Globo 1989-2015:

26 anos de campanhas sujas contra Lula

27/07/2015
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 lula collor
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Brasília - Pastas vazias. Em dezembro de 1989, as intenções de voto do candidato Luiz Inácio Lula da Silva cresciam em ritmo constante, enquanto o favorito Fernando Collor de Melo ficava estacionado, e para que esse quadro se revertesse e Collor pudesse finalmente ser eleito presidente, seria necessária uma importante ajuda da Rede Globo de Televisão. Era preciso desconstruir a imagem de Lula, ou melhor, a sua legitimidade, através de notícias negativas e da famosa montagem no debate final, nos estúdios da emissora, quando Collor chegou com uma volumosa pasta, na que assegurava conter provas irrefutáveis dos ilícitos cometidos por seu rival. Vinte anos depois, um ex-diretor da Globo admitiu ter planejado o espetáculo de Collor posando como justiceiro, diante das câmeras, com um portfólio cheio de papéis em branco.

 

Estudos posteriores demonstraram que essa fraude eletrônica, complementada pela reedição igualmente tendenciosa dos melhores momentos do debate entre os candidatos, reverteu a curva de aprovação ascendente de Lula. Três dias depois, no dia 17 de dezembro de 1989, o petista sofreria sua primeira derrota presidencial contra a Globo, a única força política que sobreviveu impune aos 21 anos de ditadura, que obstruiu a transição democrática (censurando as mobilizações massivas por eleições diretas), e vem prolongando seu status de partido hegemônico até hoje.

 

Há duas semanas, um fiscal substituto, com currículo acadêmico mediano e uma folha de serviços judiciais na que se destacam 245 advertências por desempenho negligente e/ou demorado, protocolou uma acusação contra o ex-presidente e líder histórico do PT em tempo recorde, segundo ele, porque suspeitava do delito de “tráfico de influências internacional”.

 

O funcionário suplente, conhecido na comarca judicial de Brasília (integrada por vários procuradores e juízes anti-lulistas) por sua velocidade de tartaruga, iniciou o procedimento investigativo atropelando o prazo previsto pela promotora titular, que expirava em setembro.

 

Fez isso baseado nos artigos publicados pelo grupo Globo, nos que se associavam as viagens de Lula ao exterior, entre 2011 e 2014 com supostas manobras dolosas a favor da construtora Odebrecht – que atua em vários países e se beneficia há décadas das gestões de governantes civis e militares.

 

Em artigo ilustrado com a imagem de Lula com um gesto intrigante, a revista Época, das Organizações Globo, o define como um “operador” das empresas construtoras, e associa, sem nexo documental nem testemunhal, sua agenda internacional com o tráfico de influências.

 

O semanário global mostra mensagens de fax que confirmam as viagens, o que é redundante, porque os eventos no qual participou foram públicos, e se insinua que o grosso desses encontros não se realizaram com a participação da Odebrecht. Para completar a desinformação, a nota evita explicar devidamente que várias dessas viagens internacionais foram para receber prêmios e títulos de doutorados honoris causa, na Espanha, Estados Unidos e México, ou para manter reuniões com ex-presidentes, como as duas que teve com Bill Clinton.

 

Quem leu os quase 20 mil caracteres da reportagem principal, publicada no dia 30 de abril – a que foi citada pelo promotor para fundamentar suas suspeitas – chegará à conclusão de que contém tantos indícios contra Lula como os que guardavam as pastas em branco que levaram Collor à presidência em 1989, com cumplicidade da mesma Globo.

 

O vazio informativo da Globo nessa e em outras matérias similares, se transformou em escândalo mundial em questão de horas: agências internacionais e cadeias televisivas do mundo inteiro replicaram a notícia de que Lula estaria envolvido numa trama suspeita. A bola de neve se tornou gigante com o passar das semanas, e aquela notícia oca conseguiu inspirar análises mal-intencionados, especialmente da imprensa anglo-saxônica, e mais ainda dos meios financeiros como o Financial Times, que escreveu na semana passada um editorial sobre o “filme de terror” de um Brasil que se afunda na corrupção, e que só se salvaria com um plano de ajuste exemplar. Seria, por acaso, um plano como o imposto à Grécia? Possivelmente sim.

