Para entender as ruas: quais são as prioridades da população brasileira?
22/01/2014
- Opinión
Nos últimos meses, muito se especulou a respeito das razões que levaram milhares de pessoas às ruas em junho de 2013. Há várias teorias e hipóteses circulando a respeito da nova realidade da composição social brasileira que tirou praticamente uma França da marginalidade a partir do governo Lula. O fenômeno mais recente dos “rolezinhos” dá prosseguimento a este debate. Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em 2013 traz alguns dados importantes para pensar essa questão.
A pesquisa “Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS) – Nossos Brasis: prioridades da população” ouviu 3.810 pessoas, em agosto de 2013, em mais de 210 cidades brasileiras. Segundo esse levantamento, saúde e educação são as principais preocupações da população brasileira. A melhoria dos serviços de saúde foi apontada como prioridade por 87,64% dos entrevistados. Depois se seguiram: uma educação de qualidade (72,97%), a proteção contra o crime e a violência (61,44%), melhores oportunidades de trabalho (60,28%), um governo honesto e atuante (59,85%), e acesso a alimentos de qualidade. As escolhas foram feitas entre 16 opções ordenadas aleatoriamente.
A pesquisa apurou ainda as diferenças de prioridades de acordo com as diversas características dos indivíduos. Entre os entrevistados com até a 4ª série, as prioridades foram proteção social, combate à violência e acesso a oportunidades de trabalho. Os mais pobres, em relação aos mais ricos, também priorizam mais proteção social, oportunidades de trabalho e proteção contra o crime e a violência. Entre os beneficiários das políticas sociais do governo federal, as prioridades são acesso à água potável e ao saneamento, oportunidades de trabalho e a alimentos de qualidade.
Os entrevistados de 15 a 29 anos priorizaram educação de qualidade, eliminação do preconceito e da discriminação e liberdades políticas. Os mais velhos priorizaram mais governo honesto e aposentadoria. Entre as mulheres, foram destacados o acesso a alimentos de qualidade e à água potável e saneamento, além de educação de qualidade. Já os homens priorizaram mais governo honesto e atuante, liberdades políticas e melhoria dos transportes e estradas.
Considerando a distribuição geográfica da população, os entrevistados do Nordeste deram prioridade ao acesso à água potável e ao saneamento, seguindo-se a alimentação de qualidade e o combate às mudanças climáticas. Levando em conta apenas as capitais, as prioridades são oportunidades de trabalho, alimentação de qualidade e proteção contra o crime e à violência.
Os desafios da educação
Os números que falam sobre a realidade da educação brasileira talvez sejam os dados mais importantes para compreender as razões que movem a maioria da juventude do país hoje. Apesar de significativos avanços nos últimos anos, a desigualdade ainda é uma marca e um desafio para o Brasil no terreno da educação. Outro estudo do IPEA, este de 2010, faz uma análise da educação no período de 1992 a 2009, traçando um quadro detalhado da atual situação da escolarização da população brasileira com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2009, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A dimensão dessas desigualdades fica clara quando se olha para o índice de analfabetismo entre a população de 15 anos ou mais, que ainda é considerado muito alto, atingindo 9,7% dessa faixa populacional. A distribuição desse índice apresenta grandes diferenças entre a população urbana e rural (4,4% contra 22,8%), branca e negra (5,9% contra 13,4%), e entre as regiões Sul e Sudeste (5,5% contra 18,7%). Quando comparados os 20% mais ricos da população brasileira e os 20% mais pobres, a diferença também é grande: 2% contra 18,1%. O maior percentual de pessoas que não sabem ler e escrever encontra-se na população acima de 40 anos: 16,5%. A média de anos de estudo na população com 15 anos ou mais é de 7,5, abaixo do mínimo de oito anos previsto na Constituição Federal.
Outro problema sério que persiste na educação brasileira é a falta de adequação da idade ao grau de ensino. Na faixa entre 15 e 17 anos, por exemplo, mais de 85% das pessoas estão na escola, mas apenas 50,9% frequentam o ensino médio. No contexto atual da educação nacional, esse índice de adequação diminui conforme aumenta a idade. Outro obstáculo para uma educação de qualidade é o baixo índice de conclusão dos cursos. Hoje, apenas 66,6% dos alunos que entram no ensino médio conseguem concluí-lo. Um caminho para reduzir esse problema em particular vem sendo apontado pelo programa Bolsa Família que tem contribuído para a redução da evasão escolar.
Segundo dados oficiais de 2010, a frequência escolar de crianças de 6 a 17 anos das famílias beneficiárias do programa foi 4,4% maior em comparação com a frequência escolar das crianças das famílias não beneficiárias. Somente na região Nordeste, essa diferença foi de 11,7 pontos percentuais a favor das crianças das famílias beneficiárias. A progressão de série escolar para crianças de 6 a 17 anos de famílias beneficiárias foi 6,0% maior em comparação com famílias não beneficiárias. O impacto é maior entre as meninas de 15 e 17 anos, quando a diferença chega a 19 e 28 pontos percentuais, respectivamente.
Outro dado que impacta positivamente a educação é a tendência de queda da taxa de trabalho infantil no país. Em 2004, havia um contingente de 5,3 milhões de trabalhadores com idade entre 15 e 17 anos. Em 2009, esse número caiu para 4,3 milhões. O nível de ocupação entre 5 e 17 anos de idade continuou a tendência de declínio, observada nos anos anteriores, em todas as faixas etárias, segundo dados do Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/ 2009).
Esses resultados positivos, porém, não escondem os problemas a serem enfrentados. E um dos que mais pesam para a perpetuação da pobreza e de desigualdades sociais é a educação.
https://www.alainet.org/es/node/82532
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