Eleições 2006: imprensa x cidadania
14/11/2006
- Opinión
A população agiu de forma responsável: não deixou de comprar jornais, revistas, nem de vê TV e nem de acessar a internet. Mas transferiu 2 milhões e meio de votos dum candidato ao outro no segundo turno. A imprensa, na qual milito, vai continuar livre e, se não tentar interferir na vontade do eleitor, vai recobrar a credibilidade perdida!
E-mail enviado à coluna Gilberto Dimenstein (Folha de S. Paulo, 31.10.2006)
Como em todo processo eleitoral, este ano tivemos vitoriosos e derrotados. Partidos e candidatos à parte, os que não têm projetos políticos, os que os têm e os que os têm e não os cumprem, experimentaram apenas parte desses sabores. O grande vitorioso foi o eleitorado brasileiro e quem mais acusou a derrota, a imprensa. O povo deixou perceber que, mesmo quando parece tolo, tem uma sabedoria acumulada durante séculos. Os donos dos grandes veículos de imprensa, impuseram sua força editorial, pressionaram jornalistas, constrangeram colunistas e demitiram. E voltaram ao elementar erro dos espertos: achar que todos são tolos!
O primeiro equívoco, grave pela reincidência, é julgar que o povo não tem cultura, nunca aprendeu nada ao longo da história e nem tem clareza para decidir. Esses pressupostos revelam uma arrogância que desrespeita o leitor, o ouvinte, o telespectador e o internauta, numa palavra: a inteligência política do cidadão. Ele admite as denúncias, desconfia das explicações oficiais e duvida da veracidade das razões, mas também duvida dos ataques contínuos, programados e oriundos das mesmas matrizes. Aprendeu a perceber a falta de convicção de jornalistas, especialmente os que atuam nas seis maiores empresas, a entender a pressão que alguns sofrem, e até mesmo, a decodificar sinais de falta de autenticidade. Isso explica a expressão “os colunistas foram inibidos”, de Luís Nassif.
Apesar de muito conhecido, o segundo equívoco foi o vício do poder. Não o poder formal, decidido nas urnas, sacramentado na posse e efetivado no mandato. Mas o poder invisível e de efeitos imediatos, como a pressão que intervém, o tráfico de influências e o apoio em troca de numerário, disfarçado na relação notícia-publicidade. O valor da opinião, somatizado numa relação de amor e ódio, tem pontos altos e baixos, com mimos aos “amigos”, com barganhas privadas de efeitos públicos, ou punidas com ameaças e processos.
A gravidade desse vício vem da ilegitimidade da sua ação. A imprensa não é partido político, nem tem a tarefa de controlar a informação, pela imposição de sua versão ou pela desqualificação das demais. E porque editores e proprietários de meios de comunicação julgam não precisar tratar seu público com respeito e fidelidade. O jornalista que não tem faro para fatos inéditos, de importância fundamental e com abrangência social, a que chamamos notícia, precisa ao menos manter seu olhar no público. Quanto mais fiel for a ele, tanto mais terá sua fidelidade. Perdê-la é possível e recuperá-la é o risco de navegar no imponderável.
O terceiro, mostra o golpe dentro do golpe. Em nome da vaidade, não se contentaram em lutar pela vitória de seus candidatos, partidos, idéias e interesses. Tornou-se necessário ganhar os louros pela vitória. Após a interpretação do segundo turno como conquista sua, sofreram o baque com seus resultados. Além da derrota, não puderam empunhar a bandeira da conquista na barganha por mais influência nas relações de poder. Apesar de sem empenho.
As últimas capas das revistas semanais e o setor de economia dos jornais mostraram que ela ainda não admitiu a derrota. A pressão na área econômica é um contra-canto, tendente a tornar-se solo. No jogo pesado e caro da imprensa, a vitória não foi de um candidato ou partido, mas de uma sociedade que parece ter se cansado de patrulhamento, ameaças e macarthismo. A unanimidade do denuncismo com fins eleitorais era tão evidente que lembrou as críticas às maiores agências de notícias que, ao aprimorarem a arte de inovar ao noticiar, levaram o leitor a perguntar se se tratava do mesmo fato.
A sociedade entendeu que jornalista bom é o que tem nariz (faro), não se envolve em guerra santa e, diferentemente do patrimônio do jornal, sua opinião não tem valor de mercado e nem pode ser comprada. E o leitor pode ser condescendente, mas não é tolo! Se o cidadão reúne informações, se consegue resistir a uma mensagem que se repete e cria acesso a outras fontes e chega a conclusões, vai ser difícil controlar-lhe a decisão. Que fazer? Aplaudir a autonomia que faz a sociedade avançar ou trabalhar para que seja tutelada mais uma vez?
