A estrela de Belém

22/12/2012
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Conta a Bíblia que sobre a cidade de Belém da Judéia reluziu uma estrela quando nasceu Jesus. Provenientes da Babilônia, os reis astrólogos, também conhecidos por magos, orientaram-se por ela até chegarem à manjedoura, junto à qual adoraram o Menino. Mas o rei Herodes, que governava a Palestina, viu na estrela um mal presságio. Já que o seu poder não tinha forças para apagar a estrela no céu, ordenou que o Messias fosse eliminado da face da Terra. O Natal é uma festa paradigmática. Seus símbolos, aparentemente tão infantis, são psicologicamente profundos. Viver é uma experiência natalina. A diferença é que, em torno de 25 de dezembro, três fatores se somam: o caráter religioso da festa, que impregna a boca da alma de estranho sabor de nostalgia; a fissura papainoélica do consumismo e dos presentes compulsórios; e a proximidade da virada do ano. Enquanto a compulsiva comercialização da data condena-nos à ressaca espiritual, o caráter religioso da festa deixa-nos com saudades de Deus, e a chegada do Ano Novo reforça nosso propósito de melhorar de vida. Daí o sentimento conflitivo de quem gostaria de acordar na manhã de 25 e encontrar, nos sapatos, um símbolo de afeto, o afago à criança que dorme dentro de nós, mas sabe que, no império do mercado, a idade adulta é inimiga da infância. "Ora, direis ouvir estrelas!", canta o poeta. Sim, temos olhos e ouvidos para os signos que expressam o novo. Na vida, nossos passos são conduzidos por estrelas, sonhos e ambições que simbolizam a fonte da felicidade. Nunca estamos satisfeitos com o que somos ou temos. Pois feitos de matéria transcendente, trafegamos no labirinto da existência seduzidos pelo absurdo, mas famintos de Absoluto. Para os antigos, a imagem da utopia era um jardim repleto de fontes, flores e frutos. Para a Bíblia, o Jardim do Éden, que em hebraico significa "lugar das delícias", lá onde se suprime o limite entre o natural e o sobrenatural, o humano e o divino, o efêmero e o eterno. Hoje, nosso mal-estar advém desse horizonte estreito em que miramos estrelas cadentes. Raras as ascendentes. Encerramos o século e o milênio como aprendizes de deuses, capazes de engendrar vida em provetas e possuir olhos eletrônicos que penetram a intimidade da matéria e do Universo, sem, no entanto, erradicar a fome, a desigualdade e a injustiça. Somos órfãos da esperança. Quase tudo está ao alcance do poder do dinheiro, exceto o que mais carecemos: um sentido para a vida. Tateamos, sonâmbulos, nessa interminável noite de insônia. Calam-se as filosofias, confinadas aos limites da linguagem; desaparecem as utopias, travestidas no mesquinho desejo de poder e posse de refinados objetos; enquanto as religiões cedem às exigências do mercado e oferecem o lúdico a quem busca luz, sem abrir as portas que nos conduzam à inefável experiência de Deus. "E agora, José?" Agora, é mudar o Natal e nós próprios. Dar as costas a Papai Noel e procurar a estrela em nossas inquietações mais profundas. Descobrir a presença do Menino em nosso coração. E, como sugeriu Jesus a Nicodemos, ousar renascer em gestos de carinho e justiça, solidariedade e alegria. Em vez de dar presentes, fazer-se presente lá onde reina a ausência: de afeto, de saúde, de liberdade, de direitos. Dobrar os joelhos junto à manjedoura que abriga tantos excluídos, imagens vivas do Menino de Belém. Feliz Natal, criança maltrapilha chamada Brasil! Queira Deus que o Herodes que nos habita ceda lugar aos magos que acreditam na estrela e ofecerem ao milagre da vida o melhor de si. Frei Betto é escritor, autor, entre outros, da biografia romanceada de Jesus "Entre todos os homens" (Atica).
https://www.alainet.org/fr/node/105172
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