Uma marcha para barrar as demissões

15/11/2007
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É impressionante a sensação de enxugar gelo que vivenciamos em nosso país no que diz respeito ao emprego dos trabalhadores. Entre janeiro e agosto deste ano, 9,7 milhões de pessoas foram admitidas e, no mesmo período, quase 8,4 milhões perderam seus empregos. Isso quer dizer que o país tem criado mais empregos com carteira assinada e, ao mesmo tempo, mais pessoas também estão sendo demitidas. A IV Marcha Nacional da Classe Trabalhadora, que ocorrerá dia 5 de dezembro, propõe que a Convenção 158 da OIT seja ratificada novamente, como mecanismo para coibir o poder absoluto do empresariado em demitir trabalhadores.

Rotatividade recorde

O Brasil possui uma das mais altas rotatividades dentre os países da América Latina. Mais de um terço dos postos de trabalho são renovados a cada ano, com demissões e novas contratações. A média de tempo que um trabalhador permanece no emprego em nosso país é de 3,5 anos (entre os metalúrgicos, metade não chega a completar 2 anos na vaga). Países que ratificaram a Convenção 158 da OIT apresentam uma realidade bem diferente da nossa. É o caso da Alemanha, cujo tempo médio de permanência no emprego é 10,4 anos; também é o caso do Canadá, onde o trabalhador permanece no emprego em média por 7,8 anos.

O instrumento da demissão imotivada serve ao empresariado como forma de ajuste para a competitividade. Como impacto geral, esse processo promoveu um rebaixamento salarial por meio de um perverso mecanismo de substituição de trabalhadores – processo chamado de rotatitividade.

A rotatividade como mecanismo de redução dos salários é freqüentemente utilizada em setores cujos níveis salariais encontram-se mais altos. Setores como o da construção civil, no qual os salários são mais baixos, a possibilidade de reduções salariais via rotatividade são mais limitadas, apesar de contribuir para manter os salários reduzidos. Segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), os admitidos na indústria em 2006 receberam uma remuneração 20% menor dos que foram desligados no mesmo ano.

A disputa pelo desenvolvimento

O 9º Concut aprovou resolução que defende um modelo de desenvolvimento para o Brasil que tenha como característica a distribuição de renda e a valorização do trabalho. O país já passou por alguns períodos de crescimento econômico, sendo que todos eles foram acompanhados por concentração da renda e desigualdade social.

Nos anos 1990, sob o governo dos tucanos, os trabalhadores pagaram a conta do ajuste neoliberal. A alteração do sistema de relações de trabalho, promovida por FHC, foi um elemento do ajuste econômico e de redefinição do papel do Estado na sociedade. O governo brasileiro ratificou a Convenção 158 em janeiro de 1996, denunciando-a após dez meses de vigência, em novembro do mesmo ano, por pressão da CNI (Confederação Nacional da Indústria).

De acordo com a Convenção 158, devem ser estabelecidas normas que impõem limites ao poder absoluto do empregador para efetuar demissões. Uma vez ratificada essa convenção, a dispensa precisa preencher determinados requisitos e procedimentos (direito de defesa, tentativa de reversão das dispensas coletivas, envolvimento das autoridades locais na tentativa de reversão total ou parcial dos cortes coletivos), para alcançar a regularidade jurídica.

Em 1966, a Ditadura Militar acabaçou com a estabilidade no emprego através da criação do FGTS. Desde então, não existe, no Brasil, mecanismos que inibam a dispensa imotivada dos trabalhadores. Durante o governo FHC, a única legislação do país que restringia o poder absoluto do empregador em demitir não atingiu sequer um ano de vigência formal.

Momento oportuno para as lutas

Temos presenciado um momento importante de retomada do crescimento, possibilitado pela melhoria de diversos indicadores econômicos, pela definição de políticas industriais, pela retomada dos investimentos públicos e privados no país, pela retomada do debate sobre desenvolvimento, entre outros fatores. As negociações coletivas têm logrado sucesso na conquista de reajustes acima da inflação, dado esse contexto favorável para a retomada das lutas.

Exigimos que esse crescimento econômico seja compartilhado com o conjunto da sociedade. Por isso, o tema da rotatividade da mão-de-obra no Brasil deve ser enfrentado com centralidade.

Com a rotatividade, perdem os trabalhadores e perde o orçamento público. Os valores desembolsados pelo Governo Federal para pagamento do seguro desemprego às pessoas dispensadas sem justa causa subiram de 5,7 bilhões para 12,7 bilhões no período entre 2002 e 2007. Trata-se de um aumento médio de 17,3% ao ano. Mesmo com a economia crescendo em torno de 5% em 2007, cerca de 9,5 milhões de trabalhadores serão demitidos, segundo previsões dos valores a serem desembolsados pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), o que representa 1/3 do mercado formal de trabalho. Esses recursos estão sendo desviados do investimento em outros programas.

O falso argumento do empresariado sobre a inconstitucionalidade desta ratificação é facilmente demonstrado. O artigo 7º, Inciso I, da Constituição Federal prevê a proteção da relação de emprego contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, mesma matéria da qual trata a Convenção 158 da OIT.

A IV Marcha traz como uma das suas bandeiras centrais a ratificação dessa Convenção. É urgente coibir a ação de empresas que não estão em sintonia com a proposta de desenvolvimento econômico e social que queremos para o nosso país.

- Rosane Silva é Secretária de Política Sindical da CUT Nacional

https://www.alainet.org/es/node/124285
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