Quem fará a revolução?
22/08/2002
- Opinión
Normalmente só se fazem as revoluções que se fazem. O simples voluntarismo não faz
a revolução como redefinição do rumo de um país. Nem a situação gritante deixada a
si mesma, pois lhe falta direção. Quando, porém, se unir situação revolucionária
com vontade de transformação, ai surge o ponto de mutação com a força do irromper
da aurora. A revolução acontece como estágio novo da sociedade,com novo rumo e
novas relações sociais. A realidade social das grandes maiorias destituidas,
"capadas e recapadas, sangradas e ressangradas" (Capistrano de Abreu) objetivamente
exige transformações que superem a marginalidade e a exclusão. Mas nunca se
permitiu às vítimas de elaborar uma vontade própria e de criar meios necessários
para o salto de qualidade. As elites, sempre hábeis, se anteciparam para abortar
os intentos redentores.
Mas a persistência dos propósitos, a seta do tempo, o Weltgeist (a dinâmica da
história, segundo Hegel) e o desígnio do Mistério (segundo os cristãos) fizeram com
que o momento chegasse em que os oprimidos pudessem realizar a viragem rumo àquilo
que deve ser. E o que deve ser tem força, irreprimível e irrefragável. Estimo que
esse momento chegou agora para os brasileiros. Recuso-me a aceitar que o
sofrimento de milhões de escravos, de indígenas, de humilhados e ofendidos de nossa
história tenha sido em vão. Ele propiciou tanta acumulação de força e elaborou
tanta exigência de transformação que, finalmente, a hora madurou. Caso contrário,
a história seria absurda e o cinismo, recomendável.
O palco para essa revolução necessária, a revolução brasileira, está montado nestas
eleições presidenciais. Há candidato que fala em mudanças mas seu discurso é
enganador, pois se cerca de aliados, cujo propósito notório é impedir qualquer
mudança. A insensibilidade ética os torna moucos ao clamor que vem da Terra. Há
candidato que não consegue mudar a rota já traçada há oito anos e que se exauriu
num beco sem saída. Resta-lhe sofismar com palavras, dizendo que é continuação sem
continuismo. Mas há um outro candidato que vem da grande tribulação na qual está
crucificado o povo brasileiro. Sabe de suas dores e de suas esperanças, do que ele
precisa e de como realizá-lo: a utopia menor de poder trabalhar, comer, se educar,
se tratar quando doente e de conviver com um mínimo de decência. Ele se levanta e
tem a coragem de dizer o óbvio, aquilo que a razão rasa e comezinha dita: "capital
se faz em casa", fundado no trabalho honesto do povo e na produção laboriosa de
nossos empreendedores e não aquele, podre, que se toma lá fora, dos que praticam a
agiotagem internacional. "Tecnologia útil e que nos liberta é aquela que se cria
aqui", adaptada aos nossos eco-sistemas e que satisfaz as demandas de crescimento
do país. Pelo fato de o Japão, arrasado pela guerra, e a Coréia subdesenvolvida,
terem pensado assim, puderam fazer sua revolução que lhes garante sustentabilidade
até os dias de hoje.
Agora tudo indica que o tempo da revolução brasileira chegou. A semeadura já foi
feita. É hora da colheita. Importa secundar os que propõem a transformação e,
juntos com eles, re-inventar um Brasil de outros quinhentos.
Leonardo Boff, Teólogo.
https://www.alainet.org/es/node/106271
Del mismo autor
- O risco da destruição de nosso futuro 05/04/2022
- Reality can be worse than we think 15/02/2022
- ¿Hay maneras de evitar el fin del mundo? 11/02/2022
- Há maneiras de evitar o fim do mundo? 08/02/2022
- The future of human life on Earth depends on us 17/01/2022
- El futuro de la vida depende de nosotros 17/01/2022
- A humanidade na encruzilhada: a sepultura ou… 14/01/2022
- “The iron cage” of Capital 04/01/2022
- Ante el futuro, desencanto o esperanzar 04/01/2022
- Desencanto face ao futuro e o esperançar 03/01/2022