Chacinas em série. Até quando?
- Opinión
De 17 a 19 de julho, 37 pessoas foram assassinadas em Manaus. As execuções tiveram início após a morte de um sargento da PM ao sair de uma agência bancária. Curiosamente, chamada aos locais onde ocorrem os crimes, a polícia demorou a chegar... Até hoje nenhum criminoso foi preso.
A 13 de agosto – data considerada fatídica pela superstição – 18 pessoas foram assassinadas e sete feridas em Barueri e Osasco, na Grande São Paulo.
Quando a TV exibe execuções feitas pelo Estado Islâmico, ficamos indignados e torcemos para que o “mocinho” (as tropas do Tio Sam) derrotem o quanto antes o bandido terrorista.
Não olhamos, porém, o próprio umbigo. No Brasil, as mortes não são seletivas, são generalizadas. É a lei do talião levada ao extremo: um policial morto, dez ou mais inocentes baleados aleatoriamente como vingança. Exatamente como procediam os nazistas. A cada prisioneiro foragido do campo de concentração, dez outros eram sorteados para morrer.
Sobre essa atrocidade se ergue a figura exemplar do polonês Maximiliano Kolbe, hoje proclamado santo pela Igreja Católica. No campo em que se encontrava o frade franciscano, houve uma fuga. Ao ver escalado para figurar entre as vítimas da retaliação um operário pai de família, Kolbe se ofereceu para morrer em seu lugar e a troca foi aceita.
Quando ocorre um só assassinato em bairro nobre de uma grande cidade brasileira, a nação fica indignada. Como as vítimas “expiatórias” são escolhidas na periferia, quem se importa?
Arvorados na arrogância de um gigante deitado em berço esplêndido, colecionamos, como troféus de alta criminalidade, as chacinas de Carandiru (1992), Vigário Geral (1993), Ianomâmis (1993), Candelária (1993), Corumbiara (1995) e Eldorado dos Carajás (1996). Tantos mortos, poucos acusados, raros indiciados.
Os 50 mil assassinatos registrados por ano no Brasil (mais do que o número de mortos nas guerras da Síria, do Iraque e do Afeganistão) nos coloca na triste condição de campeões mundiais do crime, segundo a ONU. De cada 100 assassinatos no mundo, 13 são no Brasil, secundado por Índia, México, Colômbia, Rússia, África do Sul, Venezuela e EUA.
Como se faz a boa formação de um policial? É ensinado a ele o que são direitos humanos ou os veteranos incutem no novato que “bandido bom é bandido morto”? Ele aprende a defender a população e respeitar a cidadania de cada pessoa ou, por vestir uma farda e portar uma arma, se compraz em humilhar jovens e negros? Recebe aulas de ética ou se vale da função para extorquir comerciantes? Culmina a sua formação consciente da importância de denunciar colegas corruptos e assassinos, ou considera a corporação acima do bem e do mal?
Enfim, pagamos impostos para sustentar uma polícia incapaz de evitar 50 mil mortes por ano? Com a palavra, as autoridades. E nós, quando vamos refletir antes de eleger autoridades cúmplices e omissas? Sequer cuidamos de fazer com que os sinos dobrem pelas vítimas de chacinas nas áreas do país em que predominam a pobreza e o descaso do Estado.
- Frei Betto é escritor, autor do romance “Minas do Ouro” (Rocco), entre outros livros.
25 de Agosto de 2015
Del mismo autor
- Homenaje a Paulo Freire en el centenario de su nacimiento 14/09/2021
- Homenagem a Paulo Freire em seu centenário de nascimento 08/09/2021
- FSM: de espaço aberto a espaço de acção 04/08/2020
- WSF: from an open space to a space for action 04/08/2020
- FSM : d'un espace ouvert à un espace d'action 04/08/2020
- FSM: de espacio abierto a espacio de acción 04/08/2020
- Ética em tempos de pandemia 27/07/2020
- Carta a amigos y amigas del exterior 20/07/2020
- Carta aos amigos e amigas do exterior 20/07/2020
- Direito à alimentação saudável 09/07/2020