Na pele dos jogadores
29/06/2006
- Opinión
Somente quem passou por situações análogas aos nossos jogadores de futebol, pode fazer-se uma idéia da terrível pressão psicológica pela qual estão passando. De repente são o foco de todas as atenções nacionais e internacionais, caçados pelos jornalistas e perseguidos pelos fotógrafos.
Há sempre o risco de que a notoriedade seja internalizada na forma de cobrança. Os jogadores sentem-se na obrigação de provar que a imagem que o público fez deles corresponde à realidade.
O filósofo F. Nietzsche se perguntou se poderia haver algum burro trágico e respondeu: sim, trágico é o burro que caiu sob o peso de sua carga e que, por causa dela, não consegue mais se levantar. Longe de mim considerar nossos jogadores de burros (burro seria eu), mas vejo que sua situação é semelhante ao burro de Nietzsche. Dai se entendem os temores e as indisposições sem causa aparente funcionando como verdadeiros super egos castradores de sua espontaneidade e de sua criatividade.
Mas a pior que pode acontecer é a identificação entre a pessoa e a imagem. Uma coisa é a pessoa, com a consciência de seus limites e, no fundo, com a percepção de sua humana fragilidade e até miserabilidade como se tem visto em algumas celebridades futebolísticas. Outra coisa é a imagem do "rei do futebol", do "fenômeno" ou do "maior jogador do mundo".
Quem pode garantir a verdade destas afirmações? Só Deus mesmo, pois nossas apreciações são humanas e, por isso, subjetivas e muitas vezes discutíveis.
Sábio é o treinador que lhes recordar estas verdades para garantir a saúde psicológica de seus jogadores. Infeliz do jogador que acreditar e se identificar com tais títulos. Este está condenado a continuamente ter que representar. Sabemos que pessoa e imagem nunca se cobrem totalmente. Se o jogador não é autocrítico, trava-se dentro dele uma luta entre a imagem pessoal interior e a imagem exaltada que fazem dele. A imagem interior, por ser verdadeira, fala mais alto e quer ser ouvida. Se não for escutada, o jogador será castigado com inseguranças e com tremores.
Então vêm à tona as cobranças internalizadas que podem desestruturá-lo: Ai do Ronaldo se não conseguir ser em cada partida o melhor do mundo.
Logo se inventam mil e uma explicações. Ai do Ronaldinho Gaúcho se não mostrar seu jogo alegre e endiabrado. Infeliz do Robinho se não conseguir dar os famosos dribles e não se mostrar como um fantasminha incontrolável em campo. E assim por diante.
Como sair deste impasse? Não sei. Mas vejo um caminho: a coragem do jogador de ser ele mesmo e de se assumir assim como é. Para isso tem que ter autonomia interior e forte diálogo com o seu eu profundo. Essa atitude libera as energias que o fazem um excelente e até um genial jogador. Há ainda uma chave secreta que ouvi de uma jovem e excepcional atriz de tv e de cinema, sensível ao mundo espiritual. Dizia: estudo meu papel e me preparo o mais que posso; mas quando entro em cena vou como quem vai representar para Deus e o faço por amor a Ele. Esqueço as expectitivas humanas Em troca ganho uma indescritível liberdade interior.Talvez os jogadores não tenham semelhante intimidade com Deus, embora sempre se persignam. Mas dedicam o melhor do que fazem aos representantes simbólicos de Deus que é a esposa, a mãe, o pai, os irmãos.
A Igreja antiga chamava a Deus de ludens, um grande jogador que criou o universo para a sua própria diversão e nos criou para participar dela. Uma das formas não seria o futebol?
- Leonardo Boff Teólogo
https://www.alainet.org/fr/node/115795
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