Brasil e America do Sul: adeus à condição de quintal

23/08/2010
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Extensão territorial, poder econômico e poder militar são três fatores que devem ser considerados para qualificar um país como potência e compreender sua posição na hierarquia entre Estados. Estes são os fatores que permitem a um Estado atuar independentemente e influir sobre outros Estados e, portanto, determinar em que condições ele se expressa como potência regional internacional. Um Estado, que dispõe de potencial econômico, força militar e  extensão territorial (assumindo, por suposto, que sua população seja correspondente ao espaço que ocupa), pode tornar-se hegemônico, o líder e o guia de  um sistema de alianças e acordos de variado alcance.

Para contar com todos os fatores que garantem a segurança da vitória, tanto quanto seja possível prever-se, é necessário que o Estado tenha capacidade de exercer pressão diplomática, i. e., capacidade para obter parte do que poderia ser o resultado de uma guerra vitoriosa sem necessidade de combater realmente.[1] Mesmo assim, a paz interna, como reflexo do exercício eficiente dos grupos sociais e de sua função interna hegemônica, é indispensável, se o Estado pretende ser una potência internacional. Em outras palavras, como ponderou Kart W. Deutsch, o potencial do status de poder é uma simples estimativa dos recursos materiais e humanos que podem ser usados para prever quanto êxito poderá ter um país em uma disputa contra outro país, se usa seus recursos como vantagem. [2] De acordo com Deutsch, um país tanto mais terá condições de afirmar-se como potência quanto mais extenso for e quanto mais numerosa seja sua população e os recursos que pode mobilizar para a consecução de uma política (57). Poder, pura e simplesmente, é a habilidade de um ator de prevalecer em um conflito e superar os obstáculos, se usa com vantagem seus recursos.

Com mais de 196 milhões de habitantes (em 2007), a extensão territorial de Brasil é apenas pouco menor do que a dos Estados Unidos continental, incluindo o Alaska.  Soma 8.514.215 milhões de quilômetros quadrados e seu litoral se estende por 7.367 quilômetros.  Tem 15.735 quilômetros (cerca de 8.000 milhas) de fronteiras, sem litígio, com todos os países da América do Sul (exceto Equador e Chile).  E dentro deste vasto território, seus recursos naturais são abundantes: terras férteis para a agricultura, reservas imensas jazidas de ferro e outros minerais metálicos, urânio, biodiversidade, enormes reservas de água e recursos hidroelétricos.  E, conforme a estimativa da Associação Brasileira de Geólogos de Petróleo (ABGP), os campos descobertos na Bacia de Santos, litoral do Estado de S. Paulo, contêm 33 bilhões de barris, o que quadruplica as reservas de petróleo do Brasil de 13 bilhões de barris (provados) para cerca de 46 bilhões de barris. Somente no campo de Tupi (litoral de Santos) há cerca de 5 a 8 bilhões de barris. Os dados são ainda muito imprecisos, mas de acordo com Stephanie Hanson, do Council on Foreign Relations, o volume de petróleo  na camada pré-sal, que provavelmente se estende por 800 quilômetros, do Espírito Santo, norte do Rio de Janeiro, a Santa Catarina,[3] deve ser da ordem de  70 a 100 bilhões de barris, além de grande volume de gás.[4] O Produto Interno Bruto do Brasil (PIB) do Brasil, conforme a paridade do poder de compra, utilizado pelo Banco Mundial, era em 2007 da ordem de  U$S 1,849 trilhão, mais de três vezes maior do que o da Argentina, estimado em U$S 526 bilhões (2005), maior do que o do Canadá,  calculado em  U$S 1,271 trilhão (est. 2007), do que o do México, U$S 1,353 trilhão (2007 est.), do que o da Espanha ( U$S 1,361 trilhão, est. 2007), igual ao da Itália  (U$S $1,8 trilhão, 2007 est.), um pouco menor do que o da França (U$S 2,075 trilhões, 2007 est), que o da Rússia (U$S 2,097 trilhões, 2007 est.) e do Reino Unido (U$S 2,13 trilhão, 2007 est.).[5]

Não sem razão, já em 1976, ao ser interpelado, no House Foreign Affairs Commitee, se os Estados Unidos haviam elevado o Brasil ao status de potência mundial, por terem os dois países assinado um acordo de consulta, Henry Kissinger, então secretário de Estado na administração do presidente Gerald Ford (1974-1977), replicou:

“(…)
This agreement does not make Brazil a world power. Brazil has a population of 100 million, vast economic resources, a very rapid rate of economic development. Brazil is becoming a world power, and it does not need our approval to become one, and it is our obligation in the conduct of foreign policy to deal with the realities that exist”.[6]

Segundo Kissinger, o Brasil via o seu relacionamento com os Estados Unidos como similar a dois pilares gêmeos (twin pillars), cabendo-lhe organizar a América Latina, enquanto cabia aos Estados Unidos a mesma tarefa, na América do Norte, duas empresas trabalhando em harmonia, através de freqüente intercâmbio, e articulando seus propósitos comuns”.[7]

