FSM 2004:

Uma outra OMC é possível?

17/01/2004
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A Organização Mundial do Comércio foi o centro do debate no Hall 5 do Fórum Social Mundial. Sua atual influência, a composição de forças que a mantém e as relações da entidade com a injustiça social e a globalização da miséria para os países em desenvolvimento motivaram um rico painel com olhares e pontos de vista de várias partes do mundo. Participaram do painel, moderado pelo indiano S.P. Shukla, Walden Bello, da organização filipina Focus on the Global South; Vandana Shiva, da Índia; Paul Nicholson, da Via Campesina espanhola; Dot Keet, do Zimbábue; Rafael Freire Neto, da Central Única dos Trabalhadores do Brasil, e Anurhada Mittl, da norte-americana Food First. Bello, professor de ciência política e especialista nas questões da OMC, avalia que, após nove anos de sua criação, a organização não atingiu as metas que motivaram sua formulação. "Temos, então, uma situação de maior desigualdade e concentração de meios e recursos financeiros. Sua crise atual reflete uma crise maior do próprio processo de globalização. Cancún foi a brecha onde se pôde ver, nitidamente, a vitória da pressão da sociedade civil e dos países em desenvolvimento contra a expansão das áreas de atuação da OMC. Ainda que tomando-se em conta o papel de destaque do grupo dos 20 no bloqueio das negociações, o mais importante acontecimento que Cancún viu foi o surgimento da voz da sociedade civil global, o ator que poderá ser capaz de promover a constituição de uma nova ordem mundial". Para Bello, não se pode, neste momento-chave, baixar a guarda. É preciso mobilizar e reforçar as articulações com os governos dos países em desenvolvimento para que estes não façam mais concessões à OMC. Vandana Shiva, diretora da Research Foundation for Science, Technology and Ecology em Nova Délhi, denunciou as graves conseqüências dos acordos da OMC sobre os aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio para um país majoritariamente agrícola como a Índia. Com uma forte presença de multinacionais, a Índia, segundo Shiva, remete cerca de US$ 35 bilhões por ano de lucro para os países desenvolvidos. O custo disso é a miséria que impera nos campos e nas cidades indianas, como puderam conhecer os que à Índia vieram. Para Shiva, o processo de globalização que se passa em seu país é desastroso. Sem considerar a cultura e as tradições locais, o governo impulsiona o país para o global, o que pode ter resultados críticos na identidade indiana. Shiva condena também o abandono a que foram relegados os pequenos agricultores pelo governo indiano. Ela comenta que muitos pequenos fazendeiros na Índia se suicidaram diante da falta de perspectiva e de oportunidades. O representante da Via Campesina no painel ressaltou que o principal problema dos dias de hoje é que não estão sendo respeitados os direitos à terra, ao trabalho com a terra e ao alimento que dela provêm. "A fome e a miséria refletem a condução das negociações sobre a produção do campo e sobre a agricultura no seio da OMC. Os acordos vêm sufocando terrivelmente a agricultura familiar em benefício das grandes multinacionais e do agrobusiness". O brasileiro Rafael Freire Neto, representando a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Aliança Continental contra a ALCA, enfatizou que, para muitos dos movimentos sociais e ONGs, não é necessário debater sobre o estágio atual das negociações na OMC, mas é preciso, derrotá-la e criar uma alternativa com a perspectiva do comércio justo e solidário. Para ele, não só em relação à OMC é preciso ter atenção: os acordos bilaterais seriam tão ou mais nocivos para a economia dos países em desenvolvimento do que a OMC. Para Freire, a pressão, nesses casos, é insuportável. Em relação ao Grupo dos 20 (formado por países em desenvolvimento, incluindo o Brasil), destaque das negociações em Cancún, Freire acredita que é necessária uma revisão de sua agenda. É preciso avançar, e o caminho para isso, como estratégia da Aliança Social Continental contra a ALCA, é constituir campanhas e mobilizações amplas para bloquear a OMC, assim como combater a lógica do comércio livre. É fundamental construir consensos e buscar unificar as plataformas de ação de ONGs e movimentos sociais contra a OMC e as injustiças sociais que derivam dessa lógica. As condições estão dadas: em Davos, no Fórum Econômico Mundial, são destacados 6.500 policiais para proteger os participantes. Aqui, em Mumbai, em condições bastante distintas, não há esta necessidade. Para Freire os que defendem um mundo justo e solidário reafirmam aqui sua maioria. É preciso, começando agora, torná-la realidade. * Paulo Lima, Rits http://fsm2004.rits.org.br/conteudo.asp?conteudo_id=44
https://www.alainet.org/es/node/109153
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