Por que o Jornal Estado de São Paulo reage de forma tão virulenta contra a 4ªSemana Social Brasileira da CNBB?
22/11/2006
- Opinión
Como sempre o jornal O Estado de São Paulo que, ao longo de sua história, defendeu e defende os interesses das classes abastadas do Brasil e do exterior, sejam elas financeira, agrária ou industrial, mais uma vez, faz-se defensor delas contra os interesses da Nação brasileira. Desta vez, porém, exagerou. Mas isto é comum para este órgão de imprensa quando os interesses das classes ricas estão ameaçados.
No editorial de 21 de novembro, “Mutirão pelo Retrocesso”, o Jornal volta a reafirmar suas teses ultra-conservadoras, fazendo passar os interesses das elites como se fossem os interesses do Brasil. Controlando o poder econômico e a grande mídia, estas elites exercem o mando sempre de costas para o povo brasileiro, espelhando-se nas metrópoles da Europa ou dos Estados Unidos. O linguajar do jornal revela uma atitude de intolerância e autoritarismo. Não tolera dissenções, nem opiniões contrárias às suas, agredindo com qualificativos depreciadores, em estilo tendencioso e não profissional.
O jornal afirma que a igreja perde seu tempo em reuniões como a Semana Social e é por isso que ela vai perdendo fiéis. Será que lutar pela justa partilha da renda, da riqueza, da terra, lutar por políticas públicas que garantam os direitos sociais e lutar contra a manipulação dos grandes meios de comunicação social é perder tempo? Por que o Estadão não questiona certas igrejas que não relacionam a fé com a realidade, que não fazem a ligação entre a fé e a política, e que evitam debater os problemas nacionais?
Ao se referir à 4ª Semana Social Brasileira da CNBB - Mutirão por um Novo Brasil - onde são discutidos temas como o Papel do Estado, a Soberania, Participação Popular, e a necessidade de um projeto democrático de Nação e de desenvolvimento, o jornal diz que seria melhor que o slogan fosse “Mutirão por um Brasil Velho” ou “Mutirão pelo Retrocesso”. O Estadão continua a desfilar sua indignação ao se referir à luta que as pastorais e movimentos sociais farão no próximo ano, questionando por meio do plebiscito popular o Leilão que em 1997 desnacionalizou a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
Por que o Estadão se revela defensor tão ardoroso da injusta, imoral e inescrupulosa privatização da CVRD? A quais interesses estaria ele servindo? Aos do povo brasileiro ou aos das classes privilegiadas? Não sabe por acaso o jornal que a avaliação da mesma foi feita por um dos seus compradores (a financeira Merryl Lynch), e que o preço pelo qual foi vendida foi de apenas 3,338 bilhões de reais, quando seu valor de mercado era superior a 40 bilhões? Ignorava que 10 anos antes do leilão só a província mineral de Carajás havia sido estimada em US$ 80 bilhões? Que a sua composição acionária passou, do momento do leilão até dezembro de 2005, de 51% para apenas 5,7% com o governo federal e de apenas 11% para 41% com acionistas estrangeiros? Não sabe que depois de privatizada a empresa teve lucro de mais de 10 bilhões num ano? O jornal diz que as privatizações devem ser feitas, pois garantem recursos para o governo poder investir em saúde, educação, moradia, etc. Por acaso o dinheiro da privatização da Vale serviu para esses fins? Ou os lucros da Vale privatizada têm sido aplicados em investimentos sociais? Ou para reduzir a dívida pública como prometera o então Presidente Cardoso? Ou irão apenas para os bolsos dos seus acionistas como é o Bradesco?
