Grito dos Excluídos

26/08/2001
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A CNBB modificou seus estatutos mas, felizmente, não a sua agenda anual: Semanas Sociais nas dioceses; Campanha da Fraternidade na Quaresma; Grito dos Excluídos na Semana da Pátria. O que revela que os bispos brasileiros prosseguem em sintonia com os 50 milhões de brasileiros que não logram obter uma renda mensal de R$ 80 para adquirir a cesta básica suficiente em calorias. Celebra-se, este ano, o 7º Grito, com mobilizações em Aparecida e nos principais centros urbanos do país. Agora o lema é: "Por amor a essa pátria Brasil". Aliás, cantamos o hino nacional declarando que a pátria é amada, "salve, salve". Salve não é apenas uma interjeição. É também a terceira pessoa do singular do imperativo do verbo salvar. A pátria só pode ser salva se for amada, o que se traduz no empenho para erradicar as injustiças e preservar a sua soberania. O tema de fundo do Grito é o da Segunda Semana Social Brasileira, promovida pela CNBB ­ a construção de um novo projeto de sociedade para o país. Projeto economicamente justo, politicamente democrático, socialmente equitativo e culturalmente plural. Este sonho passa por mediações específicas e urgentes, como o combate à proposta de formação da Alca, para o que Brasil não vire de vez quintal da Casa Branca e assegure a sua autonomia frente aos parceiros internacionais; mudança da atual política econômica, que gasta hoje 38% do PIB ­ mais de US$ 110 bilhões ­ nos serviços da dívida interna; e 12% do PIB em serviços, juros e amortizações da dívida e(x)terna. Tanto dinheiro evadido para o bolso dos credores - que não investiram aqui "por amor a essa pátria Brasil", mas sim interessados no próprio faturamento - reduz drasticamente os recursos públicos destinados à saúde, moradia, educação, reforma agrária, geração de energia etc. O Grito dos Excluídos inclui em sua pauta a crítica, não à globalização, que é em si positiva e inevitável, mas ao atual modelo, mais parecido com a globocolonização, pois suspende as fronteiras para o capital financeiro e reforça-os para trabalhadores e produtos das nações em desenvolvimento. Urge globalizar a solidariedade, os direitos humanos, a mobilidade planetária das pessoas. A dívida e(x)terna brasileira é, hoje, de US$ 250 bilhões. A pública cresceu, nos últimos sete anos, de R$ 60 bilhões para cerca de R$ 618 bilhões. Equivale agora a 51,9% do PIB. Tais recursos deveriam ser aplicados no resgate das dívidas sociais. E seríamos uma nação sem medo. Pressionado pelo FMI, que dirige a economia do país (sem que até hoje tenha erradicado a miséria de uma única nação), o governo federal trata de fazer caixa para não desagradar aos credores: privatiza empresas públicas; desnacionaliza setores estratégicos, como as telecomunicações; corta gastos sociais; e impõe a Lei de Responsabilidade Fiscal. Pelo acordo fechado este mês com o FMI, o governo federal está obrigado, ano que vem, a cortar mais R$ 6,6 bilhões em seus gastos; exigir contribuição previdenciária dos aposentados (que ganham uma miséria e, agora, terão de dar o que não têm); manter o arrocho salarial. Um navio não pode ir muito longe jogando combustível no mar. Onde pretende chegar o Brasil reduzindo para apenas US$ 20 bilhões as suas reservas? Ao separar US$ 5 bilhões para intervir no mercado de câmbio, FMI e governo confessam publicamente que o navio Brasil vai entrar em águas turbulentas nos próximos meses, por má fortuna dos ventos que sopram da Argentina, da recessão dos EUA e do fraco desempenho da economia global. Para o Grito dos Excluídos, o Brasil precisa é de uma Lei de Responsabilidade Social, para que o mundo não veja mais cenas como as registradas no bairro do Irajá, no Rio de Janeiro, a 30 de julho, quando cerca de 1.000 pessoas enfiaram-se como ratos famintos nos escombros do incêndio da Ceasa, em busca do que comer. Uma coisa é certa: o Brasil jamais terá saída pelo Fundo. Muitas iniciativas, felizmente, somam-se, hoje, na procura de uma saída que não dependa da lógica monetarista do FMI, como o projeto Fome Zero, do Instituto Cidadania; a mobilização nacional da CNBB, junto com outras entidades e movimentos, para combater a fome e construir cisternas no Nordeste; o exemplar desempenho da Pastoral da Criança; a emergente cultura do trabalho voluntário, gracas ao Ano Internacional do Voluntariado; a imensa rede de assentamentos, cooperativas, associações, enfim, toda uma economia alternativa e solidária movida pelo heróico empenho dos movimentos populares. O Grito deste ano deverá ecoar no Grito Latino-americano e caribenho, a 12 de outubro, e ressoar até o Fórum Social Mundial 2002, em Porto Alegre, espaço privilegiado para o Brasil pensar o Brasil e o futuro do mundo sem exclusões.
https://www.alainet.org/es/node/105290
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