Novos valores para nova civilização

13/02/2009
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No Fórum Social Mundial de  Belém se concluiu que as alternativas ao neoliberalismo e à construção do  ecossocialismo não se engendram na cabeça de intelectuais ou de programas  partidários, e sim na prática social, através de lutas populares, movimentos  sindicais, camponeses, indígenas, étnicos, ambientais, e comunidades de  base.

  Para gestar tais alternativas exigem-se pelo menos  quatro atitudes. A primeira, visão crítica do neoliberalismo. Este aprofunda  as contradições do capitalismo, na medida em que a expansão globalizada do  mercado acirra a competição comercial entre as grandes potências; desloca a  produção para áreas onde se possa pagar salários irrisórios; estimula o êxodo  das nações pobres rumo às ricas; introduz tecnologia de ponta que reduz os  postos de trabalho; torna as nações dependentes do capital especulativo; e  intensifica o processo de destruição do equilíbrio ambiental do  planeta.

 A segunda atitude - organizar a esperança. Encontrar  alternativas é um trabalho coletivo. Elas não surgem da cabeça de intelectuais  iluminados ou de gurus ideológicos. Daí a importância de se dar consistência  organizativa a todos os setores da sociedade que esperam outra coisa diferente  do que se vê na realidade atual: desde agricultores que sonham lavrar sua  própria terra a jovens interessados na preservação do meio ambiente.  

 Terceira atitude - resgatar a utopia. O neoliberalismo não visa  a destruir apenas as instâncias comunitárias criadas pela modernidade, como  família, sindicato, movimentos sociais e Estado democrático. Seu projeto de  atomização da sociedade reduz a pessoa à condição de indivíduo desconectado da  conjuntura sócio-política-econômica na qual se insere, e o considera mero  consumidor. Estende-se, portanto, também à esfera cultural. Como diria  Emmanuel Mounier, o individualismo é oposto ao personalismo. Pascal foi  enfático: “O Eu é odioso”.

 No seu apogeu, o capitalismo  mercantiliza tudo: a biodiversidade, o meio ambiente, a responsabilidade  social das empresas, o genoma, os órgãos arrancados de crianças etc, e até  mesmo o nosso imaginário. Um exemplo trivial é o que se gasta com a compra de  água potável engarrafada em indústria, dispensando o velho e bom filtro de  cerâmica ou mesmo a coleta da limpíssima água da chuva após um minuto de  precipitação.

 Sem utopias não há mobilizações motivadas pela  esperança. Nem possibilidade de visualizar um mundo diferente, novo e melhor.  

 Quarta atitude - elaborar um projeto alternativo. A esperança  favorece a emergência de novas utopias, que devem ser traduzidas em projetos  políticos e culturais que sinalizem as bases de uma nova sociedade. Isso  implica o resgate dos valores éticos, do senso de justiça, das práticas de  solidariedade e partilha, e do respeito à natureza. Em suma, trata-se  de um desafio também de ordem espiritual, na linha do que apregoava o  professor Milton Santos, de que devemos priorizar os “bens infinitos” e não os  “bens finitos”.

 O projeto de uma sociedade ecossocialista  alternativa ao neoliberalismo exige revisar, a partir da queda do Muro de  Berlim, os aspectos teóricos e práticos do socialismo real, em particular do  ponto de vista da democracia participativa e da preservação  ambiental.

 O ecossocialismo se caracterizaria pela capacidade de  incorporar conceito e práticas de igualdade social e desenvolvimento  sustentável a partir de experiências dos movimentos sociais e ecológicos,  assim como da Revolução Cubana, do levante zapatista do Chiapas, dos  assentamentos do MST etc.

 É vital incluir no projeto e no  programa os paradigmas ora emergentes, como ecologia, indigenismo, ética  comunitária, economia solidária, espiritualidade, feminismo e  holística.

 Este sonho, esta utopia, esta esperança que chamamos de  ecossocialismo, não é senão a continuação das esperanças daqueles que lutaram  pela defesa da vida, como Chico Mendes e Dorothy Stang, dois

lutadores  cristãos que deram suas vidas pela causa dos pobres, dos explorados, dos  indígenas, dos trabalhadores da terra e dos povos da  floresta.
 
- Frei Betto é escritor, autor de “Cartas da Prisão”  (Agir), entre outros livros.

https://www.alainet.org/de/node/132371?language=es
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