Dois afilhados de Pinochet querem a presidência do Chile

27/06/2013
  • Español
  • English
  • Français
  • Deutsch
  • Português
  • Opinión
-A +A
Dois políticos de extrema-direita pretendem chegar à Presidência do Chile, mas só um deles poderá tentar depois de eleições primárias ou eliminatórias que se realizarão no dia 30 de junho.

Andrés Allamand (AA) e Pablo Longueira (PL) são, respectivamente, os pré-candidatos dos partidos Renovação Nacional (RN) e União Democrata Independente (UDI), que emergiram nos anos oitenta, em plena ditadura do general Augusto Pinochet Ugarte (APU), que permaneceu no poder durante 17 anos a partir de 1973.

A ditadura suprimiu todos os partidos políticos e também as organizações de qualquer natureza como a Central Unitária de Trabalhadores (CUT) e converteu em “delito” toda classe de eleições, incluídas as de entidades desportivas, como clubes de futebol. Entretanto e como efeito do enorme repúdio universal, a Junta Militar autorizou a criação da UDI e a reaparição do Partido Nacional, que havia fomentado o golpe de Estado e que se remoçou com aquilo de “Renovação”. Todo este teatro tinha o propósito de aparecer como democráticos…

Em 1988 se efetuou o plebiscito no qual se votava por Sim ou Não sobre a permanência de APU no poder. As duas entidades mencionadas respaldaram, por suposto, o tirano, mas como é sabido, o “Sim” perdeu e se fortaleceram desta maneira o repúdio a Pinochet e seus crimes, dos quais a UDI e a RN foram e são responsáveis políticos e morais.

O apelativo da UDI é risível, pois como pode ser democrata uma entidade que nasceu das entranhas da tirania? Mais falso resulta, também, isso de “independente”, pois se trata de uma cópia fiel do Partido Popular da Espanha, que emergiu depois do falecimento de Francisco Franco, que teve um discípulo em Pinochet.

As eleições presidenciais e para o Congresso Nacional (deputados e senadores) serão realizadas no Chile em novembro próximo, quase ao término da presidência de Sebastián Piñera (RN), único direitista eleito em duas décadas de pós-tirania. Allamand foi ministro da Defesa de Piñera e Longueira se desempenhou na pasta de Economia. Agora, outros dois ministros renunciaram (Joaquim Lavin e Luciano Cruz-Coke), para assumir como chefes das campanhas eleitorais dos pré-candidatos direitistas.

Há divisão na direita política chilena? De nenhuma maneira. Trata-se apenas de matizes, pois ambas as coletividades se distinguem por seu amor eterno a Pinochet e com ele ao regime que, a sangue e fogo, estabeleceu no Chile a primeira tentativa de capitalismo selvagem. Lembre-se que Milton Friedman, o teórico da tese que propugna a privatização total e que inclui a supressão do Estado, viajou com rapidez a Santiago do Novo Extremo para aplaudir, em pessoa, Pinochet e os seus.

Oito anos depois do retiro forçado da APU se registrou um episódio demonstrativo do amor eterno dos conservadores chilenos por quem matou, torturou, prendeu e exilou milhares de compatriotas. No final de outubro de 1998, aquele que abandonou o poder em 1990 e se ostentava como “senador vitalício” foi detido em Londres e ameaçado de ser levado à Espanha para ser julgado, por conta de uma petição dos advogados Baltasar Garzón e Joan Garcés, membros do Departamento Jurídico da Anistia Internacional, que lhe acusavam do homicídio, no Chile, de cidadãos espanhóis.

No início de novembro de 98 já estava instalado em Londres o estado maior da UDI e da RN, que visitaram o general já declarado réu no Groveland Hospital, pois havia se auto declarado doente. Participaram: Alberto Espina, então presidente da RN e atual senador; Pablo Longueira, deputado, presidente da UDI; Patricio Melero, deputado, atual presidente da UDI e Joaquín Lavin, nesta época pré-candidato presidencial da UDI.

Foram render reverência ao ex-ditador, mas também puderam constatar que em Londres havia manifestações públicas de repúdio a APU. Em um destes atos realizado em Trafalgar Square esteve presente a chilena Sola Sierra, então presidenta da Agrupação de Familiares de Detidos Desaparecidos. Foi nestes dias que Pinochet, com marcado cinismo, disse: “Querem me condenar sem provar denúncias” (sic e antológico).

Foi o “The Sunday Times” o periódico que divulgou tal afirmação, a qual agregou que sua prisão “destruiria os esforços de conseguir uma reconciliação no Chile”. Outra: “Me entristece que a experiência de minha prisão tenha sacudido minha confiança na Grã Bretanha”. No Chile foram registradas vozes a favor do preso. Algumas delas: Andrés Chadwick, atual ministro do Interior de Piñera: “A autoridade tem o dever de resguardar o bem comum e, muitas vezes, isso exige que não se dê a conhecer toda a verdade” (revista “Que Pasa”, 2-9-91); Evelyn Mattei, atual ministra do Trabalho: Calem-se, comunistas de merda” (re-sic) (Revista “El Sábado”, 7-10-98); Joaquín Lavin: “É um senador e um ex-presidente da República que viaja com passaporte diplomático e, portanto, com a proteção do Chile” (jornal “La Nación”, 18-10-98).

Houve também palavras de outra índole. Por exemplo, as do bispo católico Carlos Camus, registradas por “La Nación” em 1-3-99: “Qual é o destino de Pinochet? Terá que pagar na outra vida. O julgamento de Deus é muito mais profundo. Nesta vida nunca poderia pagar o sofrimento dos torturados, dos assassinados, dos desaparecidos. Como se faz aparecer um desaparecido cujo corpo foi triturado, jogado ao mar ou destruído por fosfato? Como se repara esta dor?”.

O próprio Pinochet contribuiu para sua condenação, pelo menos moral. Aqui suas afirmações: “Não se executaram pessoas, mas animais”, e outra: “Quando o exército sai (sic), o faz para matar, porque para isso está treinado” (Madri, jornal “El País”, 1985).

Pinochet pode voltar ao Chile como suposto inválido, falso mal que utilizou para evitar a extradição à Espanha. Entretanto, o episódio de Londres foi útil para conseguir que fosse processado no Chile, o que aconteceu em 2001. Sua defesa invocou novamente motivos de saúde, mas o juiz Juan Guzmán, ministro da Corte de Recursos, pode processá-lo como autor de 57 homicídios e 18 sequestros.

Hoje, em 2013 e com APU já falecido, continuam no Chile e no estrangeiro os processos pelas incontáveis vítimas de um pesadelo que começou há quarenta anos e permaneceu por mais de três quinquênios. Em fevereiro passado, a Espanha solicitou a extradição dos sete assassinos do diplomata madrilenho Carmelo Soria, que trabalhava na CEPAL com sede em Santiago de Chile.

Foi pedida pela Corte Suprema chilena a extradição, dos Estados Unidos, do chileno Pedro Barrientos Núñez que é um dos oito oficiais que mataram, em uma prisão em 1973, o conhecido músico Victor Jara, cujo cadáver tinha 44 impactos de balas.

- Hernán Uribe é jornalista e escritor chileno

Tradução: Libório Júnior
 
 
https://www.alainet.org/es/node/77177?language=es
Suscribirse a America Latina en Movimiento - RSS