Apontamento sobre a censura e os Conselhos de Comunicação
02/11/2010
- Opinión
Um tema bastante complexo tem tomado o imaginário brasileiro através das usinas ideológicas da classe média, as revistas semanais, e os telejornais das grandes redes: a censura. O motivo de tal questão ter vindo à baila é a proposta de institucionalização dos Conselhos Municipais e Estaduais de Comunicação. Jornalistas, comentaristas, analistas e palpiteiros tem se referido a esse assunto de forma rasa e redutora, o que é bastante prejudicial para a formação do juízo das pessoas sobre o que é verdadeiramente censura.
Para falar sobre esse assunto vou me remeter ao livro da historiadora Beatriz Kushnir, lançado em 2004, mas ainda pouco conhecido na área da comunicação. É o “Cães de Guarda – jornalista e censores, do AI-5 à Constituição de 1988”. O trabalho tem uma importância tremenda porque, com ele, Beatriz desvela o outro lado da imprensa nos anos de chumbo, tempo da ditadura brasileira. Ali, é possível caminhar pelas intrincadas veredas do processo de censura que tomou conta do país depois do Ato Institucional número 5, em 1968, e ver o quanto a categoria dos jornalistas também colaborou para que a censura se fizesse real, seja através dos profissionais que assumiram o cargo de censores ou dos que assumiram a função de polícia.
O livro de Kushnir talvez não seja tão conhecido porque é justamente uma chaga aberta a sangrar, mostrando que não só os donos dos grandes meios foram coniventes com as barbaridades do regime militar, mas também muitos profissionais do jornalismo colaboraram de forma ativa. Naqueles dias, a censura era concreta e cotidiana. Palavras eram proibidas de serem pronunciadas, notícias sobre fatos de interesse público como uma epidemia de malária eram proibidas, informações sobre as arbitrariedades do regime, torturas, assassinatos e desaparecimentos então, nem pensar. Havia um setor que cuidava da censura aos meios de comunicação, aos artistas e a qualquer outro sujeito que usasse a palavra. A censura era uma imposição do estado ditatorial e impedia a livre expressão das idéias. Ela permeava todas as instâncias da vida, uma vez que também as reuniões eram proibidas. Um grupo com mais de três pessoas já era considerado motim.
No campo do jornalismo ela se expressou com a obrigatoriedade de revisão prévia das notícias feita pelos censores que, como revela o trabalho de Beatriz, tinha entre eles um número expressivo de jornalistas. As pessoas que se prestaram a esse papel eram contratadas como funcionários públicos e tinham curso superior, desfazendo-se então a idéia corrente de que os censores eram criaturas ignorantes e incapazes. Não o eram. No mais das vezes chegavam a ser “treinados” nas universidades, que ofereciam cursos sobre como censurar. O governo investiu muitos recursos neste tipo de capacitação. Vários dos censores foram entrevistados por Beatriz e a maioria tinha consolidada a certeza de que estava realmente ajudando a manter a moral e os bons costumes.
Para falar sobre esse assunto vou me remeter ao livro da historiadora Beatriz Kushnir, lançado em 2004, mas ainda pouco conhecido na área da comunicação. É o “Cães de Guarda – jornalista e censores, do AI-5 à Constituição de 1988”. O trabalho tem uma importância tremenda porque, com ele, Beatriz desvela o outro lado da imprensa nos anos de chumbo, tempo da ditadura brasileira. Ali, é possível caminhar pelas intrincadas veredas do processo de censura que tomou conta do país depois do Ato Institucional número 5, em 1968, e ver o quanto a categoria dos jornalistas também colaborou para que a censura se fizesse real, seja através dos profissionais que assumiram o cargo de censores ou dos que assumiram a função de polícia.
O livro de Kushnir talvez não seja tão conhecido porque é justamente uma chaga aberta a sangrar, mostrando que não só os donos dos grandes meios foram coniventes com as barbaridades do regime militar, mas também muitos profissionais do jornalismo colaboraram de forma ativa. Naqueles dias, a censura era concreta e cotidiana. Palavras eram proibidas de serem pronunciadas, notícias sobre fatos de interesse público como uma epidemia de malária eram proibidas, informações sobre as arbitrariedades do regime, torturas, assassinatos e desaparecimentos então, nem pensar. Havia um setor que cuidava da censura aos meios de comunicação, aos artistas e a qualquer outro sujeito que usasse a palavra. A censura era uma imposição do estado ditatorial e impedia a livre expressão das idéias. Ela permeava todas as instâncias da vida, uma vez que também as reuniões eram proibidas. Um grupo com mais de três pessoas já era considerado motim.
