Como foi o mundo até o fim de 2018

Em termos gerais, as previsões para 2019 apontam para a acumulação dos problemas de 2018 que ficaram por resolver.

09/01/2019
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No início de 2018, as perspectivas de crescimento da economia mundial eram marcadas pelos seguintes factores: a possibilidade de uma confrontação comercial gerada pelas políticas protecionistas dos Estados Unidos de América (EUA); o crescente risco de fuga de capitais para os EUA, em resultado das sucessivas subidas da taxa de juros da Reserva Federal americana (FED); a incerteza generalizada quanto a saída da Grã Bretanha da União Europeia (BREXIT) e à reconfiguração do mercado europeu; o crescente nível de endividamento das economias centrais; o poder da grande banca internacional de transferir os seus problemas para os fiscos das economias centrais; e a China e Índia a manterem-se as economias mais dinâmicas, face à estagnação das economias centrais.

 

Em Março começou a escalada de agressões comerciais entre os EUA e a China, com os norte-americanos a imporem direitos aduaneiros às importações de painéis solares e máquinas de lavar chineses. Esse acto deu início a um conflito de ataque e retaliação de direitos aduaneiras. Até ao fim deste ano esta guerra impôs direitos aduaneiros a mais de 13 mil produtos e acumulou um saldo estimado de 363 mil milhões de dólares. No quadro do G20, em Buenos Aires, na Argentina, os mandatários declararam uma trégua aduaneira de 90 dias, a contar do dia 3 de Dezembro, que impedirá as taxas aduaneiras de passarem de 10 para 25 %, em Janeiro. As agressões transferiram-se para a esfera empresarial, com a detenção cruzada de representantes empresariais do sector tecnológico. O Canadá deteve a CFO da Huawei, acusada de fraude pelos EUA, enquanto a China deteve dois cidadãos canadenses, um dos quais diplomata do International Crisis Group, ambos acusados de ameaçarem a segurança e a integridade nacional desses países. O problema de fundo é que a Huawei chinesa conseguiu roubar ao mercado a tecnologia 5G da Internet e começar a vendê-la em Agosto, antes de a AT&T lançar a sua em Dezembro de 2018. Em resposta, os EUA acusaram a China de utilizar o 5G para espionagem ao Ocidente, convencendo a Austrália e a Nova Zelândia a não a comprarem, e tentando influenciar o Canadá e a União Europeia do mesmo. Isto divide o mercado do 5G em duas partes: o Ocidente para a AT&T e o resto do mundo para a Huawei. Apesar de tudo, a China já ganhou a corrida tecnológica. A rede 5G é uma rede de Internet necessária pela sua velocidade e complexidade.

 

A tendência para a subida da taxa de juros da FED, que se anunciou já em Maio de 2013 e começou efectivamente em Dezembro de 2016, manteve-se, com aumentos de 0,25 % em Março, Junho e Setembro. Actualmente, encontra-se a 2,25 % e, de acordo com o que já foi anunciado, ainda deve aumentar cerca de 2 %, em tranches trimestrais, até alcançar os 4 %, em 2020. As consequências sobre as taxas de juros do resto do mundo, especialmente das economias periféricas dependentes da economia norte-americana, ainda não se fizeram sentir. Na América Latina, só o México acompanhou os aumentos a par e passo, com uma subida acumulada de 2,25 pontos percentuais, durante 2018, até a uma taxa de 8%. As restantes economias ajustaram as suas taxas de juros sobre objetivos internos de inflação, com a excepção da Argentina e da Venezuela, que atravessam processos de alta e híper inflação. Os outros efeitos já se fizeram sentir na depreciação das taxas de câmbio e na descida dos preços das matérias-primas.

 

Durante o ano de 2018, levou-se a cabo uma estranha negociação para renovar o TLC da América do Norte (1994), no quadro da guerra comercial entre os EUA e a China, que se iniciou com a imposição unilateral de direitos aduaneiros ao aço e ao alumínio pelos EUA sem que houvesse retaliações. Contraditoriamente, a economia norte-americana avançou com um acordo regional “trilateral” que, na realidade, é a soma dos acordos bilaterais, por um lado; e como já tinha feito, com um bloqueio comercial e medidas de proteção do seu mercado interno, por outro.

