PT 30 anos depois

24/02/2010
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O PT não foi um partido apenas com uma perspectiva eleitoral, mas deu uma contribuição política muito importante à classe trabalhadora brasileira e da América Latina
 
O Partido dos Trabalhadores (PT), acaba de completar 30 anos de existência. É fato que boa parte dos brasileiros já votaram, em alguma eleição, em candidatos do PT ou participaram de alguma mobilização política por ele encabeçada. É claro que num primeiro momento se tratava dos militantes que ajudaram a construir o partido na década de 1980, militantes vindos de várias experiências, de organizações políticas de formação marxista, comunistas e socialistas de diversas matizes; cristãos progressistas e de esquerda de diversas confissões; militantes dos movimentos populares; e intelectuais que participaram das lutas contra a ditadura militar e pela democratização do país.
 
Mas também é fato que, nos últimos anos, vimos chegar ao PT os neo-petistas, que se insinuaram desde sempre por perceberem o potencial do partido, e que “aderiram” em massa sobretudo após a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República. Ou seja, elementos oriundo de setores mais conservadores e que almejavam vantagens eleitorais, acostumados às legendas de aluguel, uma tradição política em nosso país.
 
Desde as grandes jornadas populares que antecederam o golpe de 1964, somente a partir da primeira metade dos anos 1970 e a década de 1980 – portanto, apenas durante um curto período - o nosso país conheceu um reascenso das lutas populares. Foi nesse período de efervescência social e política, que surgiram vários partidos, organizações e movimentos dos trabalhadores e do povo, de orientação à esquerda, entre os quais o PT, a CUT, o MST e as pastorais sociais. Essas organizações enfrentaram grandes desafios políticos, como a reorganização da esquerda brasileira (parte dela destruída pela ditadura), a reorganização dos seus instrumentos políticos e a elaboração de um novo projeto para o Brasil.
 
Nesse período de reascenso da luta política, o PT, junto com as demais organizações do movimento sindical e social, construiu uma estratégia política e uma elaboração teórica importante sistematizada no Programa Democrático Popular, tendo como horizonte o socialismo. Para dar conta dessa estratégia investiu na combinação de várias frentes de atuação.
 
A primeira frente era a luta institucional, eleger prefeitos, vereadores, deputados, governadores e até o presidente da República, no intuito de ir acumulando forças e avançando na democratização do Estado, através da consolidação de reformas importantes, como na educação, reforma agrária, reforma urbana e que tinham como slogan O Modo Petista de Governar.
 
A segunda grande frente dessa estratégia era a do fortalecimento das lutas populares, através da organização dos vários movimentos sociais, da aposta numa nova concepção de sindicato e do incentivo às lutas políticas numa perspectiva de enfrentamento do Estado e de conquista das várias demandas sociais do conjunto da classe trabalhadora.
 
Importantes intelectuais e quadros políticos ajudaram nessa elaboração política, e essa estratégia democrática e popular conseguiu, em dez anos, construir um dos maiores partidos de esquerda do mundo e projetar uma das lideranças de massa mais importante da esquerda que é o hoje o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
 
No entanto, esse ciclo de avanços das lutas e organização da classe trabalhadora dentro de uma perspectiva de construção do socialismo sofreu uma importante derrota política em sua frente institucional de luta, que foi a vitória do candidato Fernando Collor de Mello nas eleições de 1989, o que se transformou em uma grande derrota da estratégia escolhida pelo partido. Paralelamente, foi nesse mesmo período, que tivemos a derrota do socialismo do Leste Europeu, com a queda do muro de Berlim e com o avanço da implementação do neoliberalismo em toda América Latina e no Brasil. E com o neoliberalismo, tivemos a reorganização de todo o mundo do trabalho, enfraquecendo os movimentos dos trabalhadores assalariados, especialmente os operários, e as bases políticas e organizativas dessa estratégia coordenada pelo PT.
 
Nesses trinta anos, o PT não foi um partido apenas com uma perspectiva eleitoral, mas deu uma contribuição política muito importante à classe trabalhadora brasileira e da América Latina. O Partido dos Trabalhadores é uma grande experiência política-partidária dos últimos anos por combinar um partido de quadros, dirigentes, intelectuais e ao mesmo tempo ser um partido de massas com grande participação popular e abrangência nacional.
 
Mas claro, é fácil perceber que o PT chega aos trinta anos bem diferente do PT da década de 1980. Por um lado, porque a conjuntura política é outra, os desafios da classe trabalhadora são de outra natureza e os inimigos do povo também se transformaram. Portanto, é natural que as organizações da classe também ajustem sua estratégia. No entanto, a principal mudança no PT foi na definição dos seus objetivos políticos: abriu mão do seu projeto de poder e hoje se contenta com um projeto de governabilidade do Estado, e em ganhar espaço no campo institucional consolidando uma hegemonia política com setores do centro-esquerda. Neste cenário, a estratégia de acúmulo de forças através das lutas de massa já não é mais prioridade.
 
Hoje podemos esperar do PT uma contribuição na luta eleitoral, o que na atual conjuntura de descenso das lutas sociais e disputa institucional cumprirá um papel político importante. Ao mesmo tempo, não devemos deixar de ter em mente que ele continua sendo um aliado importante da classe trabalhadora e dos movimentos sociais. Como também não podemos esquecer que as eleições constituem sempre uma das expressões da luta de classes.
 
Este é talvez o momento de, a partir do olhar sobre a experiência histórica do PT, fazermos uma boa avaliação da estratégia política da esquerda brasileira, em especial dos limites e avanços da luta política dos últimos 30 anos. E de aproveitar para fazer um amplo debate com toda a militância sobre o papel e a natureza de um partido na atual conjuntura, e como conciliar a luta institucional com a luta social e sindical no próximo período, sendo que o PT ainda poderá cumprir um papel de grande referência para uma nova estratégia política.
 
- Brasil de Fato, Editorial ed. 365
https://www.alainet.org/pt/active/36402
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