A liberdade sindical e o direito à greve
- Opinión
É fato que inovações tecnológicas e mudanças na gestão do trabalho provocaram alterações no mercado laboral tornando certas normas internacionais de trabalho obsoletas e ao mesmo tempo gerando demandas por novos direitos. No entanto, isso não justifica a pressão que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) vem sofrendo para rebaixar seu caráter de Organização Internacional (OI) para o de uma agência do sistema das Nações Unidas ou então o questionamento de que o direito de greve não faz parte da Convenção 87, relativa à liberdade de organização, apesar de a OIT adotar este conceito por mais de sessenta anos.
A OIT é uma das organizações do sistema ONU mais antigas e mais importantes. É também a única com administração tripartite – governos, empregadores e trabalhadores. Ela tem poder normativo e supervisório, bem como possui os mecanismos para cancelar normas obsoletas, para atualizar normas incompletas e para que os países membros denunciem as convenções que considerem inadequadas. Portanto, os instrumentos para aperfeiçoar o sistema normativo já existem.
Obviamente no atual debate não se trata disso e sim da tentativa de enfraquecer uma norma pétrea da OIT, que é a liberdade de organização e consequentemente as demais. O principal pressuposto dela, é que cada setor, trabalhadores e empregadores, se organiza como quiser e nenhuma das partes pode interferir na organização da outra, particularmente, o Estado. Portanto, é desnecessário que a norma autorize os sindicatos a fazerem reuniões, cobrarem mensalidades, publicarem boletins, entre outros. Se está implícito que a Convenção 87 garante aos trabalhadores o direito de tomar decisões coletivas e independentes, estas incluem o direito de fazer greve.
A Constituição do Brasil que aprovamos em 1988 para substituir a legislação do período da ditadura militar, reconhece o direito de greve. Durante meu governo procurei fortalecer a liberdade sindical ao ratificar a Convenção 151 e estender este direito aos trabalhadores do setor público; aprovamos a lei que deu personalidade jurídica às centrais sindicais brasileiras e meu governo negociou acordos coletivos formais com elas – como os critérios para reajuste do salário mínimo; criamos o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) com participação de trabalhadores, empregadores e outras organizações sociais; buscamos ao máximo valorizar a OIT e a agenda do trabalho decente; entre outras iniciativas.
Nas décadas de 1970 – 80 eu tive a honra de presidir o Sindicatos dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema. A partir de 1º de abril de 1980 entramos em greve por 41 dias reivindicando melhores condições de trabalho e salários. A reação dos empresários e governo foi extremamente repressiva, pois 1507 grevistas foram demitidos e 14 dirigentes sindicais, inclusive eu, fomos presos e sentenciados a vários anos de prisão por um tribunal militar. A repressão patronal e do governo militar gerou uma onda de solidariedade impressionante e, internacionalmente, esta violação dos nossos direitos humanos e sindicais gerou uma queixa ao Comitê de Liberdade Sindical da OIT, de composição tripartite, sob o número 958. O caso produziu uma resolução unânime em 1982 que diz: “em relação a Luis Inacio da Silva e outros dirigentes sindicais ... recordando novamente a importância dada ao direito de greve como um dos meios essenciais que devem estar disponíveis aos trabalhadores e suas organizações para promover e defender seus interesses ocupacionais” ... Esta posição clara da OIT sobre o nosso direito à greve foi um fator importante para que o governo reconsiderasse nossa condenação e a intervenção da Organização foi igualmente importante em situações semelhantes na Polônia e África do Sul.
Ninguém gosta de fazer greves, mas às vezes é a única forma de melhorar as condições de vida dos trabalhadores. Uma greve às vezes afeta os usuários de determinado serviço ou às vezes prejudica determinado setor econômico. Este é o lado que não gostamos. Às vezes também não gostamos dos resultados eleitorais e de determinadas medidas governamentais, mas nem por isso renunciamos ao nosso direito de votar. Portanto, ter liberdade de organização sem o direito de greve, é o mesmo que ter democracia sem poder votar.
Renda mais alta, distribuição mais justa dela e promoção de direitos sociais jamais seriam conquistados ao longo da história sem que os trabalhadores se organizassem em sindicatos e realizassem greves. Estas conquistas contribuíram para o desenvolvimento de nossos países e os sindicatos tornaram-se atores dele. Nós precisamos de sindicatos cada vez mais fortes para definitivamente erradicar a pobreza e promover o desenvolvimento. Colocar dificuldades para restringir a atuação sindical é um desserviço que não interessa a ninguém.
http://columnport.global-labour-university.org/2015/06/a-liberdade-sindical-e-o-direito-greve.html
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