A América Latina, a que Henry Kissinger se referiu, significava, em realidade, a América do Sul, como se pode claramente inferir da frase, porquanto a América do Norte, compreendida como o México e os países da América Central, era a área de responsabilidade dos Estados Unidos. E com argúcia Kissinger observou que a igualdade teórica da soberania de cada nação latino-americana, postulada pelo sistema interamericano, não fazia parte do vocabulário brasileiro.[8] Conforme ressaltou João Augusto de Araújo Castro, embaixador do Brasil em Washington (1971-1975)[9], o Brasil jamais considerou suas relações com os Estados Unidos como um capítulo das relações entre os Estados Unidos e a América Latina e deseja cooperar com todos os países do continente, mas não queria ser confundido com qualquer um deles, nem sequer admitia ser confundido com sua totalidade[10]. Com efeito, o Brasil não somente não queria ser confundido com a América Latina, em geral, como não aceitava tal conceito então generalizado e adotado pelas instituições multilaterais, para enquadrar toda uma região onde os diversos Estados apresentavam enormes disparidades e assimetrias. O Brasil não queria ser diluído em um conjunto de países, dos quais se diferenciava pela sua dimensão territorial, demográfica e econômica. Havia, concretamente, uma hierarquia de poderes, em que o Brasil se sobressaía, dado que, ao separar-se de Portugal, não se desintegrara, como aconteceu com a América espanhola, e manteve, sem ruptura da ordem política, a vasta extensão do seu território.

A percepção de Kissinger quanto ao papel que o Brasil desempenhava ou pretendia desempenhar tinha fundamento histórico. Desde a segunda metade do século XIX, o Brasil configurou uma potência regional. Possuía um aparelho burocrático-militar capaz de defender e mesmo impor, tanto interna quanto externamente, os interesses de sua elite dirigente, devido ao fato de que não era um simples sucessor do Estado português. Era o próprio Estado português, que se trasladara para a América do Sul, ajustara-se às condições econômicas e amoldara-se à estrutura social da colônia, mas conservara sua contextura institucional, assentada no dogma da soberania una e indivisível da Coroa, a hierarquia, as leis civis, os métodos administrativos, o estilo político, o instrumental bélico e diplomático, com experiência internacional, e o vezo de potência. Daí porque, em 1854, o diplomata Martin  Maillefer, ministro plenipotenciário da França em Montevidéu, chamou o Brasil de “Rússia tropical”, que tinha “a vantagem da organização e perseverança em meio dos Estados turbulentos e mal constituídos da América do Sul” [11].

Após a Guerra da Tríplice Aliança com o Paraguai, que comprometeu gravemente as finanças do Brasil, a Argentina consolidou-se como Estado nacional e, embora as economias dos dois países não competissem e até mesmo se complementassem, suas relações caracterizaram-se cada vez mais por forte rivalidade, gerando tensões e graves crises, entremeadas com esforços de entendimento e de cooperação, ao longo de toda a primeira metade do século XX. A partir do final da Segunda Guerra Mundial, com a implantação da indústria pesada, e particularmente com a implantação da siderúrgica, o desenvolvimento do Brasil avantajou-se, enquanto a economia da Argentina, assentada sobre a agropecuária, continuou a depender das exportações de carne e cereais e importações de bens de capital, cada vez mais caras, para sustentar uma indústria com características leves, de bens de consumo. Assim, expansão econômica do Brasil, a partir dos governos dos presidentes Getúlio Vargas (1951-1954) e Juscelino Kubitschek (1956-1961), tomou enorme impulso e, após a crise na primeira metade dos anos 1960,  seu PIB desde 1968 passou a crescer a taxas de 9%, 10% e 11% a.a., contrastando com a relativa estagnação da Argentina, o que aumentou o desequilíbrio de poderes cada vez mais  na América do Sul. Um século depois, pôde então o Brasil restabelecer a hegemonia que mantivera na Bacia do Prata, até 1876, quando retirou as tropas do Paraguai, derrotado na Guerra da Tríplice Aliança.

América do Sul como conceito geopolítico

O conceito de América do Sul, como conceito geopolítico, e não o conceito de América Latina, um conceito étnico, muito genérico, e sem consistência com seus reais interesses econômicos, políticos e geopolíticos, foi que sempre pautou, objetivamente, a política exterior do Brasil, e até a metade do século XX suas atenções concentraram-se, sobretudo, na região do Rio da Prata, ou seja, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia, que conformavam sua vizinhança e com os quais havia fronteiras vivas comuns, i. e, fronteiras habitadas. O entendimento do Brasil era de que havia duas Américas, distintas não tanto por suas origens étnicas ou mesmo diferença de idiomas, mas, principalmente, pela geografia, com as implicações geopolíticas, e esse foi o parâmetro pelo qual se orientou a política exterior do Brasil, que no curso do século XIX se absteve de qualquer envolvimento na América do Norte, Central e Caribe, enquanto resguardava a América do Sul como sua esfera de influência.