O Estadão se presta a divulgar o mito de que a dívida externa não é mais problema. Ele finge ignorar que a dívida pública externa continua pesando sobre o Orçamento público e retirando do Brasil mais de US$ 30 bilhões por ano, entre juros e amortizações; que os pagamentos antecipados da dívida externa ao FMI e ao Clube de Paris não reduziram a dívida, pois consistiram na troca de dívida velha por nova, mais cara, e também na troca de dívida externa por dívida interna, também mais cara. O jornal critica a CNBB por questionar o corte indiscriminado de gastos federais, sem mencionar que o Seminário de Encerramento da 4ª. Semana Social questionou justamente a prioridade para as dívidas públicas financeiras em prejuízo dos gastos sociais e dos investimentos públicos em infraestrutura e no crescimento da economia interna e do emprego. O Ministro Luiz Dulci, que debateu com os participantes do Seminário no sábado, 18.11.06, ouviu do plenário a questão relativa ao projeto de Lei Orçamentária para 2007, enviado pelo Governo Lula ao Congresso Nacional, que prevê gastos de R$ 229 bilhões com as dívidas externa e interna, o que representa 26 vezes o que será destinado ao Bolsa Família, 57 vezes os gastos previstos para a Reforma Agrária, cinco vezes o orçamento proposto para a Saúde, 11 vezes o destinado à Educação, sendo que os gastos sociais ainda estão sujeitos a contingenciamentos para se produzir o superávit primário. A demanda de auditoria das contas públicas relativas ao endividamento, que é justa para toda empresa, por que não seria justa para o Governo Federal, instituição que tem como missão primordial o serviço à Sociedade? Ainda mais quando é exigência constitucional (Art. 26 das Disposições Transitórias) e nunca foi cumprida!
Mas há um motivo maior que faz o jornal reagir desta forma e desqualificar as entidades que sempre se bateram pela ética e pela defesa do povo brasileiro.
O Estado de São Paulo sabe que o conjunto de pastorais e movimentos sociais articulados em torno da 4ªSSB e da Assembléia Popular tem uma força muito grande: mais de 150 mil ativistas tornaram os Plebiscitos da Dívida e da Alca uma realidade em todo o território nacional. O jornal sabe do amor ao povo e da capacidade mobilizadora destes militantes. Sabe que do ponto de vista ético e moral temos razão.
O mais importante, porém, é que o Estadão, bem como as elites que ele representa e defende, têm medo porque há uma decisão do Tribunal Regional Federal de Brasília que reconheceu a nulidade da avaliação do valor da venda da Vale do ponto de vista jurídico, o que possibilita a anulação do leilão. Temos respaldo legal, a lei está conosco na defesa do Brasil!
Só isto pode explicar a virulência com a qual o Estadão se insurge contra a 4ªSSB da CNBB. Se alguém é pelo retrocesso, é o próprio Estadão.
Tanto o jornal como as elites que se expressam por ele podem ter certeza de que o ano de 2007 será de muitas lutas. O Plebiscito Popular sobre a Vale será o cavalo de batalha da sociedade civil organizada. Ele toca diversos aspectos relacionados com a boa governança do Brasil: a soberania do país sobre seus bens naturais, as finanças públicas, o setor mineral, estratégico para o desenvolvimento endógeno, soberano e solidário do Brasil, as dívidas, o papel do BNDES, a ética, a responsabilidade fiscal e moral do governo FHC, o meio ambiente. Com certeza o tema “cola” e é atualíssimo, como ficou demonstrado nas eleições de outubro, quando a correção e a ética das privatizações esquentou os debates.
Ao Estadão fica a pergunta: o Brasil de profundas e históricas desigualdades, com metade da população vivendo na pobreza ou na indigência, um país que permite que madeireiras e agronegócio tenham queimado nos últimos 20 anos uma parte da Floresta Amazônica que corresponde aos territórios da Itália e da Bélgica somados, é esta a modernidade? A CNBB está sintonizada com os anseios e aspirações populares de justiça, igualdade e fraternidade. O jornal defende as velhas injustiças. Os temas de ação da 4ª. Semana Social Brasileira e da Assembléia Popular, ao contrário, apontam para um futuro mais humano, solidário e sustentável.
- Luiz Bassegio é Secretário Executivo do Grito dos Excluídos Continental e do Serviço Pastoral dos Migrantes da CNBB e membro da Coordenação da Assembléia Popular.
