Problema não é Eduardo Cunha. São os 267 votos que ele teve
03/02/2015
- Opinión
Olhando pelo retrovisor, a folgada eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para presidente da Câmara dos Deputados apenas se consumou no domingo (1º). Já era anunciada desde 5 de outubro de 2014, quando saiu o resultado das urnas com uma composição mais conservadora e mais fragmentada do Congresso Nacional.
Os partidos mais consistentes da base governista perderam cadeiras. O PT perdeu 19 e o PCdoB, cinco. Seriam votos suficientes para levar a disputa entre Cunha e Arlindo Chinaglia (PT-SP) ao segundo turno, ainda que a vitória final de Cunha fosse quase certa. O que cresceu foram as bancadas sem compromissos partidários, que votam e formam blocos de acordo com os interesses próprios de cada um, ou do setor econômico que representam.
O posicionamento às claras dos partidos, no sábado, ao formarem blocos, indicou a orientação do voto, em vez da costumeira traição às escondidas. Mesmo assim, Cunha teve mais votos do que o número de deputados de seu próprio bloco. Chinaglia e Júlio Delgado (PSB-MG) tiveram menos votos de partidos que declararam apoio a eles.
Apesar do voto ser secreto, dá para deduzir boa parte de quem votou em quem. Se analisarmos os 267 deputados que votaram em Cunha, não será surpresa constatar a intensa troca de filiação partidária em suas biografias, de acordo com conveniências regionais e disputas de poder. O próprio Cunha já passou pelo PRN, PP (ex-PPB) e, agora, PMDB.
Essa fragilidade do ideário dos partidos torna ineficaz a articulação política mais consistente, de forma institucional, de negociações legítimas entre as direções das legendas para compor o governo. A governabilidade passa a ser executada no varejo, com articulações para montar maiorias temporárias no Congresso a cada votação importante. Eduardo Cunha é especialista na articulação política de varejo, daí tantos deputados se sentirem confortáveis com sua liderança.
O fenômeno não é novo nem recente. Na Assembleia Constituinte de 1988 surgiu o “Centrão”, um grupo conservador pluripartidário que formava maiorias e exigia concessões para apoiar o governo Sarney nas votações legislativas. De lá para cá, sai governo, entra governo, esse grupo ou continua controlando o Congresso, ou é no mínimo o fiel da balança.
Na legislatura passada, Cunha articulou blocos com partidos da base governista para fazer como fazia o Centrão. Até o nome teve semelhança: Blocão. Ali ele já estava construindo sua candidatura para suceder seu correligionário Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) na presidência da Câmara. Torcia para o PMDB fazer a maior bancada nas eleições de 2014 para usar o argumento da regra de proporcionalidade. Não deu, pois o PT elegeu 3 deputados a mais. Mesmo assim lançou sua candidatura ainda em outubro recorrendo à estratégia de formar um grande bloco. Conseguiu fácil.
A candidatura de Chinaglia foi a primeira e última tentativa nesta legislatura de fazer uma política mais qualificada institucionalmente, com os partidos sendo mais consistentes, sem serem movidos pelo atendimento interesse imediato. Os 136 votos demonstram que daqui em diante a articulação política só funcionará no varejo, pelo menos até um novo Congresso se eleger – em 2018.
03/02/2015
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