 

Aliás, as teses extremamente neoliberais do Financial Times costumam ser tomadas como próprias pela Globo, para o que imagina ser um futuro próximo pós-Lula e pós-Dilma Rousseff – também a querem fora do Planalto, apesar das políticas ortodoxas de seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, um ex-funcionário do FMI e do banco privado Bradesco.

 

A urgência do grupo midiático mais concentrado da América Latina em virar a página da era “lulopetista” foi bem resumido na semana passada, num artigo de opinião cujo título – “Sem tempo” – não deixa lugar a dúvidas, trazendo argumentos a favor de uma saída antecipada de Dilma e a continuidade do ortodoxo ministro Levy numa gestão de transição, após um hipotético golpe institucional.

 

Como os nazistas

 

Poucos jornalistas conhecem a lógica política da Globo como Tereza Cruvinel, que trabalhou durante mais de uma década como colunista política para os meios da empresa, antes de seguir sua carreira em outros veículos. Cruvinel assegura que o plano editorial para acabar com o capital simbólico e político de Lula tem um capítulo crucial com sua chegada ao poder, em 2003.

 

“Esta novela vem sendo escrita desde 2003, e agora começa a tomar forma. No epílogo desejado por seus autores, Lula sai da história, do lugar que lhe é de direito, por sua trajetória, e termina de forma vergonhosa, processado (como a Justiça o declara), inelegível, e assim o povo não repete a ousadia de votar em alguém que saiu da pobreza e da classe trabalhadora”, analisa Cruvinel.

 

Lula respondeu aos ataques nesta sexta-feira (24/7): “tenho a impressão de que o que vemos na televisão se parece com o que os nazistas faziam, criminalizando o povo judeu, ou o que os romanos faziam, criminalizando os cristãos. Estou cansado de ver esse tipo de criminalização contra as esquerdas”.

 

Em encontro com sindicalistas da região industrial de São Paulo, o ex-presidente reforçou sua indignação enaltecendo a honestidade de Dilma, caluniada diariamente com insinuações sem provas. Vestido com o velho macacão de militante, o ex-presidente viaja pelo Brasil denunciando a tentativa de golpe branco contra Dilma, reivindicando a política econômica distribucionista dos governos petistas, assim como da continuidade da política externa voltada à América Latina.

 

Apesar das campanhas negativas contra si, Lula mantém uma agenda de encontros internacionais que, nos últimos meses, incluiu eventos com os presidentes Evo Morales e Cristina Fernández, o secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper, e o presidente do Parlamento venezuelano Diosdado Cabello, encontro que ocorreu pouco antes da missão de senadores opositores brasileiros, que viajaram à Venezuela para se encontrar com os referentes golpistas.

 

Lula é o único sobrevivente da troica sul-americana formada por ele, Néstor Kirchner e Hugo Chávez – a que, em 2005, acabou com o projeto de “anexação” da ALCA, na cara de George Walker Bush, que foi àquela Cúpula das Américas de Mar del Plata com a certeza de que ninguém se atreveria. Tinha como aliado o corpulento presidente mexicano Vicente Fox, que mostrou ser um anão político de incapacidade diplomática singular.

 

O eventual retorno do líder petista nas eleições de 2018 é uma hipótese contra a qual a família Marinho, dona da Rede Globo, trabalha determinada, junto com seus sócios políticos locais. Esse bloco contrário ao regresso de Lula conta, possivelmente, com o aval dos grupos de interesse estrangeiros, “provavelmente norte-americanos”, comprometidos com a restauração de um projeto de livre mercado hemisférico, comentou a este diário o chefe do bloco de deputados do PT, Sibá Machado.

 

Tradução: Victor Farinelli

 

Créditos da foto: reprodução

 

27/07/2015

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Globo-1989-2015-36-anos-de-campanhas-sujas-contra-Lula/4/34081

 

https://www.alainet.org/es/node/171356?language=en
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