-. Marcos Arruda é economista e educador do PACS – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Rio de Janeiro) e sócio do Instituto Transnacional (Amsterdam). Assessorou o Seminário de Encerramento da 4ª. Semana Social Brasileira, Brasília, 17-19.11.06.
No editorial de 21 de novembro, “Mutirão pelo Retrocesso”, o Jornal volta a reafirmar suas teses ultra-conservadoras, fazendo passar os interesses das elites como se fossem os interesses do Brasil. Controlando o poder econômico e a grande mídia, estas elites exercem o mando sempre de costas para o povo brasileiro, espelhando-se nas metrópoles da Europa ou dos Estados Unidos. O linguajar do jornal revela uma atitude de intolerância e autoritarismo. Não tolera dissenções, nem opiniões contrárias às suas, agredindo com qualificativos depreciadores, em estilo tendencioso e não profissional.
O jornal afirma que a igreja perde seu tempo em reuniões como a Semana Social e é por isso que ela vai perdendo fiéis. Será que lutar pela justa partilha da renda, da riqueza, da terra, lutar por políticas públicas que garantam os direitos sociais e lutar contra a manipulação dos grandes meios de comunicação social é perder tempo? Por que o Estadão não questiona certas igrejas que não relacionam a fé com a realidade, que não fazem a ligação entre a fé e a política, e que evitam debater os problemas nacionais?
Ao se referir à 4ª Semana Social Brasileira da CNBB - Mutirão por um Novo Brasil - onde são discutidos temas como o Papel do Estado, a Soberania, Participação Popular, e a necessidade de um projeto democrático de Nação e de desenvolvimento, o jornal diz que seria melhor que o slogan fosse “Mutirão por um Brasil Velho” ou “Mutirão pelo Retrocesso”. O Estadão continua a desfilar sua indignação ao se referir à luta que as pastorais e movimentos sociais farão no próximo ano, questionando por meio do plebiscito popular o Leilão que em 1997 desnacionalizou a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
Por que o Estadão se revela defensor tão ardoroso da injusta, imoral e inescrupulosa privatização da CVRD? A quais interesses estaria ele servindo? Aos do povo brasileiro ou aos das classes privilegiadas? Não sabe por acaso o jornal que a avaliação da mesma foi feita por um dos seus compradores (a financeira Merryl Lynch), e que o preço pelo qual foi vendida foi de apenas 3,338 bilhões de reais, quando seu valor de mercado era superior a 40 bilhões? Ignorava que 10 anos antes do leilão só a província mineral de Carajás havia sido estimada em US$ 80 bilhões? Que a sua composição acionária passou, do momento do leilão até dezembro de 2005, de 51% para apenas 5,7% com o governo federal e de apenas 11% para 41% com acionistas estrangeiros? Não sabe que depois de privatizada a empresa teve lucro de mais de 10 bilhões num ano? O jornal diz que as privatizações devem ser feitas, pois garantem recursos para o governo poder investir em saúde, educação, moradia, etc. Por acaso o dinheiro da privatização da Vale serviu para esses fins? Ou os lucros da Vale privatizada têm sido aplicados em investimentos sociais? Ou para reduzir a dívida pública como prometera o então Presidente Cardoso? Ou irão apenas para os bolsos dos seus acionistas como é o Bradesco?
