Pastoral de férias

11/03/2005
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Andei pelo litoral brasileiro entre o Natal e o Ano-Novo. Estive em capelas consagradas a São Pedro, o pescador. Aos domingos e dias festivos atraem turistas católicos que não tiram férias de suas práticas religiosas. No Sul, era grande a freqüência de fiéis argentinos, uruguaios e chilenos. As missas careciam de expressão. O padre, cansado de celebrar tantas vezes num mesmo dia, pulando de capela em capela, parecia mais querer livrar-se do fardo do dever que avivar a fé daquela gente. Numa das capelas, no domingo, festa da Sagrada Família, o celebrante nem chegou a tempo. Ficou entalado no trânsito. Graças a Deus, os ministros da eucaristia encontraram, entre os presentes, um padre que passava férias numa casa da família. Isso após esperar uma hora. O crescimento das Igrejas evangélicas, pentecostais e neopentecostais não me preocupa. Pelo contrário, o Espírito Santo age também através delas e as sementes do Evangelho, como diz o Concílio Vaticano II, frutificam naquelas comunidades. Sou avesso a qualquer espírito ou atitude de concorrência religiosa. Até porque sei que Deus não tem religião nem pertence a uma Igreja. Inquieta-me é como a Igreja católica perde tantas oportunidades de fortalecer o seu rebanho. Uma delas é devido à ausência de uma Pastoral de Férias, do Turismo ou do Lazer. Muitos fiéis só entram numa igreja nos dias de Natal e Ano-Novo. E devem sair desolados diante de uma missa repleta de cantos modernosos mas vazia de encanto litúrgico. Nem folhetos para que os fiéis acompanhem as orações são distribuídos. O clima é mais de quem se livra de um dever preceitual. Uma Pastoral de Férias exigiria, em primeiro lugar, descentrar-se da onipresença do sacerdote. Não faz sentido o sacerdócio enfeixar tantos ministérios. Assim, não há como agilizar a evangelização. A formação de um padre requer quatro anos de filosofia, quatro de teologia e a heróica virtude do celibato. A de um pastor se faz (precariamente, é verdade) em poucos meses, sem que ele corte vínculos com a vida familiar e profissional. Assim, fica mais próximo da realidade de seus fiéis e estes se sentem mais identificados com ele. Falam a mesma língua, sem a carga dos conceitos acadêmicos. Apesar do Concílio, a Igreja Católica não permite ao leigo casado o acesso ao sacerdócio. Sem um maior número de ministros, não há como multiplicar e diversificar ministérios. Nem como fazer a Palavra disseminar-se por uma nação tão vasta como o Brasil. As Comunidades Eclesiais de Base prosseguem apontando uma alternativa pastoral desclerizada, de efetiva participação do laicato na missão da Igreja. Mas arrefece o entusiasmo de bispos e padres por esse modelo pastoral que torna os leigos críticos, ousados, capazes de articular em suas vidas a relação dinâmica entre fé e política. Numa estrutura hierarquizada, ovelhas dóceis e submissas convêm melhor a pastores temerosos de perder poder. Uma Pastoral de Férias supõe leigos bem preparados. Na capela à beira da praia, repleta de jovens e crianças, fiquei imaginando como seria bom avisar às famílias (e era o domingo da Sagrada Família) que na tarde do dia seguinte haveria uma apresentação teatral do nascimento de Jesus, para as crianças; uma gincana catequética para os jovens; palestras de introdução à Bíblia para os adultos; reza do terço; aula de meditação; formação de um coral de férias etc. Claro, sem que a agenda ficasse na dependência do padre. Isso supõe a mobilização dos paroquianos, não só dos residentes na área, mas também dos turistas, pois uma simples indagação seria suficiente para levantar, entre as famílias em férias, pessoas em condições e disposição de dar uma contribuição construtiva. Eu mesmo teria me oferecido. Mas ali não havia um vigário ou um bispo preocupado em evangelizar o rebanho acidental. Porém, graças a Ele, descobriu-se até um sacerdote que se dispôs a substituir o que ficara retido no trânsito. E cumpriu-se o preceito (?) de uma Igreja que, às vezes, me dá impressão de estar retida no trânsito da modernidade à pós-modernidade, sem saber que rumo tomar e apostando no fenômeno efêmero de um espiritualismo que enche templos e vende CDs, DVDs e filmes, mas está longe de ser a casa firmada na pedra, à qual se referiu Jesus. A Semana Santa se aproxima. Tomara que os fiéis não encontrem apenas Jesus morto. * Frei Betto é escritor, autor de “Treze contos diabólicos e um angélico” (Planeta), entre outros livros.
https://www.alainet.org/de/node/111573?language=es
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