Duas super potências
15/04/2003
- Opinión
A superpotência bélica americana não calculou que
esbarraria contra outra superpotência, muito mais forte,
a consciência ética e política de mais de 100 países e de
milhões de pessoas que em 600 praças clamaram (e seguem
clamando) pela paz. O mundo está convicto que a paz não
só é possível, mas é também o caminho da construção de
uma convivência mais feliz entre as nações. Este
discurso ético é feito também por diplomatas, políticos,
filósofos e pela consciência cristã, católica, luterana,
metodista, batista e pelo Conselho Mundial de Igrejas.
Entretanto, a arrogância americana além de fazer ouvidos
moucos ao clamor mundial, desprezou o Conselho de
Segurança da Nações Unidas considerando-o irrelevante.
Na política de Bush pesaram mais as armas que a moral,
mais a força que a razão. Esta visão estreita prejudicou
o mundo e criou na sociedade americana um clima de pavor
permanente dos ataques de inimigos supostamente alojados
intra-muros.
Atendo-nos ao confronto das superpotências militar e
moral, note-se que no brutal ataque de 11 de setembro de
2001 Bush recebeu o apoio unânime da consciência ética
mundial, capital moral agora destruído pelo próprio
governo americano e convertido em indignados protestos.
Quem mudou de lado não foi a consciência ética mundial
mas a Casa Branca que, desde o atentado às torres de Nova
York defende uma só tese: combater o terrorismo. Este
discurso pobre e negativo cristalizou-se na espantosa
doutrina Bush da guerra preventiva que pode colocar o
mundo em permanente estado de guerra, nação contra nação,
continente contra continente para dissuadir supostos
inimigos. Ora, a consciência ético política, hoje,
considera totalmente obsoleta a distinção entre guerra
justa e injusta. Nenhuma guerra é justa; mas o
"filósofo" da Casa Branca acaba de propor uma terceira
tese: a guerra preventiva permitindo-lhe atacar países
que , possivelmente, poderiam vir a ser um obstáculo aos
americanos.
Mais ainda, o senhor da guerra constituiu-se também em
árbitro do mundo definindo quais são as nações do bem e
quais as do mal. Portanto, temos aqui um explícito
fundamentalismo político conjugado com o fundamentalismo
religioso. Ao contrário de tudo isto, desde os filósofos
gregos sabemos que a força tecnológica deve ser
subordinada à superioridade dos princípios ético-
políticos. A coalizão anglo americana fez exatamente o
contrário. Esta atitude falsa foi tomada em nome da
liberdade, o bem mais precioso dos cidadãos. Com efeito,
no discurso em que anunciou o início da invasão do
Iraque, Bush disse que o principal objetivo da guerra era
"a liberdade do povo iraquiano". Mas o povo, pela sua
disposição à resistência do invasor, mostra que não
esperava " o libertador americano" e por isso rejeita-o
com veemência. Ademais, Bush afirma que, após a
"libertação", será instaurada a democracia no Iraque.
Mas que democracia é esta ditada militarmente por um
invasor todo poderoso? Ao mesmo tempo, a doutrina Bush
prega que a ação militar visa a eliminação do terrorismo.
Ora, é sabido que o terrorismo guerrilheiro não se
combate com o terrorismo tecnológico, sendo este último
pior que o primeiro. Já dizia um antigo adágio que se
pegam mais moscas com uma gota de mel do que com um
barril de fel.
De tudo isto podemos tirar duas conclusões: 1) a
superpotência armada cai nas contradições supracitadas
por que ela é cega aos grandes valores das pessoas e da
cultura mundial; 2) não é a ONU que perdeu a relevância
mas o governo americano que não só se fechou ao mundo mas
também o ameaça. Sucede porém, que o apogeu do poder
bélico coincide com o início do declínio como aconteceu
com todos os impérios armados da história do mundo. É
sempre mais fácil eliminar o adversário do que gastar
tempo para convence-lo com argumentos ou deixar-se
convencer por ele. Um é o caminho curto da truculência,
escolhido pela Casa Branca; outro é o caminho longo do
debate ético político e da diplomacia dos outros países.
Estas são as duas superpotências do início do terceiro
milênio: o império das armas contra o império da
consciência ética.
* Professor do Centro de Estudos Ética e Sociedade e do
Depto. de Filosofia. UERJ
Informativo
REDE de CRISTÃOS
ano 4 - 15 de abril de 2003
REDE de CRISTÃOS
ano 4 - 15 de abril de 2003
https://www.alainet.org/de/node/107348?language=es
Del mismo autor
- Duas super potências 15/04/2003
Clasificado en
Clasificado en:
Guerra y Paz
- Prabir Purkayastha 08/04/2022
- Prabir Purkayastha 08/04/2022
- Adolfo Pérez Esquivel 06/04/2022
- Adolfo Pérez Esquivel 05/04/2022
- Vijay Prashad 04/04/2022