George Hegel, nas aulas sobre a filosofia da história mundial, ditadas na década de 1820, salientou o contraste entre a América do Sul, onde o catolicismo predominava, e a América do Norte, uma terra de seitas, protestante, onde o comércio constituía o principal princípio, um princípio muito simples, ainda que não fosse tão firme como na Inglaterra[12]. E, ao dizer que a América era a terra do futuro, previu uma “contenda entre a do Norte e a América do Sul, em que a importância da História Universal deveria manifestar-se”. [13] Não explicitou que tipo de contenda. Mas, na sua exposição, o México figurava como um país à parte, tanto da América do Norte, entendida como os Estados Unidos, e a América do Sul, que compreendia o Brasil e os países de língua espanhola.  Também o escritor francês Michel Chevalier na introdução ao livro Lettres sur l’Amérique du Nord[14], publicado em 1837, fez uma observação semelhante à de Hegel, ao comparar a América do Sul com a Europa meridional, católica e latina, e a América do Norte, que pertencia a una população protestante e anglo-saxônica. Tudo indica, porém, que o conceito de América Latina, integrando o México e demais países da América Central, foi usado pela primeira vez pelo intelectual e político chileno Francisco Bilbao Barquín (1823-1865), em  conferência pronunciada em Paris em 24 de junho de 1856.


Alguns meses depois, em 2 de setembro do mesmo ano, o escritor e diplomata colombiano José María Torres Caicedo (1830-1889), em  um poema intitulado “Las dos Américas”, referiu-se a “la raza de la América Latina, al frente tiene la sajona raza, enemiga mortal que ya amenaza su libertad destruir y su pendón”, e acrescentou que “la América del Sur está llamada a defender la libertad genuina, la nueva idea, la moral divina, la santa ley de amor y caridad”, pois “el mundo yace entre tinieblas hondas:— en Europa domina el despotismo de América en el Norte, el egoismo, sed de oro e hipócrita piedad”. Posteriormente, em 1861, Torres Caicedo lançou as “Bases para la formación de una Liga Latinoamericana”. E, no mesmo ano, em artigo publicado pela Revue des Races Latines, L. M. Tisserand denominou como l’Amérique Latine o que até então se conhecia, na Europa, como Nouveau Monde ou Amérique du Sud ou républiques hispanoaméricaines.  O abade Emmanuel Domenech (1825-1903), autor de Journal d’un Missionnaire au Texas et au Mexique 1846-1852, consolidou o conceito de América Latina, como “le Mexique, l’Amérique Centrale et l’Amérique du Sud”.

O conceito de América Latina, desenvolvido para demonstrar as diferenças, contrastes e mesmo antagonismos com a América do Norte, tal como Chevalier e Tisserand expressaram e difundiram, passou a integrar o pan-latinismo, ideal que encapava as pretensões imperialistas da França, sob o reinado de Louis Bonaparte, Napoleão III, e foi manipulado para legitimar a intervenção da França no México (janeiro de 1862 – março de 1867), onde fora entronizado o arquiduque Ferdinand Maximilian, irmão do imperador da Áustria. O propósito de Napoleão III era construir um Império Latino, em oposição à Grã-Bretanha, e necessitava estabelecer um elo de identidade com a Ibero-América a fim de legitimar sua pretensão.  Mas aí o conceito de América Latina, integrando o pan-latinismo conforme difundiram Chevalier, então conselheiro de Estado de Napoleão III, e Tisserand, já se distanciava da formulação de  Torres Caicedo, que lhe dera um caráter defensivo frente à expansão dos Estados Unidos, e de Francisco Bilbao, em cuja obra La América en Peligro, de 1862, não somente denunciou o despotismo europeu e sua política de expansão como proclamou a necessidade de defender o México contra a França.

A América do Sul na política exterior do Brasil

Como salientou o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em sua obra “Quinhentos anos de periferia”, a América do Sul é a “circunstância inevitável, histórica e geográfica do Estado e da sociedade brasileira”.[15] William H. Seward, secretário de Estado do presidente Abraham Lincoln, convidou o Brasil para intervir no México, juntamente com os Estados Unidos. Dentro América do Sul, porém, o interesse fundamental do Brasil, desde os tempos da colonização, cingiu-se, particularmente, aos países da Bacia do Prata – Argentina, Uruguai, Paraguai e, de certo modo, Bolívia, e o que amplificou ainda mais a importância geopolítica  da região, primeiro para Portugal, durante a colonização, e depois para o Brasil, foi o fato de que o abastecimento de Mato Grosso, Goiás e parte de S. Paulo dependia, quase que totalmente, da navegação fluvial.[16] O bloqueio da livre navegação através dos rios da Bacia do Prata configurava casus belli para o governo imperial.

