Eleições 2006: Orientações

06/04/2006
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Apresentação

A CNBB deseja dar sua contribuição para que o povo brasileiro, em 2006, possa participar intensamente da campanha eleitoral e escolher bem os candidatos para os cargos executivos e legislativos, em seus diversos níveis.

Cabe aqui recordar alguns oportunos ensinamentos do papa Bento XVI na sua recente encíclica Deus caritas est (cf. nº 28). O principal dever da política é promover a justa ordem do Estado e da sociedade.

Evidentemente, nessa tarefa, a Igreja Católica reconhece a “autonomia das realidades temporais”, conforme afirmação do Concílio Vaticano II (cf. Gaudium et spes n° 36); não lhe cabe, enquanto instituição, substituir-se ao Estado e nem pretende ela tomar em suas mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível. Isto é dever de todos os cidadãos e organizações da sociedade.

Ao mesmo tempo, porém, a Igreja tem o dever de oferecer sua contribuição específica, através da formação ética e de critérios de discernimento coerentes, para que as exigências da justiça se tornem compreensíveis e politicamente realizáveis nas diversas circunstâncias históricas e sociais. A Igreja não pode ficar à margem da luta pela justiça.

Para isso, ela exorta os cristãos leigos a participarem, com coragem e discernimento, da atividade política “para gravar a lei divina na cidade terrestre”, conforme sua missão e competência própria, sem negligenciar os deveres temporais, pois “seria negligenciar os deveres para com o próximo e para com o próprio Deus” (cf. Gaudium et spes, n° 43; Decreto Apostolicam actuositatem n° 14).

O documento que agora tenho a satisfação de apresentar foi discutido pelo Conselho Episcopal Pastoral da CNBB e, novamente, pelo seu Conselho Permanente que, em sua reunião de 21 a 24 de março deste ano, lhe deu a aprovação final e dispôs que fosse publicado.

As presentes “orientações” também poderão inspirar a elaboração de textos mais breves e cartilhas apropriadas às diversas realidades locais do Brasil.

Trata-se de uma reflexão sobre os grandes desafios do contexto atual e sobre algumas das principais questões que deveriam estar presentes no debate político entre eleitores e candidatos. Também são apresentadas algumas orientações práticas para organizar a participação política do povo.

Com este documento, a CNBB deseja chamar a atenção sobre a dimensão ética da política, propondo também critérios fundamentais para o discernimento sobre todo o processo eleitoral e para a avaliação dos candidatos; o documento é uma contribuição para a formação da consciência cívica e ética dos cidadãos que votam e, em especial, daqueles que participam da vida política, “para que seu operar esteja sempre a serviço da promoção integral da pessoa e do bem comum” (cf. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, n° 571).

O texto não deixa de pedir novamente a todos os cidadãos a vigilância atenta e constante contra toda forma de corrupção eleitoral; mas também é marcado pela esperança de que a participação consciente e o interesse dos brasileiros nas questões do bem comum contribuirão para o crescimento e o amadurecimento da vida democrática do Brasil.

Brasília, 23 de março de 2006,

no 4° centenário da morte de S.Turíbio de Mongrovejo,

patrono dos bispos da América Latina.

Dom Odilo Pedro Scherer

Bispo Auxiliar de São Paulo

Secretário-Geral da CNBB


I. INTRODUÇÃO:

COMPROMETIDOS COMO IGREJA

No dia 1º de outubro de 2006, realizam-se as eleições para presidente da República, governadores dos Estados, representantes do povo nas Assembléias Legislativas Estaduais, no Distrito Federal, Câmara dos Deputados e Senado Federal.

Nós, bispos, da Igreja Católica, dirigimo-nos a todas as pessoas de boa vontade, conforme o apelo bíblico: “eu vi muito bem a miséria do meu povo... ouvi o seu clamor contra os seus opressores e conheço os seus sofrimentos”. (Ex. 3,7)

Ao longo das últimas décadas a CNBB tem se pronunciado sobre momentos eleitorais (cf. Orientações para as Eleições 2002, nº 67). O presente documento é um instrumento de trabalho, servindo posteriormente às nossas Províncias Eclesiásticas e Dioceses, na elaboração de subsídios com feições locais.

Como pastores, movidos por compaixão e desejo de servir, dirigimo-nos aos eleitores, incentivando a sua efetiva participação na escolha de seus representantes, apresentando-lhes alguns critérios de discernimento.

Dirigimo-nos também aos candidatos, apresentando-lhes propostas para a construção de políticas estruturantes, que assegurem o desenvolvimento da nação com inclusão e justiça social.

Estamos conscientes de que o voto-cidadão é uma das melhores formas para elaborar políticas públicas geradoras de vida e esperança, complementadas pela participação popular, atendendo aos interesses da coletividade.

Somente ampliando as formas participativas dos cidadãos e cidadãs, construiremos uma nação livre, democrática e autônoma, nos níveis estaduais e nacionais.

A democracia é um processo lento, construído continuamente pela participação das pessoas que se organizam e mobilizam a sociedade.

A experiência de participação popular na política é uma conquista e um patrimônio histórico do povo brasileiro, formado pelos movimentos sociais, sindicatos, pastorais sociais e partidos políticos.

Essa experiência não pode ser perdida pela ação nefasta de políticos que buscam o poder e vantagens pessoais a qualquer custo Esperamos que os movimentos sociais sejam os aliados dos cidadãos conscientes. Sejam viveiros permanentes de consciência política do cidadão, verdadeiras escolas de formação e ação política na construção de uma sociedade autenticamente democrática.

As grandes questões e problemas nacionais não se resolvem com a eleição de um homem ou uma mulher para ocupar determinados cargos. Estejamos atentos, desmitificando uma certa visão messiânica ou apocalíptica das eleições.

O mais importante e decisivo, hoje, é definir um novo modelo para o nosso país. Para que isso aconteça, não basta, inserir um voto numa urna. É necessário acompanhar os representantes eleitos, numa atitude de colaboração e de cobrança para que os compromissos de campanha sejam cumpridos.

Nesse sentido, urge ampliar a participação popular nos diferentes Conselhos de Políticas Públicas que possibilitam o exercício da cidadania e do controle social, como os conselhos de saúde, educação, criança e adolescente, idosos e muitos outros.


II. DESAFIOS DO CONTEXTO ATUAL

As eleições se constituem um momento privilegiado para considerarmos a situação do país e seus principais desafios. Todo candidato é chamado a assumir responsabilidade política para se comprometer e enfrentar tais desafios.

