Solidariedade ao povo de Oaxaca! Viva a rebelião popular!
16/11/2006
- Opinión
Não são dias, são meses. Chegam a cinco. Desde aí, todos os dias, as gentes da cidade de Oaxaca, no sul do México, enfrentam a violência, a tragédia, a dor. Todos os dias, o povo organizado na Assembléia Popular do Povo de Oaxaca, planeja novas formas de resistir e enfrentar o poder estatal que tenta impedir a luta de quem já sabe que é chegada a hora de tomar nas mãos seu destino.
A mídia, eterna cortesã do poder, pouco mostra de Oaxaca. E o que mostra é o que Noam Chomsky já explicou: as vítimas amigas. Segundo esse estudioso estadunidense, os meios de comunicação separam muito bem as vítimas de qualquer conflito. Existem as vítimas amigas e as vítimas inimigas. As amigas são mostradas a exaustão. Exemplo. Num confronto com o povo de Oaxaca, o destaque é sempre dado ao soldado que foi ferido e não às centenas de milhares de pessoas do povo que são espancadas, assassinadas, violadas etc... Outro elemento importante é o completo esquecimento das causas do conflito. Quem vê as imagens de enfrentamentos entre os populares a as forças policiais fica sem saber muito bem porque tudo aquilo acontece. É a velha e boa teoria de obscurecer o essencial. Assim, o que fica no imaginário de quem vê os jornais televisivos, é apenas a violência em si, que pouco ou nada diz do que realmente acontece. Aí, fica mais fácil demonizar os homens e mulheres que resistem na cidade.
O que é muito importante lembrar é que a revolta de Oaxaca não é uma explosão isolada de uma população enlouquecida. Ela é fruto de todo um processo de resistência e luta contra as políticas de depredação do estado, de destruição da soberania mexicana, de violação dos direitos mais básicos das gentes. Ainda este ano, uma outra revolta – na cidade de San Salvador de Atenco – mostrou muito bem o que acontece no México neoliberal de Vicente Fox, e agora de Felipe – o Breve. Naqueles dias, em maio, o governo decidiu que iria expropriar as terras comunais do povo de Atenco, o chamado ejido. Estas terras são de propriedade comunal, de uma gente que desde os tempos imemoriais as cultivam de forma coletiva e cooperativa. A idéia era fazer um aeroporto.
Os camponeses decidiram que não iriam aceitar o confisco de suas terras ancestrais e iniciaram um processo de resistência. A resposta do governo de Fox foi a mais violenta possível. Mais de três mil homens, fortemente armados, invadiram a cidade e enfrentaram, à bala, o povo em rebelião. As gentes, armadas apenas de coragem e alguns paus, não fugiram na luta e sofreram um massacre. O saldo foi um garoto de 14 anos morto e dezenas de presos, brutalmente espancados. Mulheres foram violadas e o governo foi à televisão dizer que tudo aquilo tinha uma justificativa: “manter o estado de direito”. O direito de quem? Da classe dominante, é claro. Naqueles dias, o povo de Atenco foi chamado de selvagem, baderneiro e todos os demais adjetivos que tão bem conhecemos. Quem viu as imagens da ocupação da política sabe quem são os selvagens.
Agora, em Oaxaca, a situação é semelhante. O sul do México é uma das regiões mais pobres do país e a que mais tem sofrido com a política de Fox. Os acordos com os Estados Unidos, as reformas constitucionais, tudo tem sido feito para beneficiar uma pequena parcela de gente, a elite entreguista mexicana, principalmente os latifundiários. As gentes, assim, resistem o quanto podem. E, chega uma hora em que a resistência vira ação e luta. Ninguém que viva no México esqueceu o que aconteceu em San Salvador de Atenco. A selvageria, a agressão, as prisões. Mas, sabem que a violência estatal não pode ser motivo para a mudez e o medo. Por isso, quando Ulises Ruiz, o governador do estado de Oaxaca, decidiu colocar na rua as tropas para reprimir uma manifestação pacífica de professores que exigiam melhores salários, o povo decidiu que era hora de ser solidário e, ao mesmo tempo, pleitear aquilo que desde a Revolução Mexicana vem sendo preparado: o direito das maiorias de controlar e dirigir suas vidas. Por isso, a consigna principal é “fora Ruiz”, o legítimo representante da elite local.
O levantamento popular gerou outra onda de violência por parte do Estado, tal e qual a que houve em Atenco. Como tudo aconteceu junto com o processo eleitoral, o governo demorou para tomar uma decisão de invadir a cidade – que estava totalmente controlada pelo povo, desde a mídia até os centros de poder. Mas, enfim, passadas as fraudulentas eleições, veio a polícia e todo o seu arsenal de terror. Gente organizada é perigo para as elites. Povo em rebelião é coisa ruim para quem vive da exploração alheia. Os latifundiários e a burguesia mexicana ainda têm nas retinas aqueles dias da revolução camponesa e popular, no início do século vinte, quando Zapata e Villa incendiavam, com rebelde e insurgente coragem, o coração e as mentes do povo. Quando esse mesmo povo, a custa de sangue, garantiu uma reforma agrária e outros tantos direitos que têm sido perdidos ao longo dos tempos.
Como já diz o historiador Adolfo Gilly, a revolução mexicana quedou interrompida. Não se cumpriram todas as reivindicações daqueles homens e mulheres heróicos, que deram sua vida pela liberdade de todos. Por isso, ela volta, recorrente, nas freqüentes rebeliões e insurgências. Hoje, é o povo de Oaxaca, como foi o de Atenco, como são os zapatistas e todo o movimento sindical e popular. A luta por um México soberano segue firme e sem volta. Cabe a nós, o apoio irrestrito às gentes em luta. Assim como eles, no México, cada um de nós estamos fazendo nossa parte nos espaços geográficos que ocupamos. Abya Yala livre! Venceremos!