Com as repúblicas do Pacífico, separadas por florestas e pela cordilheira dos Andes, as relações do Brasil nunca adquiriram maior peso e densidade, até a primeira metade do século XX. O interesse primordial do Brasil consistiu em buscar solução para as questões de limites e de navegação fluvial, através do Amazonas,[17] e daí as missões de Duarte da Ponte Ribeiro (1851), Miguel Maria Lisboa (1853), João da Costa Rego Monteiro, Felipe Lopes Neto , Joaquim Maria Nascentes de Azambuja (1866-1867)[18], enviadas às repúblicas do Pacífico (Peru, Equador, Colômbia e Venezuela). A doutrina do uti possidetis serviu de base para a demarcação das fronteiras, com a prevalência da idéia da nacionalidade, que conferiu à política brasileira coerência, racionalidade e continuidade, como Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Buenos salientaram[19]. E o que o Brasil tratou de assegurar foi sua soberania sobre a Amazônia, antes de abrir o rio à navegação internacional, e evitar que as repúblicas do Pacífico fossem induzidas pelos Estados Unidos a atacá-lo ao norte, aproveitando seu envolvimento na guerra contra o Paraguai (1864-1870).[20]

José Maria da Silva Paranhos, Barão do Rio Branco, quando ocupou o cargo de ministro das Relações Exteriores (1903-1912), buscou consolidar as fronteiras do Brasil, com todos os seus vizinhos, e sua política exterior pautou-se por diretrizes similares às do tempo da monarquia (1822-1889), ao considerar o continente uma espécie de condomínio, em que o Brasil exerceria livremente sua influência sobre a América do Sul, enquanto as Américas do Norte e Central, bem como o Caribe teriam nos Estados Unidos seu centro de gravitação. Por esta razão, embora o imperador D. Pedro II não aprovasse, pessoalmente, a iniciativa de Napoleão III,[21] ocupando o México, seu governo não aceitou o convite, alegando que não tinha maior interesse na questão. [22] Essa atitude do governo de D. Pedro II deveu-se ao fato de que o Brasil considerava o México fora de sua esfera de preocupação e nunca aspirou a ter qualquer interferência nos países daquela região, considerada como pertencente à órbita dos de influência dos Estados Unidos.

Ao tempo da república, quando, em 1903, Panamá se separou da Colômbia, com o apoio dos Estados Unidos, Rio Branco, não obstante lamentar o acontecimento, não protestou, e somente reconheceu a nova república de acordo com a Argentina e o Chile, a fim de manter a unidade dos três países, com os quais pretendia estabelecer um acordo diplomático, conhecido como ABC (Argentina, Brasil e Chile).  Em 1908, porém, ele reagiu energicamente contra a atitude dos Estados Unidos, que estava a favorecer o Peru no litígio sobre os territórios de Purus e Juruá, afirmando o “direito nosso (brasileiro) de atuar politicamente nesta parte sem ter que pedir licença ou dar explicações” ao governo americano, que, segundo suas palavras, não devia se envolver “para ajudar nossos desafetos, nas questões em que estamos empenhados”[23]. E um ano depois, 1909, ameaçou romper as relações com os Estados Unidos, se o presidente William Howard Taft executasse o ultimatum dado ao Chile para pagar dentro de dez dias o montante de US$ 1 milhão, reclamado pela empresa norte-americana Alsop & Co.[24] Entretanto, em 1910, Rio Branco não atendeu a um apelo da Nicarágua para que a ajudasse a impedir que um barco de guerra americano continuasse a apoiar uma revolução que surgia naquele país[25]. Não tinha interesse na questão. E somente, unido à Argentina e ao Chile, configurando o bloco conhecido como ABC, atuou como mediador para evitar uma guerra entre o México e os Estados Unidos, cujos soldados haviam ocupado a cidade portuária de Vera Cruz, a pretexto de capturar um carregamento de armas alemãs, transportado pelo navio Ypiranga, da Companhia Hamburg-Süd.[26] Em 1927, no entanto, o diplomata Ronald de Carvalho, em “Relatório Reservado sobra a Política Exterior do Brasil e a dos Países da América do Sul”, organizado por ordem do então chanceler Octavio Mangabeira, deixou bem clara a pretensão do Brasil, ao assinalar, após definir vários objetivos a cumprir, que “voltaremos a ocupar, em virtude do crescimento natural de nossa população e do desenvolvimento das nossas riquezas, o lugar que nos cabe na América do Sul”, ou, sem outras palavras, a preeminência que tivera durante o século XIX.[27]