No campo do jornalismo ela se expressou com a obrigatoriedade de revisão prévia das notícias feita pelos censores que, como revela o trabalho de Beatriz, tinha entre eles um número expressivo de jornalistas. As pessoas que se prestaram a esse papel eram contratadas como funcionários públicos e tinham curso superior, desfazendo-se então a idéia corrente de que os censores eram criaturas ignorantes e incapazes. Não o eram. No mais das vezes chegavam a ser “treinados” nas universidades, que ofereciam cursos sobre como censurar. O governo investiu muitos recursos neste tipo de capacitação. Vários dos censores foram entrevistados por Beatriz e a maioria tinha consolidada a certeza de que estava realmente ajudando a manter a moral e os bons costumes.
O livro de Beatriz também desvela como a censura explícita e realizada diretamente pelos funcionários públicos vai se transformando em autocensura. Os donos dos grandes jornais se mostravam incomodados pela intromissão governamental, mas não era muito em relação ao conteúdo noticioso, uma vez que a maioria dos empresários da comunicação apoiou o golpe e conspirava das mesmas idéias. Houve uma certa rusga, mas logo tudo foi se acomodando, e tanto, que os grandes jornais contratavam censores, aposentados ou não, para fazerem a pré-triagem. Ou seja, eles eram pagos pelo jornal para adequar as notícias ao gosto dos censores, para impedir que os jornais sofressem atrasos ou cortes. Isso foi gestando uma cultura de autocensura nos jornalistas, que acabaram incorporando a idéia de que certas coisas, temas, palavras e assuntos eram proibidos. Tudo se ajustou. A TV Globo, conta Beatriz, teve um funcionário deste tipo até os anos 90, ou seja, sobreviveu ao próprio
regime militar.
Informações desta natureza dão conta do caráter conservador do jornalismo de massa brasileiro, ficando para a resistência – pequena, alternativa e quase ineficaz – o território do jornalismo crítico. A coisa ficou tão contaminada nas grandes redações que, no início dos anos 70, os jornalistas contratados para noticiar a vida, distorcida pelas lentes da censura, eram também policiais. Ou seja, desfaziam-se os limites da repressão e da notícia. Só era noticiado aquilo que interessava ao regime e os jornalistas
eram eles mesmos os cães de guarda. Arrepiante relato.
A herança policialesca
Não foi sem razão que esta forma de autocensura acabou se
irradiado pelos demais meios de comunicação. No geral, os donos da imprensa
nacional compõem uma meia dúzia de famílias que, de forma capilar, acabam se
reproduzindo em todos os estados da federação. Em cada um deles se pode
observar o monopólio de um determinado grupo, que tem ligações muito próximas
dos “jornalões” e TVs do eixo Rio-São Paulo. E, como os donos são sempre parte
das elites locais, a forma de enxergar o mundo passa pelas lentes conservadoras
e muitas vezes oligarcas.
Quando a ditadura militar terminou, o processo de censura
estava consolidado. Mesmo com a volta da chamada democracia, nos veículos de
comunicação os temas proibidos pelos militares continuavam proibidos. Basta
lembrar a cobertura dos fatos que envolviam o MST. Ainda na metade dos anos 90,
falar de sem-terra era aberração. E, quando estes temas puderam ser mostrados,
a faceta policialesca do jornalismo seguiu de dentes arreganhados. Gente em
luta logo era enquadrada nas caixinhas de “bandidos”, “baderneiros”,
“invasores” e, agora, em pleno século XXI, “terroristas”.
Isso mostra que o terrível momento da censura e toda a sua
organização institucional e empresarial, tão bem narrados por Beatriz Kushnir,
ainda não acabou. Se assim fosse por que teríamos as matérias da Veja? Ou os
editoriais raivosos do Jornal Nacional? Por que causa tanto medo à elite que
domina os meios de comunicação um Conselho de Comunicação que junte movimentos
sociais, sindicatos e gente do povo? Por que a idéia de ter gente “comum”
discutindo a comunicação é apresentada como a possibilidade da censura? Por que
regular a atividade de comunicação está sendo chamada de censura?