O Brasil, apesar de ser uma das 12 maiores economias do mundo, ocupa o 73º lugar no desenvolvimento humano, numa escala de 173 nações. Embora haja melhorias para alguns setores sociais e mesmo para os mais pobres, aumenta a concentração da produção de riqueza nas mãos de poucos. Até parece que “o mal deste povo não tem cura, e as suas feridas não saram” (Na 3, 19ª), admoesta o profeta Naum em sua mensagem bíblica.

Essa situação vem de longa data. Não é resultado das políticas públicas dos atuais dirigentes. A causa do aprofundamento dessa desigualdade está na adoção de políticas do sistema capitalista neoliberal.

Com a implantação da globalização financeira, o sistema insiste na absolutização do poder do capital, sem a presença do controle social.

O processo de privatização, em especial no final da década de ‘90, significou uma enorme transferência de patrimônio público para grupos de empresas ou de particulares. Não houve o devido cuidado para com a transparência nessas privatizações, nem o respeito para com o bem comum da nação.

Apesar de alguns avanços, a situação da maioria dos trabalhadores continua sendo precária e injusta. Os salários aviltados ameaçam seus direitos e sua dignidade. O trabalhador sente-se continuamente ameaçado pelo desemprego, pela flexibilização das leis trabalhistas e o crescimento da informalidade.

A violência e o crime organizado se espalham nas cidades e no campo. A fome e a exclusão social colocam um desafio histórico para o Estado Brasileiro, exigindo medidas estruturais que garantam a paz, a justiça e a ordem pública.

A reforma agrária e o desenvolvimento rural, acompanhados por políticas agrícolas e hídricas, bem como a reforma urbana, são inadiáveis e urgentes para reverter a dramática situação social do país.

Apesar de muitos projetos, promessas e mobilizações populares resta um longo caminho a percorrer.

O Brasil padece de problemas estruturais relacionados à dívida externa e interna. Nos últimos dois anos, o governo pagou aproximadamente 430 bilhões de reais para os serviços da dívida pública, enquanto que o conjunto dos gastos sociais foi de 178 bilhões de reais com segurança pública, saúde, educação, ciência e tecnologia, reforma agrária, transporte. O impasse da dívida requer que se proceda a uma auditoria pública em suas contas, aliás, já prevista na Constituição Federal (art. 26, do Ato de Disposições Constitucionais Transitórias: “No prazo de um ano a contar da promulgação da Constituição, o Congresso Nacional promoverá, através de Comissão mista, exame analítico e pericial dos atos e fatos geradores do endividamento externo brasileiro”).

O Brasil possui imensos recursos naturais com a diversidade dos biomas, rios, lagos, plantas, florestas. No entanto, é brutalmente explorado ou extorquido, na busca de maiores lucros, em detrimento do bem social de toda a população.

A mídia hoje é um grande instrumento de poder. Exerce uma força suficiente para mexer coma opinião pública e conduzir ao poder, pessoas ou partidos, aliados a determinados interesses. Um grande desafio é a ampliação do caráter democrático dos meios de comunicação, assegurando a todos os segmentos da sociedade civil organizada o acesso a esses meios, não apenas em época de eleições. O Brasil está desafiado a combater a corrupção política que se nutre da impunidade. Esta é acobertada pela conivência, que se torna cumplicidade, usando as estruturas do poder público em benefício de interesses privados. A responsabilização, a punição dos culpados, bem como a restituição dos bens subtraídos, deverão levar a uma ação maior: a reforma do Estado e do próprio sistema político.

Após tantos escândalos de corrupção e malversação do dinheiro público, muita gente está decepcionada, perdendo a confiança nos políticos e nas instituições democráticas. Os jovens, que já se mostravam indiferentes frente à política, agora se afastam mais ainda.

O sistema eleitoral brasileiro é falho e favorece o clientelismo e a corrupção. Privilegia alguns grupos político-partidários, não deixando espaços para uma efetiva participação dos cidadãos.

O resultado das eleições de 2002 despertou grandes expectativas de transformação social. Aos poucos, o projeto de poder se sobrepõe à busca de um projeto de nação socialmente mais justa.

Partilhamos os riscos que afetam o conjunto da América Latina. Recentes relatórios da ONU mostram que a pobreza aumenta em nosso sub-continente retardando o crescimento da região. Romper a excessiva dependência dos Estados Unidos continua a ser o grande desafio para fortalecer a autonomia e integração da região latino-americana.

O projeto da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) pretende perenizar e institucionalizar essa situação.

No plano internacional, intensificam-se os grandes desafios da humanidade, tais como a fome, o avanço de doenças endêmicas, os grandes abismos que separam ricos e pobres, a destruição do meio ambiente, a intolerância étnica e religiosa e as guerras.


III. SINAIS DE RESISTÊNCIA E ESPERANÇA

Neste momento eleitoral, renova-se a oportunidade de continuar avançando no combate à corrupção eleitoral. A pior posição seria do descrédito: “não adianta votar, todos são iguais, nada vai mudar”. A nossa história oferece bons exemplos de muitos lutadores pela conquista da democracia e de grande capacidade de superar crises.

Há sinais evidentes de que no mundo inteiro em especial na América Latina, a população está ansiosa por mudanças profundas nos sistemas político e econômico, objetivando assegurar vida e esperança plenas para todos.

Entre os meses de novembro de 2005 e abril de 2007, haverá eleições para a escolha de presidentes em doze países da região. Vários candidatos são apoiados por movimentos sociais e populares, com a esperança de transformações. Apesar das pressões externas, esse novo contexto político favorece um certo avanço na integração latino-americana.

Cresce em todos os níveis, do local ao mundial, a mobilização de setores da população contra as múltiplas formas de opressão do poder econômico. Em resposta às necessidades básicas e prioritárias da maioria da população, os cidadãos conscientes propõem modelos alternativos como a economia solidária e sustentável.

A multiplicação de fóruns sociais, como espaços de debates, de trocas de experiências e de busca de práticas alternativas, é indicativo do crescimento da consciência política da sociedade civil.

Merecem destaque as numerosas iniciativas em favor da paz entre os povos, religiões e etnias de um mesmo país, bem como o esforço para universalizar os direitos humanos, políticos, civis, econômicos, sociais, culturais e ambientais.

No Brasil merecem destaque especial, nos últimos anos, a maior participação dos cidadãos nos Conselhos de Políticas Públicas nos níveis municipais, estadual e federal.

É inegável a luta em favor da reforma agrária, as mobilizações para a revitalização e integração da bacia do Rio São Francisco e as Semanas Sociais.

Muitas iniciativas e lutas do povo encontraram um espaço de expressão na Assembléia Popular Nacional, ocorrida em outubro de 2005.