- Elaine Tavares – jornalista no Ola/UFSC. O OLA é um projeto de observação e análise das lutas populares na América Latina.
http://www.ola.cse.ufsc.br
A mídia, eterna cortesã do poder, pouco mostra de Oaxaca. E o que mostra é o que Noam Chomsky já explicou: as vítimas amigas. Segundo esse estudioso estadunidense, os meios de comunicação separam muito bem as vítimas de qualquer conflito. Existem as vítimas amigas e as vítimas inimigas. As amigas são mostradas a exaustão. Exemplo. Num confronto com o povo de Oaxaca, o destaque é sempre dado ao soldado que foi ferido e não às centenas de milhares de pessoas do povo que são espancadas, assassinadas, violadas etc... Outro elemento importante é o completo esquecimento das causas do conflito. Quem vê as imagens de enfrentamentos entre os populares a as forças policiais fica sem saber muito bem porque tudo aquilo acontece. É a velha e boa teoria de obscurecer o essencial. Assim, o que fica no imaginário de quem vê os jornais televisivos, é apenas a violência em si, que pouco ou nada diz do que realmente acontece. Aí, fica mais fácil demonizar os homens e mulheres que resistem na cidade.
O que é muito importante lembrar é que a revolta de Oaxaca não é uma explosão isolada de uma população enlouquecida. Ela é fruto de todo um processo de resistência e luta contra as políticas de depredação do estado, de destruição da soberania mexicana, de violação dos direitos mais básicos das gentes. Ainda este ano, uma outra revolta – na cidade de San Salvador de Atenco – mostrou muito bem o que acontece no México neoliberal de Vicente Fox, e agora de Felipe – o Breve. Naqueles dias, em maio, o governo decidiu que iria expropriar as terras comunais do povo de Atenco, o chamado ejido. Estas terras são de propriedade comunal, de uma gente que desde os tempos imemoriais as cultivam de forma coletiva e cooperativa. A idéia era fazer um aeroporto.
Os camponeses decidiram que não iriam aceitar o confisco de suas terras ancestrais e iniciaram um processo de resistência. A resposta do governo de Fox foi a mais violenta possível. Mais de três mil homens, fortemente armados, invadiram a cidade e enfrentaram, à bala, o povo em rebelião. As gentes, armadas apenas de coragem e alguns paus, não fugiram na luta e sofreram um massacre. O saldo foi um garoto de 14 anos morto e dezenas de presos, brutalmente espancados. Mulheres foram violadas e o governo foi à televisão dizer que tudo aquilo tinha uma justificativa: “manter o estado de direito”. O direito de quem? Da classe dominante, é claro. Naqueles dias, o povo de Atenco foi chamado de selvagem, baderneiro e todos os demais adjetivos que tão bem conhecemos. Quem viu as imagens da ocupação da política sabe quem são os selvagens.
Agora, em Oaxaca, a situação é semelhante. O sul do México é uma das regiões mais pobres do país e a que mais tem sofrido com a política de Fox. Os acordos com os Estados Unidos, as reformas constitucionais, tudo tem sido feito para beneficiar uma pequena parcela de gente, a elite entreguista mexicana, principalmente os latifundiários. As gentes, assim, resistem o quanto podem. E, chega uma hora em que a resistência vira ação e luta. Ninguém que viva no México esqueceu o que aconteceu em San Salvador de Atenco. A selvageria, a agressão, as prisões. Mas, sabem que a violência estatal não pode ser motivo para a mudez e o medo. Por isso, quando Ulises Ruiz, o governador do estado de Oaxaca, decidiu colocar na rua as tropas para reprimir uma manifestação pacífica de professores que exigiam melhores salários, o povo decidiu que era hora de ser solidário e, ao mesmo tempo, pleitear aquilo que desde a Revolução Mexicana vem sendo preparado: o direito das maiorias de controlar e dirigir suas vidas. Por isso, a consigna principal é “fora Ruiz”, o legítimo representante da elite local.
O levantamento popular gerou outra onda de violência por parte do Estado, tal e qual a que houve em Atenco. Como tudo aconteceu junto com o processo eleitoral, o governo demorou para tomar uma decisão de invadir a cidade – que estava totalmente controlada pelo povo, desde a mídia até os centros de poder. Mas, enfim, passadas as fraudulentas eleições, veio a polícia e todo o seu arsenal de terror. Gente organizada é perigo para as elites. Povo em rebelião é coisa ruim para quem vive da exploração alheia. Os latifundiários e a burguesia mexicana ainda têm nas retinas aqueles dias da revolução camponesa e popular, no início do século vinte, quando Zapata e Villa incendiavam, com rebelde e insurgente coragem, o coração e as mentes do povo. Quando esse mesmo povo, a custa de sangue, garantiu uma reforma agrária e outros tantos direitos que têm sido perdidos ao longo dos tempos.
Como já diz o historiador Adolfo Gilly, a revolução mexicana quedou interrompida. Não se cumpriram todas as reivindicações daqueles homens e mulheres heróicos, que deram sua vida pela liberdade de todos. Por isso, ela volta, recorrente, nas freqüentes rebeliões e insurgências. Hoje, é o povo de Oaxaca, como foi o de Atenco, como são os zapatistas e todo o movimento sindical e popular. A luta por um México soberano segue firme e sem volta. Cabe a nós, o apoio irrestrito às gentes em luta. Assim como eles, no México, cada um de nós estamos fazendo nossa parte nos espaços geográficos que ocupamos. Abya Yala livre! Venceremos!
- Elaine Tavares – jornalista no Ola/UFSC. O OLA é um projeto de observação e análise das lutas populares na América Latina.
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