Que o “mina Guaíba” não repita Brumadinho

28/03/2019
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Reprodução
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Quando uma determinada empresa de mineração pede licença à administração pública para estabelecer-se num determinado lugar, os efeitos do projeto respectivo sempre afetam profunda e gravemente o meio ambiente. Obedecida a lei, a licença pode ser dada, ou não, conforme se comprove que a execução do projeto garanta os cuidados que a sua execução exija. EIA-RIMA é a sigla para os estudos de impacto ambiental que o empreendimento causará (EIA), reunidos depois num relatório conhecido como RIMA, relatório do respectivo impacto.

 

Uma característica recorrente na tramitação desse pedido é a de calcularem-se as boas vantagens econômicas previstas para a realização das obras indispensáveis para o empreendimento. A mineração, por um lado, pelo que significa de transformação local e regional do espaço físico por ela exigido, em poluição da terra, do ar e das águas, para se lembrar apenas o mais visível, e a chamada “expansão da fronteira agrícola”, pelo poder de desmatar que implica, situam-se entre as intervenções capazes de causar danos irreversíveis à natureza do planeta inteiro. Mesmo desconsiderado o prejuízo certo, causado à terra e da gente que nela trabalha, pela disseminação dos venenos agora cada vez mais franqueada pelo nova administração pública (?) da União.

 

O acontecido em Brumadinho, como já acontecera em Mariana, comprova que, nas concessões dessas licenças, o cuidado com a natureza, com as multidões vizinhas a essas obras, com os danos de elas não se prevenirem suficientemente contra os riscos que comportam, foi notoriamente insuficiente para impedir os desastres que elas provocaram.

 

Um megaprojeto desse tipo está previsto ser implantado no Rio Grande do Sul, com capacidade de interferir no meio ambiente de toda a região metropolitana de Porto Alegre, onde vivem mais de quatro milhões de pessoas, servindo-se da água do lago Guaíba e do rio Jacuí, este o mais diretamente afetado pela proximidade do empreendimento às suas margens.

 

Denominado Mina Guaíba, ele vai cobrir uma extensa área de terra. Até um assentamento de reforma agrária, já conhecido como Apolonio de Carvalho, buscando garantir emprego e renda para mais de 70 famílias de agricultoras/es terá de “se mudar”…

 

Um requerimento assinado por vereadores de Porto Alegre, com apoio político também do deputado Adão Pretto e da deputada Luciana Genro, foi protocolado na FEPAM (Fundação Estadual de Proteção Ambiental), no sentido de ser franqueada a informação e o debate aberto em audiência pública, agora em Porto Alegre, no sentido de se conhecer mais detalhadamente o projeto e as garantias que estão sendo previstas para a proteção do meio ambiente. Até agora, apenas uma audiência realizada em Charqueadas, dia 14 deste março, visou cumprir este requisito previsto em lei para viabilizar a futura execução do projeto.

 

Entre outras razões para sustentar a necessidade desta iniciativa, o pedido lembra:

 

“As águas que abastecem a capital gaúcha, e seus quase 1,5 milhão de habitantes, são captadas no Lago Guaíba, cuja principal afluente é o Rio Jacuí, responsável por nada menos 84,6% desse volume, de acordo com informações da Prefeitura Municipal. O Projeto Mina Guaíba, de acordo o Relatório de Impacto Ambiental apresentado, jogará efluentes da lavra, derivados de drenagem da cava, no Rio Jacuí. Está-se falando dos rejeitos de uma mina a céu aberto de 4.373 hectares, que, se autorizada, operará por 23 anos produzindo uma quantidade assustadora de resíduos a menos de um quilômetro da beira do Rio Jacuí. Um projeto gigantesco, que envolve bilhões de dólares de investimento, e um altíssimo risco para a saúde e o ambiente da população porto-alegrense.”

 

“O impacto está relacionado às fases de implantação e operação, associado às atividades de abastecimento, manutenção e operação de veículos e máquinas; instalação e mobilização de canteiro de obras, obras de edificações, obras civis auxiliares, desvio dos arroios Jacaré e Pesqueiro, armazenamento de resíduos sólidos e operação de contêineres sanitários com fossas estanques. Em condições normais de funcionamento do empreendimento, não é prevista a ocorrência deste impacto. Contudo falhas operacionais e/ou vazamentos pontuais são passíveis de acontecer ocasionando o presente impacto.”

 

Com base em disposições constitucionais e infra constitucionais, na legislação estadual sobre meio ambiente, o requerimento prova que a audiência pública realizada em Charqueadas não exclui a possibilidade de outra ser convocada em Porto Alegre, já que aquele município “não é acessível para a população porto-alegrense, seja para as suas instituições públicas, seja para as entidades ambientais, para os ribeirinhos, para a comunidade acadêmica ou qualquer outro cidadão interessado na qualidade de sua água, ou mesmo na continuidade da produção de orgânicos que existe na região onde se quer instalar a mina.”

 

O passado está cheio de advertências sobre os riscos implicados num empreendimento como o desse Mina Guaíba. A cada desastre ambiental e perdas de vidas aí implicados, como aconteceu recentemente em Brumadinho, seguem-se promessas privadas e públicas de se garantir a sua não repetição. Espera-se que, em nome da segurança jurídica tão reclamada por megaempreendimentos dessa espécie, posta em concurso com outros direitos, hierarquicamente superiores, não obtenha, junto à FEPAM, uma preferência capaz de indeferir o pedido feito para essa nova audiência. O futuro humano-ambiental de toda a região metropolitana de Porto Alegre o exige.

 

- Jacques Távora Alfonsin é Procurador aposentado do Estado do Rio Grande do Sul e membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos.

 

março 27, 2019

https://www.sul21.com.br/opiniaopublica/2019/03/que-o-mina-guaiba-nao-repita-brumadinho-por-jacques-tavora-alfonsin/

 

https://www.alainet.org/de/node/198992?language=en
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