Todos estes são indicativos de que também as próximas eleições serão momento oportuno para continuar a luta por grandes mudanças nas áreas do emprego1, da saúde e da educação2, uma vez que ainda não conseguimos nos livrar dos fantasmas do trabalho infantil3 e do analfabetismo4.

A atual crise ética e política poderá se tornar ocasião de amadurecimento e aperfeiçoamento das instituições democráticas do país, levando-nos ao comprometimento com a verdade que nos liberta, construindo o Brasil mais justo, solidário e livre, onde “justiça e paz se abraçarão” (Sl 84).

A política é uma das mais altas expressões da caridade cristã (Paulo VI). É a busca do bem comum, consistindo no respeito pela pessoa, na exigência do bem-estar social e na existência de uma ordem justa, segura e duradoura (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 1095 a 1012).


IV. ÉTICA NA AÇÃO POLÍTICA E FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA

A Palavra de Deus nos relata que o Senhor chamou lideranças para libertar e governar o seu povo. Essas pessoas sentiam o peso desse chamado, mas encontravam em Deus a força para não recuar sobre seus compromissos. Moisés, sentindo-se impotente diante das forças da opressão, ouviu de Deus essas palavras: “Eu estarei contigo” (Ex. 3,12).

O sinal de estar no bom caminho era a adoração ao verdadeiro Deus e não aos ídolos. Não sabendo Moisés e Aarão o que falariam ao povo, Deus lhes assegurou: “Eu vos ensinarei o que deveis falar”.

Essas são duas atitudes exemplares para o político: buscar em Deus sua força e não se deixar seduzir por ídolos, tais como o dinheiro e o poder.

Outra decisão tomada por Moisés foi aceitar a colaboração de homens sábios e experimentados, que ajudassem o povo a se organizar (cf. Dt 1, 15). Na legislação dada pelo Senhor, os pobres, os órfãos e os estrangeiros tinham um lugar especial.

Jesus Cristo ensinou a seus discípulos que a atitude básica do cristão revestido de poder é a atitude de serviço, não de dominação e nem de busca do proveito pessoal. Ao perceber que os discípulos discutiam entre si sobre quem seria o maior no reino de Deus, Jesus lhes ensinou que maior é aquele que serve. “Os grandes governam oprimindo o povo. Entre vós não há de ser assim. Quem quiser fazer-se grande entre vós será vosso servidor” (cf. Mt 20, 26).

A Igreja, em diferentes momentos históricos, traduziu os ensinamentos do Evangelho na sua Doutrina Social, base segura de uma ação política honesta e competente. Entre esses princípios doutrinais existe uma hierarquia. O primeiro deles fundamenta os demais: a dignidade da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus e a busca do bem comum. Isso importa na criação de condições básicas para que todas as pessoas e comunidades possam levar uma vida digna e solidária, superando todas as formas selvagens de competição.

Há ainda o princípio da subsidiariedade, segundo o qual é preciso respeitar a autonomia relativa de cada nível de competência.

Ao político cabe conhecer e apoiar as iniciativas tomadas em nível de cada comunidade, região e setor, sem querer se apossar dessas iniciativas nem cooptar seus líderes.

O Papa Bento XVI, em sua primeira encíclica sobre o amor cristão, oferece orientações importantes para a ação política. Primeiro, a militância política é missão específica dos fiéis leigos, que não devem se furtar às suas obrigações nesse campo: “O dever imediato de trabalhar por uma ordem justa na sociedade é própria dos fiéis leigos. Estes, como cidadãos do Estado, são chamados a participar pessoalmente na vida pública, assumindo funções legislativas e administrativas que se destinam a promover orgânica e institucionalmente o bem comum” (Deus Caritas est, nº 29).

A Igreja, enquanto instituição, não assume opções partidárias, mas empenha-se na luta geral pela justiça, ajudando a purificar a razão e a formar a consciência das pessoas: “A Igreja não pode nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política nem deve pôr-se no lugar do Estado. Mas também não pode nem deve ficar à margem na luta política. Deve inserir-se nela pela via da argumentação racional e deve despertar as forças espirituais, sem as quais a justiça, que sempre requer renúncias também, não poderá firmar-se nem prosperar” (Deus Caritas est, nº 28).

Em eleições anteriores, a CNBB exortou os fiéis a se engajarem com responsabilidade na ação política, orientando-os a exercerem o seu voto com discernimento. No documento Eleições 2002: propostas para reflexão5, analisa os desafios da situação nacional e as grandes opções em jogo, propõe algumas prioridades, oferecendo diretrizes e orientações práticas para assim “contribuir para o exercício do voto consciente e responsável”.


V. AS GRANDES OPÇÕES DO PROJETO DE NAÇÃO

No horizonte das Eleições de 2006 desponta o desafio da construção de um projeto de nação, cujas opções e propostas possam ser discutidas pelos eleitores e candidatos.

1. DEMOCRATIZAR O ESTADO E AMPLIAR A PARTICIPAÇÃO POPULAR

A autoridade é sobretudo uma força moral e implica em responsabilidade para a realização do bem comum. Deve, pois, apelar à consciência dos cidadãos, respeitando sua autonomia e chamando-os a contribuir para a construção do bem comum (Cf. Octogesima Adveniens,46).

A Constituição de 1988 garantiu direitos e deveres universais aos cidadãos (Cf. Constituição Federal, arts. 5 a 17). Em nome de princípios absolutos da economia mundial, o sistema neoliberal tende a modificá-los. A participação vigilante do cidadão sobre as decisões políticas do Estado pode reverter tal tendência, assegurando e ampliando responsabilidade do Estado na consecução do bem comum.

Cabe ao Estado garantir a participação popular na gestão da coisa pública, podendo ser realizada através de várias ações: assegurando e ampliando os direitos sociais conquistados pelo povo nas áreas da educação, saúde, moradia, segurança, alimentação, respeito às diversidades culturais e étnicas; criando mecanismos permanentes de participação direta da população nas decisões políticas, de importância para a nação, tais como: consultas populares através de referendos e plebiscitos, conforme projeto de lei em tramitação no Congresso para a regulamentação do artigo 14 da Constituição Federal, constituindo comitês populares de acompanhamento e de fiscalização da execução orçamentária das várias obras e ações dos Órgãos do Estado.

2. REVER O MODELO ECONÔMICO E O PROCESSO DE MERCANTILIZAÇÃO DA VIDA

Em muitos países americanos, domina cada vez mais um sistema conhecido como neoliberalismo. Por vezes, este sistema transformou-se numa justificação ideológica de atitudes e modos de agir no campo social e político, provocando a marginalização dos mais fracos. (Ecclesia in America , n° 56)”.

