos eleitorais há o "debate do eleitor", em que candidatos
de diferentes partidos são convidados a expor suas propostas.
Neste ano, todos discutem, com representantes do empresariado e
da CUT, a reforma trabalhista proposta pelo governo federal.
A Fersol participou do plebiscito sobre a ALCA, em 2002, e
promoveu encontros sobre a reforma agrária com dirigentes do
MST. A empresa comemora, de modo especial, os dias da Mulher, do
Trabalhador, da Criança, do Meio Ambiente e da Consciência
Negra.
Michael Haradom descobriu que trabalhador politizado é mais
responsável e produtivo. Quando outros empresários, perplexos,
indagam por que ele desperdiça dinheiro pagando um salário
mínimo de R$ 1.350, Haradom diz a verdade: "Não se trata de
gasto, mas de investimento". No próximo ano, o faturamento da
Fersol chegará a US$ 200 milhões.
A empresa foi uma das primeiras, do setor químico no Brasil, a
receber a ISO 14001, que concerne à questão ambiental, além de
merecer a ISO 9001:2000 (qualidade). Em 2003, a Fersol foi
considerada uma das 40 melhores empresas para a mulher
trabalhar. Possui ainda os selos "Balanço Social", do Ibase;
"Empresa Cidadã", da Câmara Municipal de São Paulo; "Empresa
Amiga da Criança", da Fundação Abrinq; e "Empresa Legal", do
Prêmio Motiva de Responsabilidade Social 2004.
O grande mérito de Haradom é encarar seus funcionários como
parceiros e não como meros empregados. E querer propiciar à
família de cada um deles condições de uma vida digna e feliz.
* Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Paulo Freire e
Ricardo Kotscho, de "Essa Escola Chamada Vida" (Ática), entre
outros livros.
https://www.alainet.org/de/node/110324?language=es
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