Na verdade, toda essa algaravia de que o Conselho vai
trazer a censura é o exercício da má-fé dos mesmos de sempre, os que,
inclusive, sustentaram todo o processo de censura nos anos de chumbo. A chamada
“imprensa livre” não quer controle, não quer ninguém metendo o bedelho na sua
extração de mais-valia ideológica, como bem já analisou o pensador venezuelano
Ludovico Silva. A proposta do movimento social organizado não é a da censura.
Não é esconder temas, proibir palavras, impedir que a vida real se expresse nos
meios. Pelo contrário, o que foi construído pelos movimentos ao longo desta
infindável transição para a democracia é a proposta de controle social, algo absolutamente
natural num espaço que se diz democrático. As gentes têm sim o direito de
opinar sobre o que sai na TV e no rádio. Estes setores são concessões públicas
e a sede do poder é o povo. As pessoas têm sim o direito de estudar, discutir e
deliberar sobre a programação e os horários de exibição de determinados
conteúdos. Isso não é censura. Censura é o que os donos da maioria dos meios
fazem hoje ao ocultar fatos, ao não contextualizar os acontecimentos, ao
obscurecer a verdade. Isso é censura! O exercício do poder de veto de uma
elite, dona dos meios.
Por isso que num momento como esse, de profunda
desinformação provocada pelos mesmos meios, seria bem importante a leitura do
livro de Beatriz Kushnir. Porque ela dá nome e sobrenome aos donos dos meios e
aos jornalistas que colaboraram com a ditadura e com a censura. Porque mostra
que ser jornalista não significa, em última instância, ser crítico. Não o era,
naqueles dias, com grande parte dos jornalistas formados à facão, nas redações
e na vida, e continua assim hoje, com os jornalistas formados em cursos na
maioria medíocres e colaboracionistas em igual medida, articulados mais com os
empresários do que com os trabalhadores.
Beatriz desvela esse universo desconhecido do período da
ditadura militar que vai de 68 a 88 (quando da Constituinte), e isso é bom,
porque, afinal, a imprensa só fala bem de si mesma, e os jornalistas críticos
não têm onde escrever. Então, estas histórias muitas vezes só podem ser
contadas assim, quando são objetos de dissertações ou teses. No caso da Beatriz
avançou, virou livro e está aí para ser devorado.
Na história, o jornalismo sempre serviu às elites
É claro que um trabalho de gênese acadêmica tem suas
limitações. Ele precisa de recortes, é o que pede a academia, tão pouco afeita
a totalizações. Nesse caso, da discussão do jornalismo colaboracionista em
tempos da ditadura militar, faltou um pouco da história do próprio jornalismo.
Porque se a gente mergulha nessa história vai perceber que o papel da imprensa
não é, nem nunca foi fiscalizar o poder. De que a imprensa não é, nem nunca foi
um “quarto” poder. Ela é braço forte do poder instituído pelos poderosos, pelas
elites.
O jornalismo como profissão, como espaço de divulgação
diária de notícias sobre o mundo, nasceu com o capitalismo. Não que não
houvesse jornalismo antes, se considerarmos jornalismo o ato de noticiar algo
sobre o mundo. Os desenhos pré-históricos são notícias, as tábuas da
mesopotâmia são notícias, as pedras chinesas são notícias, a bíblia, o alcorão,
os vedas, a ilíada. Tudo isso são notícias. Mas o jornalismo, tal como o
conhecemos hoje, como espaço da informação diária, ela própria virada em
mercadoria, é cria do capitalismo. Os jornais diários são criados para o
anúncio das mercadorias. Os textos são assessórios.
Assim, se é o capitalismo que cria o jornalismo, o que podemos esperar desta prática humana? Nada mais nada menos que ela trabalhe para a consolidação daquilo que é o próprio sistema que a engendra. Se for assim, é da natureza do jornalismo ser colaboracionista do sistema. Do status quo. Por isso, durante a ditadura iniciada em 64, assim como no Estado Novo, boa parte do jornalismo esteve a serviço do sistema. Então, o que o trabalho da Beatriz nos revela é
pura e simplesmente o jornalismo sendo ele mesmo.