A falta de oportunidades e a crescente desigualdade social acarretam a exclusão social. Esta se fundamenta nas decisões econômicas, em detrimento dos direitos e garantias universais dos cidadãos. Um dos focos principais nas próximas eleições, - se não o mais importante - é garantir propostas de políticas públicas que revertam a hegemonia aética* do econômico sobre as dívidas sociais [*aética = que prescinde dos valores éticos].

Cabe às instituições públicas do Estado, submetidas ao controle social permanente: regular o mercado e zelar pela qualidade de vida de todas as pessoas. A realização dos direitos da sua população está acima dos interesses do mercado financeiro nacional e internacional; priorizar a economia solidária e a geração de renda, através das iniciativas diretas da população e de incentivos públicos; promover uma auditoria das dívidas externa e interna, cumprindo o mandato constitucional (Cf. Disposições Constitucionais Transitórias, Art. 26).

3. AMPLIAR AS OPORTUNIDADES DE TRABALHO

Os problemas do emprego envolvem em causa a responsabilidade do Estado, ao qual compete o dever de promover políticas ativas do trabalho (Cf. Compêndio DSI, nº 29)”.

Sente-se a ausência do Estado como regulador e garantidor dos direitos universais dos cidadãos. As tendências são a flexibilização dos direitos do trabalhador e a presença de empresas de iniciativa privada, sem uma devida responsabilidade social. Questionamos a 16 relação entre a produção de riqueza nacional e a falta de condições que gerem trabalho.

O direito universal ao trabalho deve estar assegurado por políticas públicas, com a definição de novos planos econômicos para o país. Para efetivar a perspectiva de mudança real é necessário: buscar formas criativas de aumento substancial de oportunidades de emprego e salário justo, tanto no campo quanto na cidade; implementar uma política de emprego para a juventude, assegurando o direito ao estudo e capacitação profissional; valorizar a economia solidária;multiplicar oportunidades de trabalho e renda, aumentar a rede produtiva nos moldes de cooperativas solidárias.

4. FORTALECER EXIGÊNCIAS ÉTICAS EM DEFESA DA VIDA

Eu vos asseguro: o que fizestes a estes meus irmãos menores a mim o fizestes” (Mt 25, 42).

Na presente hora histórica, o Brasil é chamado a consolidar os valores da democracia. À luz da ética, em obediência à Constituição Federal (art. 1º, III), o Estado e os nossos parlamentares se empenhem para que todos os brasileiros tenhamos meios necessários assegurados para viver uma vida digna, desde a sua concepção até ao final de seus dias.

Os poderes constituídos eleitos - em todos os níveis – recusem quaisquer projetos que atentem contra a família ou contra a dignidade da vida humana, particularmente no que diz respeito à legalização do aborto e da eutanásia. Cabe aos sistemas e aos serviços de saúde pública garantir as devidas condições de saúde à mulher e à criança.

5. REFORÇAR A SOBERANIA DA NAÇÃO

O sujeito da autoridade política é o povo, considerado na sua totalidade como detentor da soberania (Centesimus Annus nº 46)”.

O potencial de riquezas naturais em nosso país é fabuloso. A identidade do povo brasileiro vincula-se ao patrimônio e ao seu manejo sustentável. Abertos e solidários com todas as nações, somos administradores da riqueza nacional. É essencial o controle social para evitar que as imensas possibilidades de vida e de sustentabilidade de outros povos sejam controladas por interesses financistas. Vemos a necessidade de: garantir a água como um bem público e patrimônio da humanidade, de destinação universal a todos os seres vivos; proteger a biodiversidade brasileira (flora e fauna) para o povo brasileiro solidário com os demais povos, respeitando e respaldando os saberes das populações tradicionais das várias regiões do país; assegurar o uso dos solos agricultáveis para o povo brasileiro, principalmente para os pequenos agricultores, comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, espalhados por todo o território nacional; garantir a legalização e a posse das terras dos povos indígenas e quilombolas.

6. DEMOCRATIZAR O ACESSO À TERRA E AO SOLO URBANO

Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para o uso de todos os homens e povos, de modo que os bens criados devem chegar eqüitativamente às mãos de todos, segundo a justiça, secundada pela caridade” (Gaudium et Spes, 69).

Defendemos o desenvolvimento sustentável e a agricultura familiar, atendendo ao clamor dos que têm vocação para viver e trabalhar na terra, assegurando-lhes as condições adequadas.

A agricultura intensiva em grandes latifúndios encontra-se nas mãos de poucos, que têm acesso à técnica aprimorada, beneficiando-se com a exclusividade dos lucros do agro-negócio, voltado a exportações.

Para garantir a permanência do homem e da família no campo com condições dignas, superando o desemprego, a exclusão, a fome e a miséria, a “terra de negócio” não deve ter a primazia sobre a “terra de trabalho”, evitando-se a concentração da terra e a produção de riquezas.

As grandes cidades não oferecem oportunidades, com espaço e moradia digna para todos. Pobres e miseráveis são excluídos, vivendo sem condições de vida subumana. O solo urbano deve submeter-se ao controle de leis claras e definidas, em função do bem comum, não de especulação permanente.

Para mudar tal situação propomos: a realização de uma verdadeira reforma agrária, acompanhada de uma adequada política agrícola e hídrica; a aprovação de um projeto de lei que inclua o tamanho do imóvel rural entre as justificativas de desapropriação; mediante diretrizes para planos de desenvolvimento urbano, possibilitar o direito e a garantia do espaço na cidade para a população urbanizada, destinando áreas adequadas à moradia, parques e áreas de esporte e lazer para uso de todas as pessoas.

7. PROTEGER O MEIO AMBIENTE E A AMAZÔNIA

A tutela do ambiente constitui um desafio para toda a humanidade. Trata-se do dever comum e universal e do respeito a um bem coletivo (Centesimus Annus, nº 40)”.

O meio ambiente alterado é reflexo das mudanças impostas pelo uso desordenado das riquezas da natureza. É preocupante a insensibilidade humana diante dos danos irreversíveis, causados ao meio ambiente.

A realização de projetos de desenvolvimento do meio ambiente requer consciência ética. O patrimônio comum e universal existente em nosso país importa em diferentes “caminhos culturais e de desenvolvimento econômico conforme as característicos das regiões com biomas e ecossistemas diferenciados”6. O bioma faz parte das diferentes regiões brasileiras, dando-lhes identidade social, econômica e cultural próprias.

Identificamo-nos como povos do cerrado, amazônicas, povos do semi-árido, da mata-atlântica, do pantanal dos pampas.

É urgente fiscalizar e coibir a exploração puramente comercial dos que exaurem o meio ambiente. O controle público da produção de riquezas deve preservar a natureza e garantir a sua sustentabilidade, particularmente em área tão especial como a Amazônia.

