Negócios e sub-mundo dos humanos

17/04/2011
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O mundo dos negócios prospera enquanto o sub-mundo dos humanos debilita-se e perde o sentido para se vincular às cifras, a circulação de capitais e o acúmulo de riquezas.
 
A meritocracia não é um conceito assim tão desprezível porque sempre há os que trabalham mais que os outros e se destacam em certas atividades. As sociedades do mérito, no entanto, pouco enxergam de realização pessoal além do empreendedorismo privado dentro do capitalismo, uma vez que, nestas ideologias, sobressaem-se os indivíduos baseados no húngaro-tupinica Roberto Justus, que promove a competição e a concorrência.
 
A chaga está em que o mérito tem sido definido em função de uma lógica de eficiência econômica, em que se desqualificam pessoas um pouco menos aptas que outras ou que possuem dotes mal valorizados no circuito capitalista.
 
O resultado do embate seria, portanto, a existência de um vencedor e um perdedor, o que desmerece um segundo lugar ou alguém que não é tão eficaz como o primeiro colocado. Ficam de fora pessoas que não vendem bem, embora seriam ótimos flautistas ou violinistas.
 
O ex-presidente tupinica Lula superou, por este raciocínio, a importância do estadunidense Bill Clinton no ramo de debates e palestras ao redor do mundo. Lula, que reiterou antes de deixar o cargo que jamais abandonaria a política, virou um empreendedor de porte internacional ao fundar há poucas semanas a empresa LILS - Dissertações, Eventos e Publicações para vender a sua habilidade de discursar sobre temas do desenvolvimento.
 
Do outro lado do mundo, empreendimentos seguem o caminho inverso da prosperidade.
 
A indústria do leite sofre um revés na China devido ao escândalo que causou o adoecimento de trezentos mil bebês e a morte de outros seis que tomaram leite dos lotes que, desde 2008, estão contaminados com melamina, cuja substância se adiciona aos laticínios para adulterar testes de grau proteico. Acrescenta-se um composto prejudicial à saúde a fim de burlar a má qualidade que aquele leite teria em suas condiçoes naturais. Por esta razão, o governo chinês ordenou o fechamento de 533 indústrias lácteas ou quase metade das existentes no país.
 
Empreendedores em torno do mundo insistem em concorrer deslealmente entre eles em prejuízo dos clientes ou consumidores, que vivemos no sub-mundo dos humanos, quase sempre sem saber a procedência do que bebemos ou comemos. Quando alguém nos esmiuça ingredientes de alguns alimentos de nossa rotina, frequentemente deixamos de consumi-los.
 
Para não prejudicar seus lucros, diminuem a qualidade ou quantidade dos produtos (embalagens com folga de espaço, por exemplo a caixa de chiclete Mentos Pure Fresh sem açúcar vem com 5 unidades onde caberiam mais de 10, ou os salgadinhos cada vez mais comprimidos no fundo do saco), adicionam substâncias indesejadas (como na mistura de 25% de álcool quando o cliente compra gasolina), entre outras falcatruas do mundo dos negócios.
 
Ativistas ambientais e cientistas enfastiaram-se de tanto que alertaram sobre os riscos do uso da energia nuclear. Não perdem o vigor. Como se fosse um diálogo entre surdo e mudo, muitos não lhes deram atenção até que a crise nuclear no Japão reanimou o debate e a ação dos defensores de fontes mais limpas e seguras de energia. Emergiu um movimento da sociedade civil nipônica pela extinção de todos os reatores nucleares naquele país.
 
A empresa Tepco (Tokyo Electric Power Co) advertiu que há um vazamento de água radioativa de uma fenda de vinte centímetros num dos reservatórios da usina nuclear de Fukushima, norte do Japão, que flui ao mar. A emissão de níveis elevados inibe a aproximação de trabalhadores, que se sujeitam a arriscar a vida para frear a tragédia.
 
A onda de catástrofes que varre o planeta - inundações, deslizamentos, terremotos, mortes por intoxicação - atesta que a humanidade atravessa um momento de mudanças que nos exigirá aos verdadeiramente dignos mais desprendimento e trabalho.
 
O debate sobre temas políticos também norteará a nova fase da humanidade, que até então fazia vista grossa a ditadores, imposições e monopólios, por menos que estes fenômenos nos afetem diretamente ou assim acreditemos.
 
Na Síria, protestos contra o presidente Bashar al Asad têm resultado em feridos e mortos desde meados de março. Síria, Líbia e Yêmen são os três países árabes da região conflitiva da África setentrional e Oriente Médio cujos governantes resistem à renúncia, enquanto os de Egito e Tunísia cederam o poder. Esta parte do planeta é riquíssima em petróleo, gás natural e água doce, para recordar aos que querem entender por que Estados Unidos, França e Inglaterra estão interessados em "pacificar" e influir no processo de transição política.
 
A hora é agora se quisermos deter a voracidade do empreendedorismo a fim de despertar a sonolência dos humanos. Do contrário, os negócios continuarão ignorando que habitamos o mesmo mundo, pois não se envergonham de deixar-nos as ruínas.
 
Bruno Peron Loureiro é mestre em Estudos Latino-americanos pela FFyL/UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México). http://brunoperon.com.br
https://www.alainet.org/es/node/149112
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