EUA elegem presidente do BID e garantem interesses na AL
27/07/2005
- Opinión
Eleito para presidir o BID, o colombiano Luis Alberto Moreno é o idealizador do Plano Colômbia e tem acusações de envolvimento com corrupção no currículo. Para ONGs, ele pode se tornar o principal instrumento dos EUA para ressuscitar a Alca.
Com 15 dos 28 votos dos países americanos membros do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o colombiano nascido nos EUA Luis Alberto Moreno, atual embaixador de seu país em Washington, foi eleito o novo presidente do órgão. "Candidato dos Estados Unidos", Moreno venceu o brasileiro João Sayad, vice-presidente do BID e seu mais forte concorrente, com apoio de países como Uruguai, México, Belize, Costa Rica, Guatemala e Panamá, além de Colômbia e EUA.
Nascido na Filadélfia, Moreno adotou a cidadania colombiana de seus pais, mas se formou em administração e economia nos EUA, onde foi nomeado embaixador colombiano pelo ex-presidente Andrés Pestrana e mantido pelo atual mandatário, Álvaro Uribe. Um dos homens mais próximos a Pestrana, Moreno foi o responsável pela criação do Plano Colômbia - projeto de combate ao tráfico de drogas em território colombiano, capitaneada pelos EUA -, e é hoje um dos principais articuladores dos Tratados de Livre Comércio (TLCs) entre os dois países e entre os EUA e a região andina.
A proximidade e as afinidades do colombiano com o governo norte-americano e o mercado financeiro, além de seu atribulado histórico político-financeiro, têm suscitado expectativas bastante distintas. Entre os que aprovam o novo presidente do BID, por exemplo, está a presidente da Associação Bancária da Colômbia, Patricia Cárdenas, para quem "Moreno tem excelentes relações com todos os círculos de Washington. É um conhecedor do mundo financeiro, e está muito comprometido com o setor financeiro e com projetos de envergadura em infra-estrutura e desenvolvimento".
Os mesmos predicados, no entanto, são considerados um mau sinal por ONGs e movimentos sociais latino-americanos que discutem os rumos do desenvolvimento e da democracia na região. Segundo Carlos Tautz, assessor da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, fórum que há 10 anos monitora as atividades das agências internacionais de financiamento, Moreno será o principal instrumento dos americanos para ressuscitar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e consolidar condições favoráveis para a dominação econômica da região pelos EUA.
Ou seja, a liderança da mais importante instituição multilateral de financiamento das Américas nas mãos de um aliado dos EUA - que já garantiram sua hegemonia sobre o Banco Mundial, com a recente eleição do novo presidente, o ultra-conservador Paul Wolfowitz - deve, segundo a Rede Brasil, consolidar a tendência neoliberal do BID que, embora tenha sido criado para alavancar o desenvolvimento na região, "tem servido como instrumento para favorecer grupos de interesse com grande influência e políticas estratégicas de acionistas poderosos".
A mesma avaliação faz a ONG norte-americana Institute for Policy Studies (IPS). "Seguindo os passos do 'Consenso de Washington', a maior contribuição do BID à região tem sido assistir os governos latino-americanos na privatização de estatais rentáveis e na abertura dos serviços públicos a empresas transnacionais", afirma em documento de análise.
Qual desenvolvimento?
O debate sobre qual o modelo de desenvolvimento mais eficaz no combate às mazelas da pobreza, da exclusão social, das desigualdades econômicas e dos desastres ambientais também aqui está no centro das disputas conceituais entre organizações da sociedade civil e representantes dos setores financeiros e macroprodutivos.
Segundo Tautz, com Moreno o BID deve ser instrumentalizado ao máximo como ferramenta de ressuscitação da Alca, mais precisamente da Alca concebida pelos EUA, que deve voltar à mesa de negociações na Cúpula das Américas, em Mar Del Plata, Argentina, em novembro próximo. Para isso, explica o assessor da Rede Brasil, um dos caminhos deverá ser o investimento pesado nos projetos da Iniciativa de Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA), "a plataforma física da Alca".
Criada em 2000 pela cúpula de presidentes de América do Sul, a IIRSA é um grande projeto de integração física da região que prevê a construção de estradas, ferrovias, oleodutos, gasodutos, malha elétrica, portos fluviais e marítimos e zonas francas, entre outros. Essas estruturas devem facilitar não apenas o fluxo de produção e os acordos econômicos bi e multilaterais, como também a intensificação da exploração de recursos naturais e da mão-de-obra menos qualificada das regiões de fronteira.
"Toda a estrutura da IIRSA prevê grandes investimentos em grandes corporações, que, no fundo, estão mesmo interessadas nos enormes financiamentos do BID", diz Tautz. Numa relação de mão dupla entre megafinanciadores e financiados, no entanto, direitos sociais, culturais e ambientais de comunidades locais (seja na Amazônia, seja nos Andes), suas necessidades e o próprio conceito de sustentabilidade social e ambiental não apenas estão sendo desrespeitados, como também sistemática e planejadamente atacados.
Nesse sentido, uma das principais críticas da Rede Brasil ao BID é a falta de transparência nos seus processos decisórios e a exclusão da sociedade no debate sobre a adoção de regras de financiamento, tomada de decisão e eleição do corpo gestor do órgão. "Sugerimos que se aproveite o início de uma nova gestão para começar imediatamente um processo de consulta pública, com organizações da sociedade e não apenas dos governos dos países sócios do banco, para tornar obrigatório que todos os representantes dos países no banco sejam previamente aprovados pelos seus respectivos parlamentos", cobra a Rede em seu documento. O pedido de acompanhamento do processo eleitoral pelas ONGs foi negado pelo BID.
Sombras de um passado
No currículo do novo presidente do BID, além de uma vasta experiência frente à instituições financeiras privadas, há também alguns escândalos de corrupção. À frente do Banco del Pacífico do Equador entre 1998 e 99, Luis Alberto Moreno teria sido responsável por sua falência em função de uma série de ações irregulares. A falência, que atingiu as filias da Colômbia e de Miami, levou a perdas milionárias para os correntistas colombianos, mas, por interferência de Pastrana, Moreno não foi levado à Justiça na Colômbia (apesar de, no Equador, ainda estar correndo um processo criminal sobre o caso).
Moreno também é acusado de participar da grilagem de terras públicas, quando participou da venda de uma área destinada a habitações populares, um escândalo que ficou conhecido na Colômbia como Chambacú.
- Verena Glass. São Paulo - Carta Maior.
https://www.alainet.org/es/node/112554
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