Governo deve priorizar agricultura familiar como estratégia de produção de alimentos

27/02/2014
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 Vice-presidente da CUT, Carmen Foro, aponta avanços no incentivo à produção familiar, mas destaca que melhoria social do país exige mudanças na visão sobre o modelo agrícola
 
Para Carmen, ascenção social da população brasileira exige maior investimento na agricultura familiar, responsável pela maior parte dos alimentos que os brasileiros comem (Fotos: Roberto Parizotti)
Responsável por 33% do Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil e por 74% da mão de obra empregada no campo, a agricultura familiar deve orientar o modelo de produção agrícola no país, defende a vice-presidente da CUT, Carmen Foro.

Para a dirigente, também agricultora familiar, uma nação que tem como prioridade combater a fome deve se preocupar prioritariamente com a soberania alimentar e observar que esse modelo de produção é responsável por 70% dos alimentos na mesa dos brasileiros, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).

O debate sobre o tema ganha ainda mais destaque em 2014 com a definição pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Ano Internacional da Agricultura Familiar, decisão que, para Carmen, também foi uma vitória brasileira.

“Tivemos papel fundamental nesse sentido por conta da capacidade de mobilização dos movimentos do campo e da decisão política, a partir do governo Lula, de colocar essa forma de produção em destaque.”

O resultado dessa mudança visão fez diminuir cerca de 50% a taxa de pobreza rural, o equivalente a 11 milhões de miseráveis apenas no campo, segundo estudo do MDA. Ainda de acordo com o levantamento, os programas sociais foram a fonte de renda que mais cresceu no campo (21,4%).

Da mesma forma, os movimentos sociais conquistaram ações de crédito e apoio à comercialização dos alimentos. Com isso, surgiram ações como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que disponibilizará R$ 21 bilhões de crédito para a safra 2013/204.

Refoma agrária – Para Carmen, porém, os avanços precisam se transformar em políticas de Estado para que a continuidade não dependa de uma visão progressista dos próximos governos. Além disso, as medidas não podem excluir a necessidade de o país retomar a reforma agrária.

“Não é possível produzir comida se não tivermos celeridade tanto em relação à desapropriação de terras para a agricultura familiar produzir, quanto na regularização de áreas. Temos de entrar em um novo ciclo, não é possível tratar tudo como igual, porque não somos iguais ao agronegócio, temos finalidades diferentes. Se o agronegócio é importante para a balança comercial, a agricultura familiar é fundamental para garantir soberania alimentar”, avalia.

De acordo com o Censo Agropecuário mais recente, divulgado em 2006 pelo IBGE, apesar de representar a forma de produção mais presente no campo (84,4%), a agricultura familiar possui apenas 25% das terras no país.

Carmen aponta que um dos problemas é a avaliação do governo Dilma sobre a necessidade de primeiro qualificar os assentamentos e garantir a produtividade para depois voltar a desapropriar.

“O governo precisa sair deste lugar que já está há bastante tempo, de dizer que é muito caro desapropriar. Temos sim muitos assentamentos que não tiveram a atenção devida, mas também temos muita gente precisando de terra para produzir. Mais de 40 milhões de pessoas passaram a ter melhores condições de comer e se não investirmos na produção de alimentos, enfrentaremos problemas.  Precisamos pensar numa reforma agrária que regularize, desaproprie, garanta qualidade de vida para quem está no campo e permita produzir de maneira sustentável”, ressalta.

Cidade – Por ser uma atividade que tem como mão de obra essencialmente o núcleo familiar e é voltada ao consumo interno, em contraste com o agronegócio, que utiliza trabalhadores contratados e é voltada à exportação, a agricultura familiar precisa de incentivos para quem produz sem agrotóxico como forma de baratear o custo do alimento ao consumidor.

“Isso depende de decisão política. Até agora, tivemos construção da Política Nacional de Agroecologia, que significa um avanço importante, mas ainda precisa de muito tempo para sua consolidação e de maiores investimentos. Devemos ter algo amplo para mudar a lógica de produção agrícola no nosso país”, afirma.

Esse modelo precisa também levar em conta as condições da família que produz e a concorrência econômica, explica a dirigente.

“Há questões que precisamos avaliar: como a família irá sobreviver se toda comunidade produz com veneno? Há o ponto da contaminação, mas também do olhar do mercado. Se por um lado a produção dele é algo importante, por outro enfrenta a concorrência do preço mais barato, porém, com agrotóxico. Isso é um desafio estruturante para definir qual modelo teremos no nosso país.”

Macrossetor e mulheres – Central com maior representação no campo – são 17 federações filiadas e mais de 1.500 sindicatos –, a CUT discute a criação de um macrossetor rural e deve realizar até o final do primeiro semestre deste ano um seminário para apontar o caminho na organização do setor.

“Desde novembro, todos os congressos de federações filiadas à CUT no Ceará, Rio Grande do Norte, Alagoas, Roraima e Piauí tiveram como centro do debate a construção de um modelo de desenvolvimento para o campo que seja sustentável e avance a partir da reforma agrária.”

Outro ponto comum em todos os encontros, comenta Carmen, foi o crescimento da participação das mulheres do campo, fator que coloca em debate a ocupação dessas trabalhadoras dos cargos de direção.

“Esse reflexo deve estar no comando político do movimento e não só na participação. Esse fruto, que é fruto de manifestações como a Marcha das Margaridas, realizada em parceria com a CUT, mostra o fortalecimento das trabalhadoras e aponta que não abrimos mão do empoderamento nos espaços políticos”, afirma. 
 
26/02/2014
 
https://www.alainet.org/es/node/83529
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