Ao longo da história do jornalismo nós vamos observar que o que sempre esteve em questão foi a liberdade de expressão dos donos do poder. As situações de crítica ou do jornalismo assumindo a frente de denúncias, desvendando maracutaias, etc, sempre foram coisas pontuais, espaço específico de alguns “jornalistas”, hereges, os fora da casinha. Pessoas, seres humanos comprometidos com uma outra visão. E também, ao longo da história podemos perceber que quando estes jornalistas tiveram poder, é porque de alguma maneira estavam ajudando seus patrões a ganharem dinheiro, ou porque estava acontecendo alguma mudança de temperatura do mundo, como por exemplo, no período da
abolição.
E os dias atuais?
Vamos nos remeter ao hoje. Qual a diferença entre o jornalismo
entreguista e colaboracionista dos anos de chumbo e o de hoje? Qual a diferença
do jornalismo praticado pelos Frias/Caldeira naqueles dias, e o praticado pela
Globo hoje, ou qualquer outro, Diário Catarinense, Record, etc??? Como eles
noticiam as FARC, os fatos na Venezuela, na Bolívia, em Cuba? Como são as
manchetes? Que denúncias aparecem na televisão, se não aquelas que são
levantadas pelos repórteres/policiais, que sobem os morros no carro da polícia?
Quem são os terroristas de hoje, apontados com nome e sobrenome na televisão?
Nada mudou. É da natureza do jornalismo ser parceiro do sistema.
Agora, mesmo diante desta realidade e justamente porque o
jornalismo é feito por pessoas, ele pode escapulir de seu leito. O jornalismo,
então, pode ser crítico. Sim, pode. Assim como o direito pode ser crítico, a
arquitetura, a história, a medicina. Todos os saberes podem ser críticos se as
pessoas forem formadas para isso, se aprenderem a fazer uso da criticidade.
Mas, como sê-lo se a escola é formatadora de uma mentalidade conservadora, se a
universidade é hoje um dos espaços mais atrasados, de colonialismo mental, de
reprodução do mesmo?
Há um autor gaucho que formulou seu pensamento mais original
em Santa Catarina, na Universidade Federal: Adelmo Genro Filho. Ele criou o que
chamou de “teoria marxista do jornalismo”. Também compreendeu que o
jornalismo é filho dileto do poder instituído, do capitalismo, mas, igualmente
percebeu que o jornalismo não é um “ente”, algo imobilizado, cristalizado. Ele
é praticado por pessoas. E estas são passíveis da dialética. Portanto, o
jornalismo apresenta brechas. E os jornalistas críticos podem e devem mergulhar
nessas brechas, trazendo para os leitores/ouvintes/espectadores um texto que
possa caminhar da singularidade do fato até a universalidade de toda a
atmosfera que envolve aquele acontecimento singular. Isso tira o maniqueísmo do
processo jornalístico e ele pode ser crítico em qualquer tipo de sistema.
Adelmo é pouco conhecido na universidade, talvez por sua teoria ser “marxista”,
o que só consolida o atraso da academia.
No caso da ditadura militar brasileira, foi o jornalismo
alternativo que usou do expediente de ser crítico. E hoje, igualmente é o
alternativo que combate o jornalismo chapa branca, que se entrega aos dominantes.
Mas, já não mais apenas como o jornalismo, tal qual o conhecemos, e sim como
uma proposta original, nascida das entranhas do que deveria ser, de fato, a
sede do poder, ou seja: o povo organizado. É a proposta da soberania
comunicacional, na qual está inserida a ideia de um conselho de comunicação
democrático, onde as gentes sejam protagônicas.