 

A assinatura do novo T-MEC não significou o cancelamento das políticas protecionistas. Pelo contrário, proíbe o México e o Canadá de assinarem novos acordos de comércio livre com a China e Cuba, ao mesmo tempo que reforça a concentração da indústria automóvel a nível regional. Outro elemento é o prolongamento dos direitos de autor para 70 anos, que é fatal para a indústria dos fármacos genéricos. O novo Acordo incorporou a ampliação do protecionismo americano ao bloco, no seu todo. Por ora, as consequências de todas as medidas anteriormente descritas, a que se acrescem as consequências das barreiras aduaneiras das maiores economias importadoras, traduziram-se no encarecimento das importações e na subida de preço dos bens finais, que levou à redução do volume de comércio, deixando-o num novo patamar de crescimento moderado de 4%. As exportações da China viram-se afectadas em Março de 2018, mas recuperaram o seu nível e o seu rumo; e, enquanto que as importações americanas continuam a crescer, as importações da China estagnaram naquilo que pode muito bem vir a tornar-se uma política de industrialização de bens de consumo, que é o que a China importa dos EUA.

 

A guerra comercial continua, porque, após a imposição de direitos aduaneiros a todas as importações com a China, os EUA ainda podem aumentá-los. Por sua vez, a China tem muito mais margem para taxar novos produtos e também aumentar os direitos aduaneiros. A diferença é que, enquanto os EUA importam bens intermédios e de capital da China, a China importa bens de consumo e alimentos. A curto prazo, a China facilmente pode substituir o mercado de bens de consumo; já para os EUA talvez seja impossível substituir a provisão de bens de capital e intermédios feitos à medida. A Europa é a alternativa natural para prover bens de consumo. Há que recordar duas coisas: que o outsourcing foi uma invenção americana para melhorar a produtividade das suas empresas e que as zonas económicas especiais da China foram concebidas para acomodar esse outsourcing.

 

O mercado financeiro internacional registou um desempenho medíocre durante o ano. Apesar disso, convém recordar que se pauta por uma lógica protecionista dos Estados nacionais e uma ausência de normas internacionais, o que permitiu o desenvolvimento de bolhas gigantescas e níveis de endividamento impossíveis de saldar, dado o fraco desempenho das economias maduras. Em 2018, pouco se avançou na direção do estabelecimento de um quadro regulatório mais abrangente para a atividade financeira e dos Acordos de Basileia IV, definidos para evitar um colapso como o sucedido em 2008. A curto prazo, mantém-se o cenário de alto risco financeiro do colapso dos mercados especulativos. Os índices principais do mundo estão em queda desde Outubro, e 2018 encerra com o índice Dow Jones abaixo do nível de Janeiro.

 

Em termos gerais, as previsões para 2019 apontam para a acumulação dos problemas de 2018 que ficaram por resolver. Enquanto as economias centrais se mantiverem estagnadas e com tendência para sofrerem quedas de produtividade e enquanto não se detiver o aumento das taxas aduaneiras, das políticas de protecionismo e da subida das taxas de juros dos EUA, o cenário previsto para a economia mundial (salvo as economias emergentes asiáticas) em 2019 é de um ano ainda mais difícil. A América Latina, que exporta mão-de-obra barata da Bacia das Caraíbas para os EUA e matérias-primas da América do Sul para a China, manterá um padrão de crescimento baixo. O crescimento da região não depende das exportações, mas do investimento e do consumo. A Europa não crescerá grande coisa, devido aos efeitos da incerteza em relação ao desfecho do BREXIT. A tudo isto, junta-se o risco crescente de uma nova crise financeira americana por contágio, produto da falta de regulação internacional. E a isto é preciso somar também o custo das alterações climáticas sobre a economia mundial, traduzido em danos materiais.

 

Africa

 

(nota do editor)

 

Um exemplo das disputadas geopolíticas contemporâneas, a África viu as transações comerciais da China superam em mais de quatro vezes as realizadas pelos EUA e União Europeia. África continua a determinar pouco ou quase nada na geopolítica e conjuntura mundiais. No que diz respeito à instabilidade e à vulnerabilidade económicas, o prognóstico não inspira muita confiança. Tanto a União Europeia e os Estados Unidos quanto a actual China neoimperial continuarão a ter o continente africano como um palco de batalha. Sendo a África um dos mais importantes fornecedores de matéria prima, continua a não realizar o sonho de se industrial. Com uma elite (económica mas também política) do tipo comprador (compradorial elite), e devido aos interesses inerentes a essa condição, o continente continuará colocado na cauda da história.

 

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Este artigo foi escrito originalmente em espanhol. A Alternactiva teve a autorização especial de o traduzir e republicar, incluindo a agregação da nota  sobre a África. O título deste artigo foi adaptado.

 

Tradução: Michelle Hapetian

 

Oscar Ugarteche, Pesquisador Responsável, IIEc-UNAM, Conacyt / SNI, Coordenador do OBELA.

 

– Armando Negrete, Técnico Acadêmico, IIEc-UNAM, Membro do OBELA.

 

http://alternactiva.co.mz/2018/12/22/como-foi-o-mundo-ate-o-fim-de-2018/

 

https://www.alainet.org/es/node/197457
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