Nesse contexto é importante: valorizar e construir modelos de desenvolvimento econômico, cultural e social, levando em conta os ecossistemas diferenciados de cada região brasileira; promover um novo modelo de desenvolvimento a partir do conhecimento do potencial de pequenos projetos que levem em consideração as realidades locais e suas necessidades; desconfiar e inibir as políticas predatórias contidas em grandes projetos, que privilegiem o modelo de privatização de bens e territórios coletivos; defender um projeto de desenvolvimento da Amazônia para povos amazônicos, com a sua participação e em benefício de todo o país e do mundo; implementar políticas de relações produtivas, defendendo os povos e as riquezas daquela região, bem como implementar ações de combate à biopirataria e à apropriação indevida do conhecimento tradicional.


VI. CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DOS CANDIDATOS

É fundamental discernir o perfil ético e as verdadeiras motivações dos que se apresentam como candidatos. O primeiro critério para votar em um candidato é sua posição em relação à defesa da dignidade da pessoa humana e da vida, em todas as suas manifestações, desde a sua concepção até o seu fim natural com a morte. Há várias outras questões. Por que os candidatos aspiram ao poder? Por que querem se manter no poder? Qual a prática do poder como serviço ao bem comum?

O povo mobilizado necessita de informações suficientes para um bom discernimento. Será que os eleitores se lembram do nome do candidato em quem votaram na eleição anterior? Esta dificuldade se acentua nas eleições para as casas legislativas, quando o imenso número de candidatos dificulta um discernimento mais consistente por parte dos eleitores.

A corrupção eleitoral ainda é um problema enraizado na mentalidade do nosso povo. Muitos acham natural a troca do voto por algum favor do candidato. É preciso instalar uma nova consciência política iluminada pelo lema inicial dessa mobilização: “voto não tem preço, tem conseqüências”. Nesse sentido, eleitores e elegíveis, todos temos que mudar.

O exercício da cidadania comporta o controle social sobre o bem comum. Sem esta atitude por parte dos cidadãos, muitos políticos sentem-se confortavelmente instalados em seus interesses particulares. Muitos continuarão o expediente escuso da compra e venda de votos, apesar dos dispositivos da Lei nº 9.8407 , de 1999, que altera o Código Eleitoral, contra a corrupção eleitoral.

O compromisso com a constante superação da fraude eleitoral, começando com as nossas práticas políticas, é um bom critério para eleger candidatos que ocuparão cargos públicos.

Os critérios da escolha devem levar em consideração tanto a honestidade pessoal, quanto a sua trajetória, voltada aos interesses da coletividade.

Os bons parlamentares e gestores públicos primam pelos compromissos honrados, sempre em estreita ligação com as necessidades reais da população. A transparência na gestão nunca lhes permite o expediente promíscuo na gestão do bem público, como se fosse um bem particular.

É preciso prestar muita atenção nos candidatos despreparados, cujas plataformas camuflam interesses particulares. Isso acontece quando improvisam políticas de compensação. São incapazes de apresentar metas claras de governo, políticas consistentes, planejadas e definidas por etapas e orçamentos.

São candidatos oportunistas, sem compromissos com partidos ou que utilizam as suas siglas para ganhar eleições. Têm como prática a compra de votos, sem escrúpulos, reproduzindo o esquema da corrupção eleitoral. Prometem favores. Por isso se transformam em líderes políticos hábeis, com longa experiência na arte de enganar os eleitores. Acostumam mal o povo, fazendo dele refém, dependente de esmolas e promessas de benefícios imediatos.

É bom desconfiar de candidatos sustentados por campanhas financeiras vultosas que facilitam a compra de votos, pois eles podem tentar recuperar, de alguma forma, o investimento realizado, utilizando-se dos privilégios adquiridos no exercício da função pública.

É importante conhecer e divulgar informações a respeito de candidatos: Quem são eles, sua origem política, o que já realizaram em prol da população, qual é a sua história, quais são suas propostas, se estão vinculadas ao programa de um partido ou se estão atreladas apenas a grupos de interesses financeiros.

Igualmente importante é encontrar canais de participação, viabilizando o controle social entre os eleitores e os candidatos a serem escolhidos e eleitos, assegurando aos eleitores o controle social sobre os projetos de governo, além dos apresentados por candidatos.

Sinais indicadores de verdadeiras motivações dos candidatos: a honestidade e a competência demonstradas pelos serviços prestados com transparência administrativa e financeira. Tudo isso deve ser continuamente avaliado e reconhecido pela população.

As propostas de políticas públicas devem defender e promover a dignidade da vida e do convívio humano, salvaguardando sempre o bem comum em nível nacional e estadual. A inclusão social é o grande desafio para o Brasil, a ser conquistado coma participação de todos os cidadãos.


VII. ORIENTAÇÕES PARA A AÇÃO

O objetivo dos Bispos ao elaborar estas orientações pastorais é oferecer elementos que levem os cidadãos, eleitores e candidatos, a refletir, questionar e se posicionar, - à luz de princípios éticos e cristãos - frente aos inúmeros desafios da realidade brasileira. Ao mesmo tempo, pensar o futuro do Brasil a partir de elementos que possam estruturar um projeto justo e solidário de nação.

A metodologia Ver – Julgar – Agir - Rever, consagrada pela Igreja Católica no Brasil, será o instrumento norteador das ações neste momento eleitoral. Sugerimos algumas ações simples e eficazes sejam desenvolvidas pelos grupos católicos, interessados em trabalhar pela conquista do voto cidadão.

Preparando a ação do grupo:

reúna o seu grupo. Pode ser um grupo pastoral, de jovens, de moradores, de oração, de estudos ou comunitário. Leia este documento – ou procure uma versão adaptada às possibilidades de discernimento do grupo; discuta cada um dos títulos do documento e promova pequenos debates e questionamentos, buscando sempre associar os temas apontados a elementos da realidade – conhecidos e vivenciados – pelos participantes do grupo; elabore, junto com o grupo, uma síntese de cada um dos títulos do documento, procurando transformar em questionamentos (perguntas) cada um dos aspectos que julgar importante.

Conhecendo a sua realidade eleitoral (VER)

Agora que você já refletiu sobre as principais preocupações que estão em jogo neste momento eleitoral, é preciso saber o que a realidade de sua região aponta. Nesse sentido, é preciso que você: pesquise quais e quantos são os cargos eletivos e suas funções em sua região eleitoral: deputados estaduais (ou distritais, no caso do DF), deputados federais, senadores, governador e presidente da república; identifique quais são os partidos e as coligações que estão habilitados às candidaturas e quais são os candidatos em cada legenda; confeccione, junto com o grupo, um cartaz ou mural com os resultados de sua pesquisa. Deixe estas informações bem visíveis ao grupo. Divulgue em seus meios; busque informações junto aos candidatos ou junto aos comitês eleitorais. Assista aos programas de propaganda política. Escute os programas de rádio, as plataformas eleitorais dos candidatos; elabore, junto com o grupo, um resumo das plataformas eleitorais, idéias, projetos, promessas, intenções.

