A crítica das armas
21/01/2015
- Opinión
Os incidentes recentes ocorridos na França, aparentemente envolvem princípios religiosos, no entanto, revelam que os dilemas capitalistas oscilam entre a pobreza moral e a miséria da civilização, que refletem os suspiros de criadores e criaturas atormentadas em um mundo sem coração.
Karl Marx, ainda na juventude, fez a crítica à filosofia do direito e disse que a arma da crítica não pode substituir a crítica das armas e o poder material tem que ser derrubado pelo poder material, no entanto, também a teoria deve se transformar em poder material assim que se apoderar das massas organizadas na luta de classes para superar os reflexos dos arremedos do próprio homem ignorante.
Os arautos do fim do socialismo na década de 1990, burgueses ou não, sentem-se agora surpreendidos com as reações e realizam marchas com um discurso vingativo contra aqueles que ousaram discordar da mediocridade teórica, daqueles que já não enxergavam as classes, mas apenas as diferenças culturais. Por sua vez, enquanto a humanidade se despedaça por causa de uma civilização irresponsável, a mídia, em nome da liberdade de expressão, materializa mensagens nas consciências barbariza das dos consumidores de futilidades, com caricaturas, para diverti-las, enquanto a outra parte toma as caricaturas como realidade e se revolta em defesa do reflexo da própria miséria da consciência.
A liberdade de expressão apregoada pela mídia, genuína representante dos interesses do capital, que acentua os aspectos da banalidade e omite as verdadeiras causas da barbárie, passa a ser questionada com as próprias armas utilizadas para cala a liberdade cultural, extinguir fronteiras nacionais e apoderar-se das riquezas alheias.
O entendimento da liberdade de expressão burguesa é o de combinar o uso da arma da crítica com a crítica das armas para fazer os povos criticados serem também povos subjugados. No entanto, a liberdade de expressão, como um direito democrático, precisa preservar valores e prezar pelos princípios éticos; isto porque, se a crítica das armas fere o princípio da vida física, a arma da crítica mal direcionada, fere o princípio da vida moral e o livre direito à formação cultural.
A ausência da luta de classes e a falta de teoria revolucionária têm levado não só a Europa a desmaterializar o poder das massas e todas as formas de organização. A liberdade de expressão passou a ser um direito privado dos meios de comunicação que forjam os próprios fenômenos através da sátira preconceituosa. Agem, dessa forma porque, no sistema de livre mercado, a informação tornou-se uma das principais mercadorias que não ocupa espaço para ser armazenada; surge e desaparece no próprio movimento de circulação.
A crítica das armas, com o nome de defesa da democracia e dos direitos humanos, vem sendo utilizada regularmente pelos capitalistas para violentar as culturas e garantir os lucros do capital, quando os pobres fazem uso dela é porque a arma da crítica já não pode mais ser utilizada.
A liberdade de expressão burguesa não pode fortalecer a humilhação, nem a sátira, que serve para divertir e não deve ferir os direitos da livre expressão cultural. Por sua vez, a crítica das armas não se justifica sem que a arma da crítica tenha se enraizado na consciência e na organização das massas. Até lá, devemos considerar terrorismo todo ato militar, intelectual e moral que ofenda a dignidade humana.
- Ademar Bogo é filósofo e escritor
21/01/2015
https://www.alainet.org/fr/node/166970?language=en
Del mismo autor
- A militância contra a impotência 18/08/2021
- Verdadeiramente humano 31/10/2017
- Parecidos e diferentes 05/02/2015
- A crítica das armas 21/01/2015
- A política por outros meios 12/11/2014
- Ideias com ideias 16/10/2014
- Arquitetos do destino 17/09/2014
- Tudo dó 03/09/2014
- O institucional e o seu contrário 01/09/2014
- A vez do projeto 29/04/2014