Ainda a revolução brasileira

08/08/2002
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A revolução brasileira é só um nome. Ela nunca se realizou. As elites dirigentes vivem na ilusão de que é desnecessária. Basta fazer alguns retoques e, nas crises, pedir mais dinheiro ao FMI. E então o Brasil volta a funcionar sobre fundamentos sólidos (para eles). Se empréstimo resolvesse os problemas, estaríamos todos no paraiso social. Mas eles apenas nos precipitam mais fundo no purgatório da dependência, purgatório que equivale a um inferno para pelo menos 50 milhões de brasileiros. Quando Betinho, cheio de com-paixão, deslanchou em 1993 a campanha contra a fome e a miséria, havia, segundo dados do Governo, 32 milhões de famintos. Oito anos após, em 2001, consoante a Fundação Getúlio Vargas, esse número ascendia a 50 milhões. Esse dado não revela um inferno? O Papa bom, João XXIII, disse repetidas vezes que não conseguia dormir só com pensar nos famintos do mundo. Movidos por esse sentimento escreveu a encíclia Pacem in Terris(1963). Agora em 2002 o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento nos envergonha com a constatação de que o fosso no Brasil entre os que comem e não comem aumentou. Pudera, somos a terceira maior concentração de renda do mundo, só perdendo para Serra Leoa e Suazilândia na Africa. Consequentemente, os direitos são sistematicamente violados. Segundo a mesma fonte, numa escala de 1-7, no item respeito aos direitos e às liberdades, obtivemos a nota 3. Rodamos rotundamente. Nestas condições, se entende por que nossa democracia tenha tão parca sustentabilidade. No arco de 100 anos, 70 foram vividos sob ditaduras. A vigência dos direitos e a inclusão social são precondições mínimas para o funcionamento da democracia e para qualquer mudança substancial. Com um povo faminto e doente, como daremos o salto rumo a uma sociedade sustentável e democrática? Por isso, mais e mais cresce a percepção entre os analistas que a perversidade estrutural brasileira não se supera fazendo economia de revolução no sentido de mudanças das estruturas de poder social, político e cultural. Para tal revolução se necessita acumulação de poder social que se canalisa em poder político que se proponha fazer a revolução no quadro de uma democracia enriquecida. Esta deve ultrapassar a democracia meramente eleitoral, que pára na porta da fábrica e comparecer como democracia participativa, de baixo para cima e, por isso, popular. Essa força social e política já se constituíu em nosso pais. Ela é representada emblematicamente por um torneiro mecânico que furou a blindagem das elites contra as mudanças estruturais e agora, pela quarta vez, se apresenta como portador da esperança de que um outro Brasil é possível. Sejamos claros: é o único que signfica oposição ao sistema e não apenas oposição ao Governo, como os demais. Sua eventual vitória, poderá significar a revolução brasileira. Mas se, por fraqueza diante das elites, não a fizer, será execrado pela melhor consciência de nosso povo. Sua primeira meta é revolucionária: Fome Zero. Quem não começar por ai, está defraudando 50 milhões de famélicos. Administrará a fome com migalhas mas não cuidará dos famintos. Desta vez, temos que arriscar, coisa que nunca fizemos. E o risco poderá nos recompensar com o comêço da revolução necessária, sonho de nossos melhores. * Leonardo Boff, Teólogo.
https://www.alainet.org/es/node/106214
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