A soberania comunicacional
Por isso que não trabalhamos mais com a ideia de
democratização da comunicação, que era válida nos anos 90, mas que, agora,
encontra seus limites. Democratizar implica em melhorar o que aí está. E não é
isso que queremos. Nossa proposta é a de soberania comunicacional, algo que
pressupõe o novo, o absolutamente novo. O jornalismo reinventado, o jornalismo
assumido pelas gentes organizadas. Porque as pessoas sabem que o jornalismo que
aí está não lhes diz respeito. Por isso foi tão difícil aos jornalistas, e eu
diria que foi impossível, fazer as gentes compreenderem porque o STF devia
manter a exigência do diploma para o exercício da profissão. As
pessoas não se reconhecem no jornalismo dos grandes meios, não se vêem. Sabem
que não os representa. E isso provocou uma profunda derrota aos trabalhadores
do jornalismo, vitória para os patrões, que agora poderão explorar mais.
Mas, é por conta de não se reconhecerem no jornalismo
oficial, dos grandes meios, que os movimentos sociais estão se apropriando das
técnicas de comunicação para contar suas histórias. Querem produzir conteúdo,
controlar os meios, decidir o que é importante ou não. Querem exercer a
soberania. Uma grande batalha com a corporação, mas que precisa ser pensada e
compreendida. A luta contra o capital pressupõe a parceria com o povo. Sem as
maiorias os jornalistas que estão fora do sistema de colaboração tampouco
poderão avançar.
Não é sem razão que o sistema de poder, a se ver ameaçado
pelo povo, a verdadeira sede do poder, revê suas estratégias e as legaliza,
como vimos no livro de Beatriz Kushnir “Os cães de guarda”, no qual ela mostra
como a ditadura ia criando as leis que determinavam a censura, amparando
“legalmente” os desmandos de um governo ilegalmente constituído. Por isso, não
causa surpresa, hoje, a decisão jurídica definida pelo STF no que diz respeito
à profissão do jornalismo. Os empresários temem a opinião pública bem
informada, tal como já alertava George Orwell, no seu prefácio ao livro
“Revolução dos Bichos”. Assim, com medo do povo informado e caminhando para a
soberania, os donos dos meios inviabilizam a presença da massa crítica nas
redações dos seus veículos. Desregulamentar a profissão é diminuir ainda mais a
chance de qualquer pensamento crítico nos meios de comunicação de massa,
porque, afinal, mesmo levando em conta a formação colonizada, sempre há a
possibilidade de alguém escapar. Agora, sem lei que os ampare, sem exigência de
formação, será mais fácil contar com os colaboracionistas, os que se
autocensuram em nome da manutenção do emprego. Jogada de mestre.
Uma olhada no acórdão do STF e lá está: “os jornalistas são
os que se dedicam profissionalmente ao pleno exercício da liberdade de
expressão. Estão ligados e não podem ser pensados separadamente, então a
regulamentação da profissão vai contra o direito inalienável de expressão”.
Ora, que relações perigosas da justiça com o empresariado provocam uma fala
como essa?
O jornalismo é uma profissão, a liberdade de expressão não
depende do jornalismo. Qualquer ser humano pode escrever uma carta, pintar um
muro, fazer um desenho, gritar na praça. O jornalismo é uma profissão que, por
acaso, usa a palavra. Mas, agora, desregulamentado, se prestará ainda mais ao
jogo obsceno na censura velada. E aí estamos de novo no mesmo mundo de 68, 69,
70. A proposta dos conselhos de comunicação, com a participação de outros
setores da sociedade organizada, não garante nada, nem democratização,
nem soberania. Isso pode ser visto em outros conselhos já existentes como o da
saúde e o da educação. Mas é um espaço importante de organização, de compreensão.
Ou seja, é espaço “perigoso”, que pode provocar esclarecimentos, que pode fazer
as gentes avançarem para o desejo de soberania. Por isso esse é um tema tão
atacado. As elites têm medo do povo e isso é muito bom. Não é à toa, portanto,
que os dignos representantes da elite nacional falem tão mal do conselho, e se
esganicem falando que eles trarão a censura. Porque, na verdade, é o contrário.
O povo não trará a censura e sim o esclarecimento. E isso é coisa difícil de
engolir. Então, não surpreende que nas redações continuem vicejando
os cães de guarda, mais do que nunca. Aos jornalistas críticos estão relegadas
as margens, o alternativo. Com a diferença de que, agora, estes e as gentes,
juntos, poderão avançar no rumo da soberania comunicacional, construindo com os
movimentos organizados um outro tipo de estado, que não este, e uma outra forma
de organizar a vida, que não a capitalista.
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Elaine Tavares - jornalista
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