Oswaldo Aranha, quando embaixador do Brasil em Washington, tomou em 1935 atitude semelhante à do Barão do Rio Branco, em face da intromissão dos Estados Unidos nos assuntos dos países com os países vizinhos.  Advertiu o Secretário de Estado, Summer Welles, de que “nada explicava o nosso (brasileiro) apoio aos Estados Unidos em suas questões na América Central, sem atitude recíproca de apoio ao Brasil na América do Sul”[28].  E, posteriormente, na condição de ministro das Relações Exteriores do presidente Getúlio Vargas (1930-1945), assinou, com Enrique Ruiz-Guiñazú, chanceler da Argentina, o Tratado de 21 de novembro de 1941, cujo objetivo era “estabelecer, de forma progressiva, um regime de intercâmbio livre, que permitisse chegar a uma união aduaneira /…/, aberta à adesão dos países limítrofes”, i. e., aberta à adesão dos países da América do Sul. A Argentina configurava-se cada vez mais importante parceiro comercial do Brasil, escoadouro natural para seus produtos agrícolas e manufaturas. E o presidente Getúlio Vargas, durante a Conferência do Rio de Janeiro, após a qual rompeu as relações com os países do Eixo, não quis constrangê-la ou que o Brasil dela se afastasse, porquanto considerava a amizade entre os dois países “parte integrante de um programa de governo” . [29]

O Tratado de 1941, para estabelecimento da união aduaneira, não se efetivou devido ao ataque do Japão à base americana de Pearl Harbor, em 7 de dezembro de 1941, envolvendo diretamente o hemisfério na Segunda Guerra Mundial, após a qual começou a ganhar força o conceito de América Latina, que as organizações multilaterais passaram a utilizar, após a Segunda Guerra Mundial, para designar a região, ou seja, todos os países abaixo do Rio Grande.  Entretanto, mesmo quando o Brasil se referia à América Latina, o que estava subjacente era a idéia de América do Sul, da qual assumiu abertamente a liderança, quando o presidente Juscelino Kubitschek lançou, em 1958, a Operação Pan-americana, visando a reformular os termos do relacionamento com os Estados Unidos. “Verifico que no Brasil – e creio que nos demais  países do continente – amadureceu a consciência de que não convém mais formarmos um mero conjunto coral, uma retaguarda incaracterística, um simples fundo de quadro” – declarou Kubitschek.[30] Naquelas condições, o continente significava, sobretudo, o continente sul-americano. E o formidável impulso que tomara o processo de industrialização do Brasil, em conseqüência da implantação do parque siderúrgico de Volta Redonda, foi que adensou e robusteceu sua pretensão de assumir sua liderança vis-à-vis dos Estados Unidos. Seu papel revestiu-se da maior importância, na primeira metade dos anos 60, ao defender os princípios de não-intervenção e auto-determinação dos povos, concorrendo decisivamente para impedir que os Estados Unidos conseguissem o apoio da Organização dos Estados Americano (OEA) ao seu propósito de intervir militarmente em Cuba e derrocar o regime instituído por Fidel Castro. Tratava-se de uma questão fora de sua órbita, a América do Sul, mas envolvia a OEA e, conseqüentemente, todo o hemisfério. Em 1965, porém, o Brasil rompeu sua tradição de não intervir diretamente em questões da América Central e do Caribe, atendeu à solicitação de Washington e enviou um contingente militar, na condição de força interamericana de paz, para coadjuvar na ocupação da República Dominicana, após a invasão ordenada pelo presidente Lyndon Johnson.

O Brasil e os países da região amazônica

Com a intensificação do seu desenvolvimento industrial, o Brasil voltou-se mais e mais para os países da região amazônica, ou seja, para a Bolívia, Peru, Equador, Venezuela, Colômbia, Suriname e Guiana, cuja massa demográfica, no conjunto, representava por volta da primeira metade dos anos 80 do século XX um mercado da ordem de 87 milhões de habitantes, o equivalente a 61% da população brasileira, espalhando-se até o Oceano Pacífico e o Caribe. Era necessário abrir mercados para as suas manufaturas e o comércio da região amazônica com as repúblicas do Pacífico saltou de US$ 173 milhões, em 1972, para US$ 2,3 bilhões em 1982.[31] E seu fomento, visando a integração e unificação da América do Sul, requeria o desenvolvimento dessa imensa  região, a Amazônia, que separava os mercados às margens do Pacífico e do Caribe dos centros industriais do Brasil, situados no litoral do Atlântico. O desenvolvimento da Amazônia dependia, entretanto, da cooperação com os países vizinhos, porquanto sete das dez fronteiras internacionais do Brasil localizavam-se quase integralmente naquela região, somando 12.114 km, o que representava cerca de 80% do total de sua fronteira terrestre. Assim, com o propósito de incrementar o desenvolvimento trans-fronteiriço, o Itamaraty, durante o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979) empreendeu as negociações, a cargo do embaixador Rubens Ricupero, para a celebração, em 3 de julho de 1978, do Tratado de Cooperação Amazônica. O que inspirou a negociação desse Tratado, com características similares ao Tratado da Bacia do Prata, foi possibilitar sua ocupação de forma racional e evitar que potências estranhas à região se introduzissem na Amazônia, sob qualquer pretexto. Essa preocupação levou o presidente João Batista Figueiredo a evitar que os Estados Unidos, em 1981, interviessem no Suriname, conforme o presidente Ronald Reagan pretendera, para depor o governo de Desiré Delano (Desi) Bouterse, sob a alegação de que ele estava a acercar-se  politicamente de Cuba.[32] Assumiu a tarefa de resolver o problema. E conseguiu-o.

