COVID-19: necropolítica na Amazônia brasileira
Não devemos esquecer que o papel colonial das chamadas “democracias ricas” é sempre o mesmo: explorar recursos naturais, reservas florestais, minérios se utilizando de concessões governamentais regionais.
- Análisis
Desde o início de seu governo fascista na América do Sul, Jair Bolsonaro não mede esforços para tentar convencer a opinião pública acerca da ocupação da Amazônia brasileira pelo capital estrangeiro. O país atravessa uma gravíssima situação em plena Pandemia do Novo Coronavírus: elevado índice de mortes diárias, desemprego e inflação alta. Além disso, uma das variações do vírus – juntamente com as cepas do Reino Unido e África do Sul – surgidas no estado do Amazonas, colocou o Brasil como uma ameaça à saúde global, sendo inclusive, mencionado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em relação a seu despreparo em cuidar da situação.
Sobre a Amazônia brasileira, o avanço da Pandemia não parece incomodar nenhum pouco o (des)governo genocida de Bolsonaro. Em meio ao caos, seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, continua incentivando a expansão do agronegócio, desmatamento florestal e mineração ilegal em terras indígenas em estados como Roraima e Rondônia. O fato é que o impacto ambiental causado pela agenda ultraliberal imposta à ferro e fogo pelo governo bolsonarista coloca em cheque acordos governamentais de proteção ambiental, assim como a demarcação de terras indígenas, além de representar uma ameaça potencial à soberania nacional.
Alijado a isso, há o discurso negacionista sobre as medidas de contenção e isolamento e das políticas de saúde pública quanto à vacinação. Vale dizer também que 80% dos(as) brasileiras(os) não conhecem a região amazônica e, tampouco, sabem que uma parcela significativa das populações tradicionais estão sendo impactadas diretamente pela negação da Pandemia no contexto amazônica. Afinal, quanto tempo levaremos para imunizar a população de forma equitativa? Como povos indígenas, ribeirinhos, pescadores e quilombolas estarão devidamente resguardados em seus territórios?
O expansionismo ultraliberal neste contexto produz condições materiais para que estas populações sejam dizimadas. Se para Bolsonaro era fácil “convidar” Trump para “juntos explorar” a Amazônia, na conjuntura pandêmica tal diplomacia destrutiva é desnecessária, pois o Coronavírus será útil na demanda genocida de seu governo. Tornando-se um agente natural que auxiliará no extermínio destas populações, vale ressaltar que não cuidar da população é uma estratégia política, deliberada para este fim.
A figura fascista de Bolsonaro e seus cúmplices do alto escalão militar – aparelhados financeiramente ao Palácio do Planalto em Brasília – torna o Estado ausente e conivente com essa “doutrina de choque” (expressão utilizada pela escritora canadense Naomi Klein) econômica aplicada à população. Por outro lado, não devemos esquecer que o papel colonial das chamadas “democracias ricas” é sempre o mesmo: explorar recursos naturais, reservas florestais, minérios se utilizando de concessões governamentais regionais. Em meio à Pandemia, empresas estrangeiras continuam explorando diferentes áreas na Amazônia legal brasileira.
O que vivenciamos neste momento é um estado que assumiu uma posição deliberada pela ‘necropolítica’, ou seja, quem pode viver ou não. No caso brasileiro, a Pandemia acentuou essa disposição pela política de morte acentuada pelo caos instalado no país. Mas penso, evidentemente, que isso não é apenas um distúrbio de loucura coletiva, mas um fenômeno que envolve a própria reconfiguração econômica e política em curso no país. Por exemplo, o que levaria missionários religiosos no Norte do Brasil a incentivar que comunidades indígenas não tomem vacina? A redução demográfica sempre foi uma estratégia aos olhos do colonialismo europeu e norte-americano, sobretudo quando se trata de ocupar para explorar.
Se não houver uma mudança estrutural no cenário que está colocado, o resultado da Pandemia e solo brasileiro será o pior do mundo, abrindo precedentes para uma intervenção externa, derivando em uma apropriação colonialista que será impetrada, sobretudo, por grupos econômicos estrangeiros.
- Paulo Milhomens é historiador e sociólogo, Universidade Federal do Amapá
https://orcid.org/0000-0003-2171-4494
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