Acampamento é organizado por movimentos rurais e indígenas

Mais de 1.200 acampam em Cabrobó contra a transposição

25/06/2007
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Barrar as obras da transposição do Rio São Francisco. É o que pretendem os 1200 manifestantes que ocuparam, às 3h30 da madrugada do dia 26 de junho, a área de onde sairá o ponto de captação das águas da transposição no eixo Norte do projeto, em Cabrobó (PE). Na véspera da ocupação, o 2º Batalhão de Construção e Engenharia do Exército, que está instalado na região desde o dia 5 para construir o canal de aproximação, havia começado as obras de destacamento e de topografia.

Além de “não permitir que a construção do canal avance”, o acampamento formado inicialmente por 15 etnias indígenas e movimentos sociais pretende retomar o território, cuja posse é reivindicada pela etnia indígena Truká. “Os povos indígenas não vão sair de lá. Todos se consideram irmãos e pretendem defender a terra dos trukás, que foram expulsos da região no passado”, afirma Alzeni Tomáz, da Comissão Pastoral dos Pescadores (CPP). Segundo ela, ao invés de homologar a terra como território indígena, o governo desapropriou a Fazenda Mãe Rosa para as obras e negociou uma indenização no valor de R$ 1,29 milhão ao fazendeiro Antonio Simões de Almeida. “O governo arquivou o processo de levantamento das áreas porque tinha interesse em usar a fazenda para o canal da transposição”, critica ela.

A Agência Brasil noticiou que o Ministério da Integração Nacional havia enviado um interlocutor a Cabrobó (PE) para dialogar com os manifestantes. No entanto, o ministro Geddel Vieira Lima cogita pedir na Justiça a reintegração de posse da área. Segundo ele, a fazenda ocupada já foi desapropriada para a execução das obras e, portanto, seria de propriedade da União.

Povos indígenas

No local da ocupação, os acampados pretendem cobrir com terra um buraco aberto no terreno pelo Exército. Vão também iniciar o plantio de árvores frutíferas, verduras e legumes para alimentar os integrantes do acampamento, que não tem prazo para encerrar, explica Alzeni. Entre os presentes, há representantes de movimentos sociais de toda a Bacia do São Francisco. Ao longo do dia, mais e mais pessoas das áreas próximas chegaram ao local, de acordo com a representante da CPP, e a perspectiva era de que somassem duas mil pessoas à noite do dia 26. Os povos indígenas, que são 30 em todo o Nordeste, devem continuar a engrossar o acampamento.

Em um manifesto do acampamento intitulado “O Nordeste é viável sem transposição e com ética na política”, os movimentos afirmam que a região “não precisa desse projeto traiçoeiro chamado \'integração de bacias\', a mesma antiga transposição”. De acordo com o documento, o processo de negociação do governo federal não foi “democrático nem republicano e desabona o projeto, seus promotores e lobistas: estudos de impacto ambiental formais e incompletos; críticas fundamentadas dos principais especialistas; desrespeito às decisões do Comitê de Bacia”.

Acordo descumprido


Organizada por movimentos como Comissão Pastoral da Terra (CPT), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), comunidades quilombolas e pescadores da bacia do São Francisco, a mobilização reivindica a implementação de alternativas e tecnologias apropriadas de convivência com o Semi-Árido, além do arquivamento do projeto de transposição. De acordo com os manifestantes, o governo descumpriu o acordo feito com dom Luiz Cappio, que encerrou greve de fome de 11 dias em novembro de 2005 sob a condição de se fazer um amplo debate nacional a respeito do assunto.

Elianeiva Viana Odísio, responsável pelo Ministério da Integração Nacional na região, afirma que o manifesto do acampamento foi enviado ao ministro Geddel Viera Lima, “mas ainda não tivemos resposta.”. Segundo ela, “somos os olhos do ministro aqui, e o que vimos foi uma manifestação pacífica”. A representante do Ministério disse que não ia se pronunciar a respeito das reivindicações do povo Truká porque seria uma questão que diz respeito à Funai”. Elianeiva avaliou que o acampamento não está prejudicando o trabalho do Exército que, segundo ela, até agora consistiria em “parte da definição da topografia, está estruturando o canteiro, mas ainda não iniciou o desmatamento”.

Reivindicações

Outra demanda ressaltada pelos movimentos sociais é a recuperação do território para os índios Truká. A terra foi negociada com a União pelo fazendeiro Antonio Simões de Almeida, que esteve no acampamento no dia 26. De acordo com Alzeni Tomaz, da CPP, Almeida afirmou, indignado, que nunca teve conhecimento que os indígenas reivindicavam a área. “Eles já têm a ilha deles (a etnia vive na Ilha de Assunção, próximo a Cabrobó), mas querem viver de invadir o que é dos outros. Essa fazenda era minha e agora é da União, e não de índio sem-vergonha. Além disso, eles não querem produzir nada”, critica o fazendeiro em entrevista ao Brasil de Fato. De acordo com ele, o acampamento não vai conseguir parar a obra, pois o governo conseguirá a reintegração de posse do acampamento. Almeida, que já foi proprietário de terras na ilha onde vivem hoje os Truká, diz que os indígenas são “indolentes e só querem dinheiro”.

O prefeito de Cabrobó, Eudes Caldas, também se opôs ao acampamento. Para ele, os manifestantes opositores ao projeto de transposição são pessoas que “não têm informações corretas” e estariam sendo manipuladas pelo “pessoal da Bahia que não quer que a água vá para os 12 milhões de beneficiários da obra. Não há justificativa. Eles alegam o quê? Que o rio vai secar? Esse pessoal não sabe o que está dizendo”, afirma. Sobre a reivindicação da posse da terra feita pelos indígenas Truká, o prefeito ironizou: “Daqui a pouco eles vão querer o Brasil todo. Bom, se pensarmos o país, todo é território indígena, afinal, quando Pedro Álvares Cabral chegou aqui, só havia índios. Até minha casa é território indígena”.

Fonte: Brasil de Fato


http://www.brasildefato.com.br


https://www.alainet.org/es/node/121948
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