Mercosul versus ALCA

A questão Mercosul/ALCA tornou-se destarte o principal ponto das divergências entre o Brasil e os Estados Unidos, por envolver profundas contradições, nas quais interesses econômicos, políticos e estratégicos se entrelaçavam. A ALCA não convinha aos interesses do Brasil, que não se dispunha a permitir, como o fez a Argentina, que seu parque industrial se desmantelasse,  se transformasse em sucata, sob nova e devastadora redução de tarifas, nem a  suportar crescentes saldos negativos na balança comercial. O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que fora um dos encarregados das negociações dos acordos de integração Brasil-Argentina, em 1986/1987, quando ainda era  o conselheiro e chefe da Divisão Econômica do Itamarati, denunciou a ALCA como parte da estratégia de manutenção da hegemonia política e econômica dos Estados Unidos, “que realizariam seu desígnio histórico de incorporação subordinada da América Latina a seu território econômico e a sua área de influência político-militar”[33], e  insistiu em que o governo brasileiro devia abandonar os acordos para sua implementação. “A ALCA levará ao desaparecimento do Mercosul” – advertiu[34].

Grande parte do empresariado brasileiro também receava as  conseqüências da ALCA, cuja implementação acarretaria sérios riscos  para a indústria nacional. E o  presidente Fernando Henrique Cardoso, em meio das crescentes dificuldades geradas, dentro do Mercosul, pela desvalorização, em 1999, da moeda brasileira, o real, reavivou o conceito de América do Sul, que o projeto da ALCSA consubstanciava e fora eclipsado durante seu primeiro mandato (1995-1999).  A ampliação do comércio com os países da América do Sul implicava, porém, uma série de projetos e o presidente Fernando Henrique Cardoso convocou uma reunião de cúpula dos chefes de Estados da América do Sul, realizada em Brasília, durante os dias 31 de agosto e 1° de setembro de 2000, com o objetivo de discutir a integração regional, notadamente as interconexões energética e viária. O plano teria financiamento do BID e da CAF (Corporación Andina de Fomento) e México mostrou-se contrariado por não ter sido convidado, imaginando que se tratava de manobra com  intenção de isolá-lo. Fernando Henrique Cardoso mandou fazer ver ao governo mexicano que o plano de interconexões não poderia chegar à América do Norte, não havia como, de modo que por esse motivo a presença do México não havia sido considerada. Para dirimir quaisquer dúvidas nesse sentido, convidou para a reunião o Ministro das Relações Exteriores do México, Jorge G. Castañeda, na qualidade de observador. Mas, evidentemente, a desculpa era apenas meia-verdade, pois não podia explicar os objetivos políticos implícitos na convocatória da cúpula Brasília.

Estes objetivos se evidenciaram em artigo publicado na imprensa, na qual Fernando Henrique Cardoso, antes da reunião, definiu o acontecimento como de “reafirmação da identidade própria da América do Sul como região”, onde a democracia e a paz abriam a perspectiva da integração cada vez mais intensa entre países que mantinham uma relação de vizinhança”.[35] E ressaltou:

“A vocação da América do Sul é a de ser um espaço econômico integrado, um mercado ampliado pela redução ou eliminação das dificuldades e obstáculos ao comércio, e pelo aperfeiçoamento das conexões físicas em transportes e comunicações” .[36]

Não se tratava, portanto, de América Latina, mas da América do Sul, uma região geograficamente definida, reconhecida pelos presidentes, no Comunicado Conjunto, como  uma região com características específicas que a distinguiam no cenário internacional e que as suas peculiaridades e a contigüidade geográficas criavam uma agenda comum de desafios e oportunidades. Sua coesão constituía, também, elemento essencial a uma inserção mais favorável na economia mundial, de forma que pudesse converter a globalização em meio eficaz para ampliar as oportunidades de crescimento e desenvolvimento da região e melhorar de forma sustentada e eqüitativa os seus padrões de bem-estar social, enfrentando os efeitos desiguais  gerados para diferentes grupos de países, vis-à-vis sobretudo da América do Norte.

