Sobrino-hermano

10/04/2007
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Uma mancha imaginária de sangue nas mãos de Lady Macbeth. Sonâmbula ela se levanta cada noite e por mais que limpasse as mãos que ofereceram o punhal ao marido para conquistar o trono, jamais conseguiu desfazer-se da sensação de um sangramento contínuo. Foram o encorajamento dela e a previsão de três bruxas que despertaram em Macbeth a ambição destemperada. A força mágica das feiticeiras sobre aqueles que as ouvem, a ambição do poder e a incapacidade de voltar atrás e refazer o caminho levam à tragédia.

A “Notificação” de Jon Sobrino sobrino-hermano pela Congregação para a Doutrina da Fé lembra esse cenário da tragédia “Macbeth”, de Shakespeare, sobre o tema universal do poder e do desejo que atravessa as instituições. Uma ferida imaginária, a Teologia da Libertação, continua sangrando no corpo da Eclésia. Uma ferida imaginária causada por uma culpa real de um sacrifício proibido no altar dos ídolos da tutela, do medo e do poder, exige vítimas. Que se cuidem os que andam como franciscanos na Companhia de Jesus! Anthony de Mello (1998), Jacques Dupuis (2001), Roger Haight (2004) e agora o hermano-sobrino são uma advertência. No caso do indiano Anthony de Mello, a “Notificação” saiu muitos anos depois da morte do autor, que indica, quem sabe, um cochilo da Congregação para a Doutrina da Fé. Errare et dormire humanum est. O caso doutrinário de Jon Sobrino no contexto da situação atual da teologia foi muito bem elucidado por Peter Hünermann, um dos sucessores do professor Joseph Ratzinger na Universidade de Tübingen.

A Congregação, que notificou Jon Sobrino sobre “erros” na explicação dos mistérios da fé, sentiu a necessidade de afirmar que sua intervenção é, obviamente, não contra mas a favor dos pobres. “A preocupação com os pobres”, diz a Nota Explicativa que acompanha a Notificação, é “um dos traços característicos da missão da Igreja”. Em seguida explica a sua versão da pobreza. A primeira pobreza é não conhecer o Cristo ou de não conhecê-lo de modo adequado, autêntico e integral. Não se sabe de onde a Congregação tira tanta certeza numa matéria que permite, segundo a própria definição da Igreja, apenas afirmações analógicas. Por que tanta severidade para com um pobre sobrevivente do massacre na Universidade Centro-Americana/UCA de El Salvador (16.11.1989) que representa a Igreja versus populum? Provavelmente nem as pílulas de Frei Galvão, que vai ser canonizado no dia 11 de maio, nem a missa em latim vão ajudar o povo nesse conhecimento autêntico da fé em Jesus Cristo. E a fuga em massa de católicos de sua Igreja um por cento ao ano! - não pode ser contida por um muro de doutrinas ou por uma cerca disciplinar. Afinal, o próprio Vaticano II declarou a liberdade religiosa como um direito humano fundamental. E agora José? Diga ao meu povo que avance!

- Paulo Suess é Teólogo

Fonte: REDE de CRISTÃOS
https://www.alainet.org/es/node/120451

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