Analisando a sua realidade eleitoral (JULGAR)

Agora que você já estudou este documento pastoral e já conhece o que pensam os candidatos, promova o seguinte debate com seu grupo: quais são os partidos, coligações, legendas e candidatos que têm pensamentos mais sintonizados aos do grupo em relação aos temas discutidos anteriormente? quais são os partidos, coligações, legendas e candidatos que têm pensamentos mais distantes aos do grupo em relação aos temas discutidos anteriormente? elabore um documento que contenha as opiniões e os principais questionamentos do grupo e guarde-os para a próxima etapa.

Trabalhando para a conquista do voto cidadão (AGIR)

O momento é de definição ou confirmação de um voto consciente e cidadão:

promova debates com candidatos, a partir dos documentos lidos e produzidos pelo grupo. Quando o debate não for possível presencialmente, assista pela televisão ou escute pelo rádio os programas de propaganda eleitoral e discuta com o seu grupo; promova seminários sobre a realidade regional, identifique os principais problemas e necessidades e veja qual a disposição dos candidatos e quais são as suas propostas para implementar ações que atendam a estas necessidades; divulgue os resultados dos debates junto às paróquias, escolas, universidades, comunidades, questionando sempre as posturas e promessas dos candidatos frente aos princípios valorizados pelo grupo; estimule que momentos de encontro coletivo (aulas, reuniões de sindicatos e associações) contemplem o “momento cidadão” em que os temas do cenário eleitoral sejam motivo de conversa, reflexão e discussão. procure diferentes meios de comunicação: rádios, jornais comunitários, panfletos, mensagens faladas ou escritas de grupos ou celebrações, para estimular o voto cidadão; busque indícios de corrupção eleitoral: compra de votos, promessas de vantagens financeiras ou materiais, boca de urna, entre outros. Denuncie junto à comunidade e junto aos órgãos de fiscalização eleitoral.

Valorizando o voto cidadão (REVER)

O processo democrático é muito maior que o ato de votar. Passadas as eleições é que começa o mais profundo exercício da democracia: reúna seu grupo logo após a divulgação dos resultados do pleito; novamente elabore um cartaz ou mural com todos os candidatos eleitos e com suas plataformas políticas; constitua um grupo permanente de acompanhamento do “mandato cidadão”; agora seu grupo tem 4 anos para acompanhar, intervir, cobrar e mudar os destinos da nação.


ANEXOS

Funções dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

A organização político-administrativa do Brasil compreende as esferas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, todos autônomos. O Poder Executivo é exercido por representantes eleitos pelo povo, com filiação partidária (cf. Constituição Federal, art. 18 a 135).

O Poder Legislativo tem a competência de elaborar e aprovar leis que regulamentam e disciplinam a vida dos cidadãos. Aprova o orçamento. No entanto, através do orçamento são geradas e garantidas as condições para que as leis sejam executadas a contento. A Constituição de 1988 deu muitos poderes legislativos ao Presidente da República, como editar Medidas Provisórias (MP).

O Poder Legislativo deve controlar e fiscalizar os atos do Poder Executivo e o funcionamento das instituições prestadoras de serviços públicos, nas áreas constitutivas da vida da população, como a saúde, a educação, a capacitação para a geração de ocupação e renda.

O Poder Legislativo nos Municípios é exercito pelas Câmaras Municipais, compostas por vereadores. Na esfera estadual, pelas Assembléias Legislativas, por deputados estaduais.Na esfera federal, pelo Congresso, composto pelas duas Casas Legislativas, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados.

Ao Poder Judiciário compete aplicar a lei, garantir a realização dos direitos e a solução dos litígios entre pessoas físicas e jurídicas e entre estas e os órgãos públicos. Resolve, também, casos e demandas concretas da coletividade como um todo.

Cabe ao Congresso Nacional com a sanção do Presidente da República, dispor sobre todas as matérias de competência da União.

No Senado Federal, cada Estado é representado por três Senadores, com mandato de oito anos. A cada quatro anos, alterna-se a escolha de um ou de dois senadores nas eleições proporcionais, eleitos com os respectivos suplentes. Em 2006 haverá a escolha de um Senador por Estado, com dois suplentes.

Os Senadores, além de votar as leis nacionais, tem algumas competências exclusivas, como aprovar os Ministros do Tribunal de Contas da União, o Presidente do Banco Central, os presidentes de algumas outras instituições públicas, os procuradores gerais da República, magistrados e chefes de missões diplomáticas.

Compete-lhes a autorização das operações financeiras externas e as condições de crédito. Opinam diretamente sobre as propostas do Presidente e dos Ministros. Julgam e processam o Presidente da República, seu vice e dos Ministros de Estado nos crimes de responsabilidade.

Os Deputados Federais representam a população no Congresso Nacional. Têm mandato de quatro anos e podem ser reeleitos.

Responsabilizam-se pelas leis de interesse da coletividade. Fiscalizam o Governo Federal e as instituições públicas. Junto com o Senado, cabe aos Deputados Federais aprovar o plano plurianual, diretrizes orçamentárias, o orçamento anual, as operações de crédito, emissões de curso forçado além de outras matérias. Pedem prestação de contas ao Executivo. Apresentam proposituras, criam as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI’s) para investigar atos do governo nas diversas instâncias, planos e políticas públicas.

Os Deputados Estaduais representam os interesses da população nas Assembléias Legislativas. Legislam sobre a organização da vida do povo em questões de abrangência estadual, contanto que não importem em despesas para o Executivo. Aprovam as políticas públicas e o orçamento apresentado pelos Executivos. Fiscalizam as iniciativas dos Governos Estaduais. Criam CPI’s quando necessárias, pela transparência das questões de interesse público e bom funcionamento das instituições do Estado. Têm mandato de 4 anos, podendo sempre se reeleger (Cf. Constituição Federal, art.44 a 60).

O Poder Executivo é responsável pelo planejamento de obras e sua execução, administrando o orçamento público. No âmbito federal é exercido pelo Presidente da República com a sua equipe governamental de Ministros. Nos âmbitos Estaduais, pelos Governadores e Secretários. Nos âmbitos Municipais, pelos Prefeitos e seus secretários.

