Cronologia aponta massacre de trabalhadores rurais sem terra em Quedas do Iguaçu
- Opinión
O ataque promovido pela Polícia Militar a trabalhadores rurais sem terra, no último dia 7, em Quedas do Iguaçu/PR, é contado em cronologia construída pela Terra de Direitos a partir da coleta de depoimentos das vítimas. Diferente da versão defendida pela Polícia Militar do Paraná, e sustentada pela cobertura dos jornais da região, o assassinato de dois trabalhadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) não se tratou de um “conflito”. As falas revelam que trabalhadores sem terra foram vítimas de massacre – uma emboscada, promovida pela Polícia Militar, que atirou para matar.
A cronologia dos fatos aponta para irregularidades na investigação da Polícia Militar e vai contra a versão apresentada pela polícia. Esse é o terceiro caso de assassinato de trabalhadores rurais sem terra com a participação da Polícia Militar do Paraná. Até o momento, mentores e executores dos crimes anteriores não foram punidos.
A cronologia pode ser acessada aqui e conferida em infográfico.
Resumo do caso
O massacre que tirou a vida de Vilmar Bordim, de 44 anos, casado e pai de três filhos, e de Leonir Orback, de 25 anos, que deixou dois filhos e a esposa grávida, ocorreu quando cerca de 40 integrantes do MST se dirigiam a uma região próxima ao acampamento Dom Tomas Balduíno. Os trabalhadores iam verificar uma possível abertura no bloqueio da estrada de terra que leva ao acampamento, em Quedas do Iguaçu. Três motos, uma camionete e um ônibus faziam o transporte das pessoas.
Os depoimentos revelam que um dos motoqueiros do comboio de trabalhadores, que estava à frente do grupo, foi abordado, de forma repentina, por aproximadamente dez Policiais Militares.
Ao ouvirem o barulho do ônibus com o restante dos trabalhadores, os policiais se embrenharam no mato, armados com pistolas e fuzis, para esperar e surpreender os integrantes do MST que vinham em direção a eles. Foi quando chegaram outros dois motoqueiros do movimento, que foram obrigados a descer dos veículos e deitarem no chão.
A caminhonete que seguia atrás, com mais trabalhadores, avistou o que estava acontecendo e parou a 60 metros da Polícia e dos motoqueiros. No momento em que os trabalhadores desciam do veículo, a PM começou a disparar em direção à caminhonete. Segundo a própria Polícia Militar, foram cerca de 130 tiros disparos de armas de fogo, entre rajadas de fuzil e tiros de pistola ponto 40.
Os trabalhares que estavam na parte de cima da caminhonete conseguiram descer e correram na direção oposta à dos tiros, avisando os demais companheiros que se tratava de uma emboscada.
As pessoas que estavam no interior da cabine tiveram mais dificuldade para fugir.Vilmar Bordim, que estava dirigindo a caminhonete, foi atingido fatalmente com um tiro nas costas logo ao sair do veículo. Leonir Orback, que estava sentado atrás do motorista, ao tentar fugir também recebeu um tiro pelas costas.
Henrique Gustavo Souza Pratti estava em cima da caminhonete e recebeu um tiro que o atingiu por trás, na perna, enquanto fugia, caindo no chão. “Eu caí, e aí vinha um pessoal correndo que conseguiu passar por trás do ônibus e ir embora, e o rapaz que estava correndo levou um tiro e caiu ali do lado, que foi um dos que morreram”, conta.
As pessoas que estavam no ônibus de trabalhadores que estava atrás da caminhonete também correram para o mato ao ouvirem os tiros – algumas pularam a janela para conseguir se salvar. Duas pessoas não conseguiram sair do ônibus e ficaram ali se escondendo dos disparos.
Assim que a PM chegou no local em que se encontravam as pessoas vítimas dos disparos, um grupo de policiais ficou na área e outro foi chamar reforços.
Os trabalhadores, proibidos de acessar o local do crime, foram impedidos de socorrer os atingidos. A polícia não socorreu as vítimas imediatamente. Até a chegada do socorro – apenas 1h20 depois – os policiais militares mexeram na cena do crime, tiraram o ônibus e a camionete do lugar, e retiraram os dois corpos, de Vilmar Bordin e Leonir Orback, das posições em que estavam.
Irregularidades na investigação
Henrique Gustavo Souza Pratti e Pedro Francelino, feridos durante a ação, foram autuados em flagrante por suposta tentativa de homicídio qualificado e porte ilegal de arma de fogo. A Polícia Militar, autora do massacre, diz que foram supostamente encontradas duas armas de fogo no local, e que estas estavam com Vilmar Bordin e Leonir Orback, mortos no local.
Com isso, não há indícios de que Henrique e Pedro estivessem portando qualquer arma de fogo. No período em que estiveram presos no hospital, as vítimas foram impedidas de acessar seus advogados em conversas reservadas, o que fere a lei.
Outra irregularidade do caso foi o depoimento de Pedro Francelino, coletado pela Delegada de Policia Civil, Ana Karine Turbay Palodetto sem a presença de seus advogados. O depoimento seu logo após Pedro ter sido submetido a uma cirurgia e uma transfusão de sangue, quando ainda estava sob efeito de sedativos e psicologicamente abalado com o ocorrido.
As irregularidades do caso foram denunciadas pela Terra de Direitos à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
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