- Antonio Carlos Ribeiro é Teólogo e jornalista
E-mail enviado à coluna Gilberto Dimenstein (Folha de S. Paulo, 31.10.2006)
Como em todo processo eleitoral, este ano tivemos vitoriosos e derrotados. Partidos e candidatos à parte, os que não têm projetos políticos, os que os têm e os que os têm e não os cumprem, experimentaram apenas parte desses sabores. O grande vitorioso foi o eleitorado brasileiro e quem mais acusou a derrota, a imprensa. O povo deixou perceber que, mesmo quando parece tolo, tem uma sabedoria acumulada durante séculos. Os donos dos grandes veículos de imprensa, impuseram sua força editorial, pressionaram jornalistas, constrangeram colunistas e demitiram. E voltaram ao elementar erro dos espertos: achar que todos são tolos!
O primeiro equívoco, grave pela reincidência, é julgar que o povo não tem cultura, nunca aprendeu nada ao longo da história e nem tem clareza para decidir. Esses pressupostos revelam uma arrogância que desrespeita o leitor, o ouvinte, o telespectador e o internauta, numa palavra: a inteligência política do cidadão. Ele admite as denúncias, desconfia das explicações oficiais e duvida da veracidade das razões, mas também duvida dos ataques contínuos, programados e oriundos das mesmas matrizes. Aprendeu a perceber a falta de convicção de jornalistas, especialmente os que atuam nas seis maiores empresas, a entender a pressão que alguns sofrem, e até mesmo, a decodificar sinais de falta de autenticidade. Isso explica a expressão “os colunistas foram inibidos”, de Luís Nassif.
Apesar de muito conhecido, o segundo equívoco foi o vício do poder. Não o poder formal, decidido nas urnas, sacramentado na posse e efetivado no mandato. Mas o poder invisível e de efeitos imediatos, como a pressão que intervém, o tráfico de influências e o apoio em troca de numerário, disfarçado na relação notícia-publicidade. O valor da opinião, somatizado numa relação de amor e ódio, tem pontos altos e baixos, com mimos aos “amigos”, com barganhas privadas de efeitos públicos, ou punidas com ameaças e processos.
A gravidade desse vício vem da ilegitimidade da sua ação. A imprensa não é partido político, nem tem a tarefa de controlar a informação, pela imposição de sua versão ou pela desqualificação das demais. E porque editores e proprietários de meios de comunicação julgam não precisar tratar seu público com respeito e fidelidade. O jornalista que não tem faro para fatos inéditos, de importância fundamental e com abrangência social, a que chamamos notícia, precisa ao menos manter seu olhar no público. Quanto mais fiel for a ele, tanto mais terá sua fidelidade. Perdê-la é possível e recuperá-la é o risco de navegar no imponderável.
O terceiro, mostra o golpe dentro do golpe. Em nome da vaidade, não se contentaram em lutar pela vitória de seus candidatos, partidos, idéias e interesses. Tornou-se necessário ganhar os louros pela vitória. Após a interpretação do segundo turno como conquista sua, sofreram o baque com seus resultados. Além da derrota, não puderam empunhar a bandeira da conquista na barganha por mais influência nas relações de poder. Apesar de sem empenho.
As últimas capas das revistas semanais e o setor de economia dos jornais mostraram que ela ainda não admitiu a derrota. A pressão na área econômica é um contra-canto, tendente a tornar-se solo. No jogo pesado e caro da imprensa, a vitória não foi de um candidato ou partido, mas de uma sociedade que parece ter se cansado de patrulhamento, ameaças e macarthismo. A unanimidade do denuncismo com fins eleitorais era tão evidente que lembrou as críticas às maiores agências de notícias que, ao aprimorarem a arte de inovar ao noticiar, levaram o leitor a perguntar se se tratava do mesmo fato.
A sociedade entendeu que jornalista bom é o que tem nariz (faro), não se envolve em guerra santa e, diferentemente do patrimônio do jornal, sua opinião não tem valor de mercado e nem pode ser comprada. E o leitor pode ser condescendente, mas não é tolo! Se o cidadão reúne informações, se consegue resistir a uma mensagem que se repete e cria acesso a outras fontes e chega a conclusões, vai ser difícil controlar-lhe a decisão. Que fazer? Aplaudir a autonomia que faz a sociedade avançar ou trabalhar para que seja tutelada mais uma vez?
- Antonio Carlos Ribeiro é Teólogo e jornalista
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