A Cúpula de Brasília teve um caráter estratégico e  avançou a possibilidade de integração, não apenas física, econômica e comercial, mas igualmente política, como o presidente Fernando Henrique Cardoso insinuou, ao dizer que era “o momento de reafirmação da identidade própria da América do Sul como região onde a democracia e a paz abrem a perspectiva de uma integração cada vez mais intensa entre países que convivem em um mesmo espaço de vizinhança”. E a afirmação dessa “identidade própria”, diferenciada, por conseguinte, da América do Norte, era o que preocupava Washington, conforme Kissinger exprimiu em sua obra Does America Need a Foreign Policy?[37] Mas a integração política passava necessariamente pela perspectiva de integração do espaço econômico da América do Sul, mediante o entendimento entre “o Mercosul ampliado e a Comunidade Andina (CAN),[38] com a aproximação crescente da Guiana e do Suriname”, conforme o presidente Fernando Henrique Cardoso, apontou, salientando:

“Um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a Comunidade Andina será a espinha dorsal da América do Sul como espaço econômico ampliado. Deve, portanto, ser visto como um objetivo político prioritário”. [39]

Por proposta do Brasil, reconheceu-se a necessidade de implementação da integração da América do Sul, a partir da formação de uma Área de Livre Comércio Sul-Americana (ALCSA), iniciada em 1993, ao tempo do governo do presidente Itamar Franco, que tinha como chanceler o embaixador Celso Amorim. E a proposta de integração regional não se limitou aos aspectos comerciais. Houve acordo sobre a necessidade de desenvolvimento de uma Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional da América do Sul (IIRSA), que modernizasse as relações e potencializasse a proximidade sul-americana, rompendo os obstáculos fronteiriços e formando um espaço ampliado através de obras e articulações nas áreas de transportes, energia e comunicações.

O objetivo político prioritário, na proposta de integração do espaço econômico da América do Sul, evidenciou-se ainda mais quando Fernando Henrique Cardoso declarou que o “Mercosul é mais  que um mercado, o Mercosul é, para o Brasil, um destino” – disse o presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2001, acrescentando que a ALCA era “uma opção”, à qual poderia aderir ou não. [40] E esta sua frase, exprimindo a continuidade essencial da política exterior do Brasil, repercutiu nos Estados Unidos [41], o que levou Henry Kissinger a constatar  que o Mercosul tendia a apresentar as mesmas tendências manifestadas na União Européia, que buscava definir uma identidade política européia não apenas distinta dos Estados Unidos, mas em manifesta oposição aos Estados Unidos[42]. “Especialmente no Brasil, há lideres atraídos  pela perspectiva de uma América Latina  politicamente unificada confrontando os Estados Unidos e o NAFTA” – Kissinger ressaltou[43]. Segundo observou, enquanto a  ALCA era concebida como simples área de livre comércio, o Mercosul era uma união aduaneira, trans-fronteiriça, que teria, por sua natureza, tarifas mais elevadas para o mundo (tarifa externa comum) que entre os estados associados, pretendendo evoluir para um mercado comum, e isto não convinha, porque, provavelmente, afirmaria a identidade latino-americana (sic) como separada e, se necessário, oposta aos Estados Unidos e à NAFTA. “(…) Tudo isso tem criado um potencial  debate entre Brasil e os Estados Unidos sobre o futuro do Cone Sul” – Kissinger reconheceu[44]. Com efeito, a diplomacia brasileira tornou a integração da América do Sul, a afirmação de sua identidade própria, a condição prévia para qualquer esforço de integração hemisférica, tal como o que os Estados Unidos estavam a propor, com o projeto da ALCA.[45]

Conflitos na América do Sul

O Brasil estava a exercer de fato a liderança da América do Sul, aceita consensualmente pelos demais governos da região, dado seu enorme peso econômico, político e estratégico, sem pretensões de hegemonia, respeitando as particularidades de cada povo. E a Segunda Reunião de Presidentes da América do Sul realizou-se em Guayaquil, Equador, entre 26 e 27 de julho de 2002, quando foi aprovado o “Consenso de Guayaquil sobre Integração, Segurança e Infra-Estrutura para o Desenvolvimento”, manifestando o propósito de construir “um futuro de convivência fecunda e pacífica, de permanente cooperação” e declarando “a América do Sul como Zona de Paz e Cooperação”. A  turbulência social, política e militar nos países andinos dificultava, no entanto, a consecução de tal objetivo e preocupava o Brasil. Em 26 de janeiro de 1995, o conflito armado entre tropas do Equador e do Peru, na fronteira litigiosa em torno do rio Cenepa, perturbara a paz da região. O presidente Fernando Henrique Cardoso atuou no sentido de obter o cessar-fogo, levando os dois países, depois de esporádicos combates, a firmarem um acordo, em Brasília, sob os auspícios dos quatro Estados garantes do Protocolo do Rio de Janeiro, de 1942 – Argentina, Brasil, Chile e Estados Unidos. O Brasil exerceu a liderança no processo de Paz entre o Equador e o Peru e o Exército brasileiro, na Missão de Observadores Militares Equador-Peru (MOMEP), fiscalizou  na região do rio Cenepa, fronteira entre os dois países, o cumprimento do acordo.

