Terrorismo de estado e terrorismo de mídia: duas formas de violência que precisam ser enfrentadas
12/01/2015
- Opinión
Criança vítima da violência em Gaza (Palestina).
Basta um breve estudo histórico para ver que o terrorismo praticado pelo Estado tem sido comum para manter o status quo de determinados grupos, seja objetivando enfraquecer os opositores, seja como condição de acesso ao poder, seja, simplesmente, como doutrina.
O regime de terror foi uma prática comum do nazismo, que promovia atentados diários contra instituições de esquerda, judaicas ou não brancas. Com a ascensão de Hitler, tornou-se uma doutrina de Estado, uma prática que resultou no holocausto.
Se os principais líderes da Revolução Russa, como Lenin e Trotsky, eram contrários ao terrorismo praticado pelo governo czarista, e pelos movimentos anarquistas, a chegada de Stalin ao poder resultou, inegavelmente, num regime terrorista, com a perseguição contínua a milhares de opositores, incluindo o próprio Trotsky, assassinado no México por seguidores do stalinismo.
Também temos a patrulha anticomunista do Macarthismo norte-americano, doutrina que resultou na perseguição política e de desrespeito aos direitos civis de servidores públicos, artistas, ativistas, sindicalistas ou opositores políticos por agentes do governo estadunidense, num verdadeiro regime do terror contra quem pensava diferente. Aliás, tal conduta ainda é mantida por setores da mídia norte-americana.
Dos EUA também temos o racismo sulista, que resultou na perseguição e morte de milhares de militantes políticos, negros ou brancos, que lutaram por direitos civis. Aliás, nada é mais simbólico como prática terrorista, do que as ações da Ku-Klux-Kan, fundada pelo General Sulista Nathan Bedford Forrest, em 1865, após o fim da guerra civil e da escravidão, com o objetivo de impedir as comunidades negras de se integrarem à sociedade estadunidense, e de receberem os direitos civis e ao voto.
Na América Latina também temos exemplos graves de terrorismo de estado que começam pela escravidão e passam, obrigatoriamente, pela conduta do regime policial instaurado pelas ditaduras militares, com a morte, tortura e desaparecimento de milhares de pessoas em países como o Brasil, a Argentina e o Chile.
Ainda temos o terror criado pela corrida armamentista na guerra fria, especialmente no que se refere à construção de instrumentos de destruição em massa, como armas nucleares, químicas e biológicas.
Aliás, existem exemplos de terrorismo de estado praticado em todos os Continentes, em países como Ruanda, África do Sul (apartheid), Arábia Saudita, Kosovo, Sérvia, México, Irlanda, Austrália, etc. Mas o exemplo mais gritante e atual, e que conta com a omissão da mídia e das grandes potenciais internacionais, é o regime do terror imposto por Israel na Palestina.
Assim, ver Benjamin Netanyahu participar de um manifesto contra o terrorismo não pode ser visto de outra forma, que não a absoluta e completa demagogia política, e um desrespeito para com a verdade.
A violência de estado tem sido o instrumento principal dos governos de Israel para exercer o poder em Gaza e na Cisjordânia, ambos territórios Palestinos ocupados, o que inclui o massacre contínuo de civis, desde mulheres e crianças, a idosos.
Mas se o terrorismo praticado pelo estado é uma medida deplorável, o mesmo deve ser dito sobre o exercitado por sua caixa de ressonância: a Mídia. Aliás, a mídia não apenas oxigena o terrorismo, como o alimenta e o exercita.
O medo é uma forma extremamente eficiente de manter o poder e de atrair atenção, de vender jornais e revistas. É um meio para atrair patrocinadores e de fixar barreiras simbólicas que impedem o fluxo livre de ideias e de pessoas.
Para o professor Adam Lockyer, do Centro de Estados sobre os EUA da Universidade de Sydney, na Austrália, “os meios de comunicação são o oxigênio do terrorismo”. Desde o atentado às Torres Gêmeas em setembro de 2011, há uma simbiose entre mídia e terrorismo, tanto o praticado por extremistas de todas as vertentes, como o praticado pelo Estado, como é o caso da ação de Israel na Palestina.
A mídia serve como elemento de mediação e de legitimação do terrorismo, ao reproduzir preconceitos, afirmar interesses e criar pânico da sociedade. Quem mora nos grandes centros urbanos conhece bem o terrorismo de mídia, e a proliferação contínua de programas de televisão que fazem propaganda da violência e do medo.
O que a mídia brasileira vem fazendo hoje, atacando a economia, é uma conduta tipicamente terrorista, num claro exercício de poder. Mesmo que todos os indicadores, como emprego, renda, e inflação, contrariem a tese dos grandes grupos de comunicação, os mesmo insistem em afirmar que o Brasil atravessa uma crise sem precedentes. Curiosamente, é o mesmo mecanismo utilizado para legitimar a tragédia social do neoliberalismo dos anos 90.
Assim, é muito importante que tenhamos a capacidade crítica de interpretar os fatos e observar quem verdadeiramente alimenta o terrorismo. Se este exercício for feito, é certo que mudaremos a nossa compreensão sobre a violência real e a simbólica.
Publicado em 12 de janeiro de 2015
Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.
https://www.alainet.org/de/node/166723?language=en
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