A vez do México
- Opinión
Brasil e México são as duas maiores economias latino-americanas, e também abrigam as duas maiores populações – o que significa os dois maiores mercados consumidores. Abrigam as duas maiores concentrações urbanas das nossas comarcas – São Paulo e a Cidade do México. Além disso, são os dois países latino-americanos com as culturas mais ricas e diversificadas.
O próprio espaço que ocupam no cenário geopolítico da América Latina encontra pontos em comum. O peso e a importância que o Brasil conquistou ao longo dos últimos vinte anos asseguraram certamente uma consolidada zona de influência. O peso e a importância que o México havia perdido desde 2003 não impediu que o país começasse a retomar, principalmente nos últimos três anos, sua própria e importante zona de influência. São, sem dúvida, duas lideranças regionais, com suas respectivas projeções no cenário global. O México e seus vínculos com a economia dos Estados Unidos e sua influência direta nos países centro-americanos, o Brasil e seus vínculos com os países integrantes tanto do Mercosul como da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) – cada qual em sua seara –, são interlocutores indispensáveis.
Resumindo: entre México e Brasil há muito mais pontos de convergência do que estamos acostumados a ver. E, no entanto, ao longo dos últimos muitos anos não houve nenhum movimento de aproximação real, que superasse a etapa das declarações de boas intenções e de interesses mútuos. Alguns acordos comerciais funcionam, principalmente no campo da indústria automobilística. Mas diante da imensa gama de oportunidades que poderiam ser exploradas e não foram, o que existe é pouco. Ou, pelo menos, está muito distante do que poderia e deveria ser.
Agora, nesse cenário e uma vez mais, surge uma nova janela para que México e Brasil finalmente entrem numa nova etapa em suas relações. Os primeiros sinais indicam que tanto o mandatário mexicano, Enrique Peña Nieto, como a presidenta Dilma Rousseff, estão decididos a ir bem além das declarações de boas intenções, e partir para alianças concretas.
Pouco depois de ter sido eleito presidente em julho de 2012, Peña Nieto incluiu o Brasil na lista de países que visitaria antes mesmo de tomar posse. Nas declarações que fez naquela ocasião, ele disse mais ou menos a mesma coisa que diz agora, quando se prepara para receber a primeira visita oficial de Dilma Rousseff ao seu país.
O que terá mudado nesse meio tempo, para que se olhe agora o cenário bilateral com um pouco de otimismo? Muita coisa.
É bem verdade que, em seus respectivos cenários internos, os dois mandatários enfrentam problemas graves. A questão da violência provocada pelo narcotráfico e as sucessivas políticas de segurança dos governos mexicanos se traduz em mais de 60 mil mortos ao longo dos últimos nove anos. Uma cifra digna de país em guerra civil. Com isso (além de outros problemas) a popularidade de Peña Nieto despencou, e o tema vem ocupando imenso espaço nas preocupações de seu governo.
Quanto a Dilma Rousseff, sabemos todos o cenário que ela enfrenta.
Há, entretanto, muitos outros aspectos que devem ser levados em conta. O México, por exemplo, promoveu profundas reformas internas, especialmente no campo da energia – leia-se petróleo –, que abrem novas perspectivas de parceria entre a Pemex e a Petrobras. Houve também mudanças, lá e cá, no cenário da indústria naval. Em outros segmentos industriais, como a aviação, o Brasil desfruta de posição privilegiada no mundo, e os mexicanos podem ter interesse em parcerias.
Estamos acostumados a considerar que não há espaço para ações conjuntas, uma vez que temos economias competitivas. É e não é verdade. Afinal, existe amplo espaço para ações complementares, e em vários setores industriais. Também é especialmente significativo o campo para investimentos cruzados, para produções conjuntas. O Brasil, afinal, é o segundo maior destino de investimentos diretos do México (perdemos para os Estados Unidos), e certamente existirão campos de interesse para investimentos brasileiros no país de Emiliano Zapata, Diego Rivero e Juan Rulfo.
A balança comercial entre os dois países tem consistência, mas pode ser fortemente ampliada. Entre 1993 e 2012, saltou de um bilhão e 500 milhões de dólares a sonoros nove bilhões e 200 milhões. Nesse período, o superávit total acumulado pelo Brasil foi de 26 bilhões e 500 milhões de dólares. Entre 2012 e 2014 o México obteve superávit, mas no cômputo geral a vantagem continuou sendo brasileira.
Acontece que as relações entre países – e principalmente com o peso político de México e Brasil – não deve ser vista apenas do ponto de vista do comércio. Quando isso ocorre, há integração entre empresas, e não entre nações, entre povos.
Existe também – ou deveria existir – um sem-fim de ramificações, que vão das artes e da cultura ao intercâmbio de experiências em temas como a reforma agrária ou o desenvolvimento industrial, da educação ao turismo, do avanço tecnológico à exploração de recursos naturais, chegando sempre ao porto principal, o da defesa de interesses comuns.
Há, sim, muitas diferenças entre Brasil e México, seus programas de governo, suas políticas econômicas. Mas há mais, muito mais pontos de convergência, e oxalá agora se retome uma aproximação que foi neutralizada quando Vicente Fox era presidente do México e optou por abrir os braços para o norte e dar as costas para o sul, enquanto o Brasil preferiu abraçar o continente e abrir os olhos para o mundo.
http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/A-vez-do-Mexico/4/33565
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