A base de Manta

30/03/2008
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Estratégia dos EUA é investir em instalações militares menores, mais ágeis e menos oneroras, como a de Manta, suposta plataforma do ataque às Farc

Em 1999, quando tiveram que abandonar o Panamá e suas posições no canal – um dos pontos mais estratégicos do mundo –, os Estados Unidos buscaram um modo de compensar a retirada com um avanço. Em vez de perder a posição do canal, manteve sua influência ampliando o alcance e o raio de ação com três novas posições que formaram um triângulo em torno do Panamá, com um vértice em cada uma das regiões circundantes: América Central, América do Sul e o Caribe.

Mediante uma negociação simultânea, os EUA conseguiram conquistar novas instalações, com convênios de 10 anos em El Salvador, no aeroporto internacional de Comalapa; em Aruba e Curacao, nos aeroportos de Reina Beatriz e Hato Rei respectivamente; e no Equador, no aeroporto Eloy Alfaro, na cidade costeira de Manta.

As bases instaladas nestes três pontos correspondem a uma concepção relativamente nova, emanada da profunda revisão interna do comando conjunto dos Estados Unidos, a partir da “revolução em assuntos militares” dos finais dos anos 90. A idéia de grandes posições nos lugares de conflito foi sendo substituída pela instalação de unidades pequenas, menos custosas e mais simples de manejar. Essas novas unidades militares possuem um raio de alcance amplo o bastante para não precisarem ficar localizadas no ponto de mira, mas que permita uma atuação com agilidade a uma distância que evite os riscos. A este tipo de base militar, deu-se o nome de Foreign Operating Locations (FOL), ainda que, com o propósito de “adoçá-las” um pouco, lhe mudaram o nome para Cooperative Security Locations (CSLs).

Monitoramento e detecção

Este tipo de base é relativamente enganoso porque em tempos regulares há poucas pessoas trabalhando (em Manta, por exemplo, existem somente 13 pessoas), já que seu funcionamento está centrado no monitoramento e detecção. Não obstante, em bases como a de Manta há capacidade para alojar 485 pessoas, entre efetivos, militares, pessoal de inteligência e empregados civis. Tem capacidade para receber aviões pequenos como o F16, grandes como os AWACs e também, caso seja necessário, aviões de grande envergadura como o C5, que serve para transportar equipamentos e tropas em grande escala (www.af.mil/factsheets).

O monitoramente é realizado da base é ininterrupto e tem um sistema de comunicação em tempo real com o Space Warfare Center, localizado em Colorado Springs, nos Estados Unidos, que recebe comunicações similares de todas as suas posições, fixas ou móveis, do mundo. Assim, cada uma destas instalações de comunicação se mantém informada das atividades de todo o sistema de bases, aeronaves e efetivos.

Ou seja, este tipo de base está pensado dentro da lógica do just in time. Não desperdiçar recursos, diminuir custos, mas manter a versatilidade para enfrentar qualquer tipo de contingência ou ameaça e a capacidade de resposta rápida e eficaz que converta cada ação em um “golpe cirúrgico”.

Nas palavras de Donald Rumsfeld:

* No próximo século nossas forças devem ser ágeis, letais, rapidamente desdobráveis e com mínimos requerimentos de suporte logístico. Devemos poder projetar nosso poder para grandes distâncias em questão de dias ou semanas e não de meses (23/09/2004).
Para consegui-lo, além da proliferação de instalações do tipo da FOL em áreas consideradas instáveis, ingovernáveis, críticas ou falidas, entre as quais se encontra uma boa parte dos países latino americanos e africanos, Rumsfed anuncia:

* Estamos melhorando as atividades de comunicações e inteligência. Isto inclui, por exemplo, o desenvolvimento do Space Based Radar (SBR) para monitorar tanto os alvos fixos como os móveis nas profundidades das linhas inimigas ou em áreas proibidas, em qualquer tipo de clima. Também estamos trabalhando no Transformational Communications Satellite (TSAT), para proporcionar a nossas tropas conjuntas uma capacidade de comunicação sem precedentes. Para se ter uma idéia da velocidade que pode oferecer o TSAT, considerem que a transmissão de uma imagem do Global Hawk a um Militar II leva atualmente 12 minutos e com o TSAT levará menos de um segundo. (Rumsfeld, 23/09/2004)

De acordo com o Base Structure Report Fiscal Year 2007 Baseline, o informe do Departamente de Defesa sobre as instalações militares estadunidenses no mundo em 2007, as posições em Aruba têm um valor de 1,6 milhões de dólares, as de Curaçao de 46,1 milhões, enquanto as de Manta são de 182 milhões de dólares, grande parte dos quais foram investidos na readequação do aeroporto às necessidades de monitoramento, intermediação e resposta rápida requeridas para as atividades previstas na região. A área que ocupa Manta é de 412km2, mas não é incomum ver os AWACs estacionados no aeroporto civil contíguo.

Neste mesmo informe do Departamento de Defesa se registra a existência de seis instalações pequenas na Colômbia e uma no Peru, estas são as que ocupam menos de 40km2 ou que têm um valor menor que 10 milhões de dólares.

Isto reafirma a hipótese de Manta como o cérebro e centro de operações coordenadas de todo o sistema de bases da região. Se isso é assim, fica a pergunta: o que foi feito a partir da base de Manta - e o o que não foi feito - na noite do ataque ao acampamento das Farc em Sucumbíos, Equador, levando em conta que Manta tem por tarefa a vigilância ininterrupta de qualquer tipo de aeronave ou movimento relacionado com o narcotráfico, a migração ilegal, o terrorismo e qualquer outra das consideradas ameaças à segurança nacional dos Estados Unidos.

Se o governo do Equador afirmou que as bombas jogadas em seu território não podem ser lançadas dos aviões que aparelham o exército colombiano - os brasileiros tucanos -, qual relação há entre os avisões estadunidenses que podem lançar esse tipo de arma e a base de Manta?

A tormenta do deserto se deslocou para a selva?

- Ana Esther Ceceña é socióloga mexicana, pesquisadora do tema militarização e imperialismo, coordenadora dos livros La tecnología como instrumento de poder – Ed. El Caballito, México – e Producción estratégica y hegemonía mundial, Siglo XXI, México.

Fonte: Brasil de Fato
http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/analise/a-base-de-manta
https://www.alainet.org/de/node/126667
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