O Estadão se presta a divulgar o mito de que a dívida externa não é mais problema. Ele finge ignorar que a dívida pública externa continua pesando sobre o Orçamento público e retirando do Brasil mais de US$ 30 bilhões por ano, entre juros e amortizações; que os pagamentos antecipados da dívida externa ao FMI e ao Clube de Paris não reduziram a dívida, pois consistiram na troca de dívida velha por nova, mais cara, e também na troca de dívida externa por dívida interna, também mais cara. O jornal critica a CNBB por questionar o corte indiscriminado de gastos federais, sem mencionar que o Seminário de Encerramento da 4ª. Semana Social questionou justamente a prioridade para as dívidas públicas financeiras em prejuízo dos gastos sociais e dos investimentos públicos em infraestrutura e no crescimento da economia interna e do emprego. O Ministro Luiz Dulci, que debateu com os participantes do Seminário no sábado, 18.11.06, ouviu do plenário a questão relativa ao projeto de Lei Orçamentária para 2007, enviado pelo Governo Lula ao Congresso Nacional, que prevê gastos de R$ 229 bilhões com as dívidas externa e interna, o que representa 26 vezes o que será destinado ao Bolsa Família, 57 vezes os gastos previstos para a Reforma Agrária, cinco vezes o orçamento proposto para a Saúde, 11 vezes o destinado à Educação, sendo que os gastos sociais ainda estão sujeitos a contingenciamentos para se produzir o superávit primário. A demanda de auditoria das contas públicas relativas ao endividamento, que é justa para toda empresa, por que não seria justa para o Governo Federal, instituição que tem como missão primordial o serviço à Sociedade? Ainda mais quando é exigência constitucional (Art. 26 das Disposições Transitórias) e nunca foi cumprida!
Mas há um motivo maior que faz o jornal reagir desta forma e desqualificar as entidades que sempre se bateram pela ética e pela defesa do povo brasileiro.
O Estado de São Paulo sabe que o conjunto de pastorais e movimentos sociais articulados em torno da 4ªSSB e da Assembléia Popular tem uma força muito grande: mais de 150 mil ativistas tornaram os Plebiscitos da Dívida e da Alca uma realidade em todo o território nacional. O jornal sabe do amor ao povo e da capacidade mobilizadora destes militantes. Sabe que do ponto de vista ético e moral temos razão.
O mais importante, porém, é que o Estadão, bem como as elites que ele representa e defende, têm medo porque há uma decisão do Tribunal Regional Federal de Brasília que reconheceu a nulidade da avaliação do valor da venda da Vale do ponto de vista jurídico, o que possibilita a anulação do leilão. Temos respaldo legal, a lei está conosco na defesa do Brasil!
Só isto pode explicar a virulência com a qual o Estadão se insurge contra a 4ªSSB da CNBB. Se alguém é pelo retrocesso, é o próprio Estadão.
Tanto o jornal como as elites que se expressam por ele podem ter certeza de que o ano de 2007 será de muitas lutas. O Plebiscito Popular sobre a Vale será o cavalo de batalha da sociedade civil organizada. Ele toca diversos aspectos relacionados com a boa governança do Brasil: a soberania do país sobre seus bens naturais, as finanças públicas, o setor mineral, estratégico para o desenvolvimento endógeno, soberano e solidário do Brasil, as dívidas, o papel do BNDES, a ética, a responsabilidade fiscal e moral do governo FHC, o meio ambiente. Com certeza o tema “cola” e é atualíssimo, como ficou demonstrado nas eleições de outubro, quando a correção e a ética das privatizações esquentou os debates.
Ao Estadão fica a pergunta: o Brasil de profundas e históricas desigualdades, com metade da população vivendo na pobreza ou na indigência, um país que permite que madeireiras e agronegócio tenham queimado nos últimos 20 anos uma parte da Floresta Amazônica que corresponde aos territórios da Itália e da Bélgica somados, é esta a modernidade? A CNBB está sintonizada com os anseios e aspirações populares de justiça, igualdade e fraternidade. O jornal defende as velhas injustiças. Os temas de ação da 4ª. Semana Social Brasileira e da Assembléia Popular, ao contrário, apontam para um futuro mais humano, solidário e sustentável.
- Luiz Bassegio é Secretário Executivo do Grito dos Excluídos Continental e do Serviço Pastoral dos Migrantes da CNBB e membro da Coordenação da Assembléia Popular.
-. Marcos Arruda é economista e educador do PACS – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Rio de Janeiro) e sócio do Instituto Transnacional (Amsterdam). Assessorou o Seminário de Encerramento da 4ª. Semana Social Brasileira, Brasília, 17-19.11.06.
https://www.alainet.org/fr/node/118345?language=es
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