O Presidente da República é o chefe do Poder Executivo da União, responsável pela nomeação dos Ministros que o auxiliam no governo da Nação. Compete-lhes propor ao Congresso planos, diretrizes e políticas de integração, com as devidas prioridades, para assegurar um amplo desenvolvimento econômico e social. Prevê orçamentos e investimentos do tesouro nacional, promove relações intersetoriais, políticas e econômicas, em nível nacional e internacional. Seu mandato é de quatro anos, podendo ser reconduzido por mais um período.

A eleição do Presidente e Vice-Presidente da República se realiza no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao término do mandato. Se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, haverá segundo turno no último domingo de outubro, concorrendo os dois candidatos mais votados.

Os Governadores são administradores de cada Estado da União, responsáveis pela nomeação de Secretários estaduais e outros cargos públicos de confiança. Apresentam seus projetos às Assembléias Legislativas para aprovação, com as devidas prioridades orçamentárias, comas respectivas receitas e despesas nas áreas da saúde, educação, segurança, entre outras. Sancionam ou vetam leis aprovadas por Deputados Estaduais, emitem decretos e regulamentos, devendo prestar contas aos Tribunais de Contas dos Estados (TCEs), conforme as Constituições Estaduais e Federal (art. 71). Têm mandato de quatro anos, podendo ser reeleitos por mais um período seguido.

Os Prefeitos administram os municípios. Nomeiam secretários e pessoas para cargos de confiança. Apresentam projetos às Câmaras de Vereadores, as prioridades e planos plurianuais (PPA) com os orçamentos, conjuntamente com receitas e despesas nas áreas de saúde, educação, entre outras. Têm mandato de 4 anos, podendo ser reconduzidos por mais um período seguido. (Cf. Constituição Federal, art. 76 a 91)

O Poder Judiciário está estruturado em instâncias e em segmentos especializados: Justiça Comum, Justiça Federal, Justiça do Trabalho, Justiça Eleitoral e Justiça Militar, Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal.

No topo dessa pirâmide está o Supremo Tribunal Federal, composto por onze Ministros nomeados pelo Presidente de República, após aprovação do Senado Federal. O Supremo Tribunal tem, entre outras atribuições, a responsabilidade de dar a última palavra sobre a interpretação da Constituição. Compete-lhe, também, julgar as autoridades maiores da nação nas infrações comuns e os ministros de Estado e comandantes das Forças Armadas também nos crimes de responsabilidade.

Quando as questões a serem julgadas não envolvem normas ou princípios constitucionais, a última palavra é do Superior Tribunal de Justiça, composto por trinta e três Ministros, nomeados pelo Presidente da República a partir de listas elaboradas por aquele Tribunal que escolhe os candidatos entre magistrados, membros do Ministério Público e advogados. (Cf. Constituição Federal, art. 92 a 126).

A Emenda Constitucional nº 45, de 2004, instituiu o Conselho Nacional de Justiça, cujas principais competências são: zelar pela autonomia do Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, expedindo atos normativos e recomendações; definir o planejamento estratégico, os planos de metas e os programas de avaliação institucional do Poder Judiciário; receber reclamações contra membros ou órgãos do Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados; julgar processos disciplinares, assegurada ampla defesa, podendo determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas; elaborar e publicar semestralmente relatório estatístico sobre movimentação processual e outros indicadores pertinentes à atividade jurisdicional em todo o país.

O Ministério Público, depois da Constituição de 1988, tem a responsabilidade de fiscalizar a aplicação da lei, da justiça e da democracia nas mais diversas esferas. Assim como o Poder Judiciário, também se divide de acordo com instâncias e especificidades (estadual, federal, eleitoral, trabalhista, militar). É ainda o responsável por fiscalizar e garantir a eficácia dos direitos difusos e coletivos, ou seja, que pertencem a todos, como é o caso do direito ambiental ou a proteção ao patrimônio público. Assim é sua tarefa propor as chamados ações civis públicas, perante o poder judiciário, para proteger tais situações.

O chefe do Ministério Público é o Procurador Geral da República, indicado pelo Presidente da República entre seus membros e posteriormente aprovado pela maioria do Senado Federal. Ele tem o poder de propor ações de improbidade contra o Presidente da República, Ministros de Estado, membros do Congresso Nacional, Governadores e questionar inconstitucionalidades de leis no Supremo Tribunal Federal (cf. Constituição Federal, art. 127 a 130).

2. Como formar Comitês da Lei nº 9840/99

As pessoas interessadas em acompanhar e fiscalizar o processo eleitoral devem-se organizar em Comitês de acordo com a Lei 9840/99, convidando para uma reunião, onde estudem o roteiro para aplicação da Lei contra a corrupção eleitoral.

É importante convidar organizações da sociedade civil como OAB, sindicatos, igrejas e associações, para que o comitê tenha pluralidade e credibilidade. Formado o Comitê, é necessário que se faça um lançamento com a presença da mídia e que se visitem todos os órgãos do poder judiciário, pedindo apoio e oferecendo colaboração.

Os Comitês Locais (municipais, de bairro, de escolas, de empresas etc.) devem estar aptos a receber comunicações – relacionadas a fatos que possam constituir prática de “compra de votos” ou de uso eleitoral da máquina administrativa – originárias de qualquer cidadão.

Para que o Comitê Local inicie suas atividades, basta a sua criação, com a divulgação para toda comunidade do início de seus trabalhos. Se possível, o Comitê 9840 deverá dispor de um telefone.

São atribuições do Comitê Local:

a) estimular o comunicante a identificar-se sem obrigá-lo a isso; b) pedir ao comunicante que esclareça em detalhes as informações prestadas, apontando datas, endereços e tudo mais que possa ser útil; c) descobrir junto ao comunicante os meios de prova disponíveis (ver item abaixo sobre meios de prova), lembrando sempre que a sorte da representação eleitoral dependerá das provas colhidas; d) esclarecer aqueles que prestem informações muito vagas ou imprecisas sobre a importância de obter mais dados e de repassá-los ao Comitê através de novo contato.

Para registrar as comunicações, utilizar o formulário.

Encaminhamento das comunicações recebidas: o Comitê Local deve encaminhar os formulários de denúncia, em anexo, juntamente com as provas coletadas, diretamente ao Promotor Eleitoral da localidade, mediante protocolo, enviando cópias imediatamente ao Comitê Estadual ou, se este não existir, ao Comitê Nacional (CBJP SES Quadra 801- conj. B – CEP 70401-900 Brasília – DF telefone:

(61) 3323-8713 e-mail: cbjp@cbjp.org.br).

