Que democracia?
09/03/2005
- Opinión
O presidente Bush andou pela Europa, reiterando sua ameaça contra todos os países que não sejam “democráticos”. Estranha atitude esta, do mandatário da nação mais poderosa do mundo. Fala em democracia, que de imediato supõe respeito pela soberania dos países, mas acena com intervenção armada para impor à força a vontade do império. Que democracia é esta?
Neste contexto, recebe relevância especial a advertência do Papa, velho sentinela de critérios autênticos, alertando que a democracia não é um valor absoluto. Foram palavras ditas não para suscitar um debate teórico sobre regimes políticos. Mas para se contrapor à arrogância americana, de ditar normas a todos os países pela ameaça do seu poderio militar.
Por mais que os regimes democráticos expressem um ideal a ser continuamente buscado por todos os países, nunca se pode pretender que uma forma determinada de regime político seja tão perfeita que necessariamente deva ser impingida à força às nações que ainda não a adotam formalmente.
A situação mais evidente de contradição prática desta postura americana é o caso do Iraque. De que serve impor a democracia, se para isto é necessário destruir um país?
As palavras do Papa deixam claro que não se pode invocar a diferença de regimes políticos como pretexto para intervenção militar. Inclusive porque outras formas de governo podem proporcionar o que a democracia fundamentalmente busca, que é a igualdade, o respeito à liberdade das pessoas, e a possibilidade de convivência harmônica dos cidadãos.
Vale também o reverso da medalha. Muitos países podem ter só fachadas de democracia, mas na verdade estão longe de garantir estes direitos aos seus cidadãos.
Existe outra constatação mas séria a fazer. E’ preciso perguntar de maneira mais ampla para que servem as democracias. Pois elas podem se transformar nos regimes mais adequados para o império repassar os seus interesses hegemônicos, e salvaguardar os lucros do capital financeiro transnacional. Está ficando cada vez mais claro que no entender do poder hegemônico, ser país democrático hoje significa enquadrar-se, submissamente, ao sistema dominante, de tal modo que os ditames dos interesses econômicos possam fluir tranqüilamente, porque avalizados por governos democraticamente eleitos. País democrático é aquele que paga em dia suas dívidas, mesmo que para tanto faça os “ajustes estruturais” que na prática anulam os objetivos de uma verdadeira democracia.
Está na hora de desconfiar das justificativas formais dos regimes políticos. Precisamos perguntar de que valem as democracias, se deixamos que elas se tornem instrumentos de negação prática de nossos direitos e de perda de nossa soberania.
As lutas sociais tinham desenhado o sonho de um país que todos gostaríamos de ter. Politicamente democrático, economicamente justo, socialmente eqüitativo, culturalmente plural, ecologicamente sustentável. Mas o que é que está solapando, na prática, a consecução destes objetivos salutares?
“Quando aprendemos as respostas, trocaram as perguntas!” E’ necessário repensar o Brasil que nós queremos. Pois não basta pintar a fachada com as cores oficiais da democracia. E’ preciso ver se ela acontece na prática. E’o desafio que de novo se propõe a Quarta Semana Social Brasileira, que terá neste ano o seu momento nacional no próximo mês de outubro.
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