Tão importante quanto a descoberta do ato de “compra de votos” ou de uso eleitoral da máquina administrativa é a obtenção de provas da sua ocorrência. Sem provas, qualquer representação eleitoral estará fadada ao arquivamento. As provas mais comuns são as de natureza testemunhal ou documental.

Quando a prova for somente testemunhal, deve-se verificar se as testemunhas são de fato idôneas e possuem real conhecimento dos fatos. Mas, atenção: deve-se evitar ao máximo a apresentação de prova exclusivamente testemunhal. Se existirem documentos, tais como fotos, panfletos ou quaisquer escritos ou impressos relacionados aos fatos, é indispensável que eles sejam anexados ao formulário. Os Comitês devem prover meios para a obtenção de câmaras fotográficas ou de vídeo, gravadores e tudo mais que possa ser útil na obtenção de provas de corrupção eleitoral.

Caracterização da “compra de votos” e uso eleitoral da máquina administrativa: para saber o que caracteriza a “compra de votos” e o uso eleitoral da máquina administrativa, é preciso ler os manuais e cartilhas produzidos pela Comissão Brasileira Justiça e Paz, que podem ser obtidos através da página www.lei9840.com.br ou do correio eletrônico cbjp@cbjp.org.br ou por telefone (61 3323 8713).

Comunicação da criação: o Comitê Nacional possui um cadastro dos comitês estaduais e locais. A comunicação da criação do Comitê pode ser feita por telefone (61 3323 8713)ou por e-mail cbjp@cbjp.org.br. Se necessário, a ligação pode ser feita a cobrar.

Em caso de dúvidas ou quando forem necessários maiores esclarecimentos sobre denúncias de desrespeito à Lei nº 9840, devem ser procurados os Comitês Estaduais. Até que sejam criados, pode ser procurado o Comitê Nacional, o que pode ser feito através da página, do telefone ou do e-mail acima.

NOTAS

1 Dos adolescentes e jovens brasileiros, 47% se encontram em situação de total despreparo para conseguir um serviço honesto, de qualidade. O quadro é mais cruel nos grandes conglomerados urbanos. Na região metropolitana de Recife, chega a 17,6%, em Salvador, 19,8%e São Paulo, 14,6%. Considere-se que esse percentual cresce ainda mais entre os jovens de18 a 24 anos.Teoricamente deveriam ter concluído o ensino médio profissionalizante para o ingresso no mercado de trabalho. A taxa de desocupação entre os jovens com esta faixa etária chega a 18,00%no país. Na Zona Metropolitana de Recife chega a 29,9%e na de Salvador a 33,7%.

2Melhoramos indicadores quantitativos de criança na escola.Os indicadores de qualidade continuam precários. A repetência é alta e a evasão assustadora. De 100 crianças e adolescentes que se matriculam no ensino fundamental e chegam ao ensino médio, 50 não concluem a 8ª série.Mesmo com a matrícula garantida com os programas escolas para todos, a maioria das crianças ‘vão pra frente’ sem saber ler, escrever ou fazer as quatro operações aritméticas.O Brasil não investe nos professores, nem na formação pedagógica moderna de ensino e aprendizado.

3O trabalho infantil é outro sinal da desigualdade. Não nos referimos às atividades caseiras que as crianças exercem no lar, como um aprendizado para a co-responsabilidade e solidariedade. Existe um trabalho que afeta o reto desenvolvimento de crianças e adolescentes.No Brasil, 5,1milhões de crianças e menores, entre 5 e 17 anos, trabalham. Se considerarmos entre 5 e 13 anos, 1,3 milhão de crianças trabalham. Pior: 38%das crianças que trabalham não recebem remuneração, e dentre as crianças, com10 a 15 anos, 53,2%não são remuneradas.Geralmente estas crianças reforçam a mão de obra de seus pais. Para aumentar sua produtividade eles levam consigo um filho que lhe ajuda no trabalho destinado para um adulto. Daí o índice de repetência e abandono da vida escolar das crianças pobres.

4 Segundo os dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE*) é doloroso constatar a triste realidade das pessoas adultas em nossa nação: 30,3%da população tem no máximo 3 anos de vida escolar, sendo considerados analfabetos funcionais.No Nordeste este índice atinge 47,5%da população adulta. Isto significa um contingente vivendo à margem do processo produtivo, que dificilmente será integrado ao mercado de trabalho, cada vez mais exigente do ponto de vista educacional. O analfabetismo de pessoas com mais de 15 anos atinge 11,6%da população. Evidenciam-se graves desigualdades regionais, que também se manifestam em outras esferas dos indicadores sociais.No Nordeste este índice atinge 23,2%, enquanto no Sul do país 6,4%. Isto mostra a necessidade de pensar a política nacional a partir das especificidades regionais, visando superar as dívidas históricas no interior da nação. É o Nordeste a região que traz com mais acentuação as marcas da escravidão e suas conseqüências. No Brasil, como citamos acima, os analfabetos funcionais são 30,3%da população adulta, mas entre os brancos são 18,4%e entre os negros 32,1%.

5 A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) publicou em setembro de 2001, “Eleições 2002, propostas para reflexão” [nº 67 da Coleção dos Documentos], formando um complemento ao presente.

À luz dos valores evangélicos, há um conjunto de documentos de orientação dos cristãos e pessoas de boa vontade. A recente Encíclica “Deus é Amor” de Bento XVI, aonº 28 diz: “A justa ordem da sociedade e do Estado é dever central da política (...) A justiça é o objetivo e, conseqüentemente, a medida intrínseca de toda a política. (...) é mais do que uma simples técnica para a definição dos orçamentos públicos (...) esta é de ordem ética (...) Política e fé se tocam. Sem dúvida, a fé tema sua natureza específica de encontro como Deus vivo, que abre horizontes muito além do âmbito da própria razão... A Igreja não pode e nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível. Não pode e nem deve se colocar no lugar do Estado.Mas também não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça”.

6 Cf. O Brasil que Queremos – Assembléia Popular – Mutirão por um Novo Brasil, Ed. Expressão Popular, 2005, pág. 55.

7Cf.www.cbjp.org.br.

8 Pastoral da Juventude e Movimento de Educação de Base elaborarão versões simplificadas deste documento.

1ª edição - abril de 2006

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

SE/Sul Quadra 801 - Cj. B - CEP 70401-900

Cx. Postal 02067 - CEP: 70259-970

Fone: (61) 2103-8300/2103-8200 - Fax: (61) 2103-8303

E-mail: edicoescnbb@cnbb.org.br - Site: www.cnbb.org.br

Capa: Rony Ribeiro

Arte Final - Sara Nunes Silva Brito

Impressão - Scala Gráfica

Coleção Orientações da CNBB

1. Eleições 2006.

https://www.alainet.org/es/node/114841
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