O Brasil também interveio, diplomaticamente, para evitar que a crise política, no Paraguai, em abril de 1996, resultasse em um golpe militar, depois que parlamentares, vinculados ao general Lino Oviedo, votaram contra o projeto de lei para construir  uma segunda ponte entre o Paraguai e o Brasil, o que impediu as empresas do presidente Juan Carlos Wasmosy de obterem a concessão das obras. Wasmosy decidiu então passá-lo para a reserva e Oviedo[46], rebelado, entrincheirou-se em sua unidade, ameaçando derramar sangue se a medida não fosse revogada. A crise somente não culminou com a quebra da legalidade constitucional, devido à interferência dos embaixadores do Mercosul (Argentina, Brasil e Uruguai), dos Estados Unidos e do próprio secretário executivo da OEA, César Gaviria, que negociaram um acordo, mediante ameaças de boicote e isolamento econômico e político do Paraguai, bem como do congelamento de sua participação no Mercosul e outras sanções punitivas: Oviedo não foi preso e apresentou voluntariamente o pedido de passar para a reserva.

De qualquer maneira, o Brasil não estava disposto a permitir um golpe de estado no Paraguai e contaria com o respaldo da Argentina e do Uruguai, dado que a ruptura da democracia política seria intolerável dentro do Mercosul, bem como em termos do Grupo do Rio e da nova concertação no hemisfério. O compromisso com a democracia, ou seja, a chamada “cláusula democrática” do Mercosul, estava implícito no Tratado de Assunção, tanto que Brasil e Argentina, desde a Declaração de Iguaçu, em novembro de 1985,  nunca cessaram de reiterar a adesão aos princípios democráticos, como fundamento da cooperação e da integração, não apenas em termos bilaterais, mas também com respeito aos demais países da América do Sul. O Foro de Consulta e Concertação Política do Mercosul (FCCP) deu grande ênfase à implementação da chamada “cláusula democrática”, o que levou à adoção do Protocolo de Ushuaia pelos países do Mercosul e Bolívia e Chile. A preservação da democracia no Paraguai continuou, porém, a constituir a grande preocupação do Brasil. Pouco depois de contornada a crise, Fernando Henrique Cardoso, em junho de 1996, visitou Assunção, com a intenção de reiterar o respaldo à ordem constitucional, e no mesmo ano os presidentes dos quatro países integrantes do Mercosul assinaram uma declaração, assumindo o compromisso de consultarem-se e aplicarem medidas punitivas, dentro do espaço normativo do bloco, em caso de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática em algum estado membro.

A débil democracia instalada no Paraguai, após a queda da ditadura do general Alfredo Stroessner, em 1989, continuou, porém, sob a ameaça de colapso, ao intensificar-se a luta pelo poder dentro do próprio Partido Colorado, que ainda controlava mais de 80% do aparelho do Estado. Condenado a 10 anos de prisão, por chefiar a rebelião militar de 1996, o general Lino Oviedo não pôde concorrer à sucessão do presidente Juan Carlos Wasmosy, mas Raúl Cubas, que o substituiu como candidato do Partido Colorado, venceu a eleição, com o slogan “Cubas no governo e Oviedo no poder”, e concedeu-lhe indulto, cinco dias depois de assumir o governo, em agosto de 1998. O assassinato de Luís Carlos Argaña, o principal adversário do presidente Raúl Cubas, que se opusera à libertação de Oviedo, desencadeou a grave crise política, em meio de choques de rua, e mais uma vez os chefes de governo do Brasil e da Argentina tiveram de intervir, ameaçando isolar o Paraguai econômica e politicamente e afastá-lo do Mercosul, de conformidade com a cláusula democrática do Tratado de Assunção caso um golpe de estado se consumasse. Essa advertência Raúl Cubas ouviu diretamente de Fernando Henrique Cardoso, que o aconselhou a renunciar à presidência, antes de que a crise se agravasse e produzisse a ruptura da legalidade, e percebeu que não tinha condições de resistir, dado que o Brasil absorvia cerca 30% das exportações dos produtos paraguaios, como algodão e soja, e essa dependência chegava a atingir 70%, considerando o total estimado de suas reexportações. Assim, em  28 de março de 1999, véspera da decisão do Senado sobre o impeachment, Cubas Grau renunciou à presidência do Paraguai e asilou-se no Brasil, após Oviedo partir para a Argentina, onde o presidente Carlos Ménem lhe deu refúgio. Entretanto, outro intento de golpe ocorreu, na madrugada de 18 para 19 de maio de 2000, quando integrantes do Primeiro Corpo do Exército, tendo como epicentro a Primeira Divisão de Cavalaria, e de Polícia  Nacional, promoveram a Operación Aratirí (raio no idioma guarani), questionando a legitimidade do presidente Luís González Macchi e invocando o direito constitucional à rebelião. Os insurgentes, após ocupar as instalações de alguns meios de comunicação, pretenderam dirigir-se para o Congresso, porém a Marinha e a Força Aérea declararam-se leais ao governo e sufocaram o levante, sem encontrar resistência.

A guerra civil na Colômbia constituía outro foco de instabilidade, a preocupar o Brasil, devido, sobretudo, à possibilidade de uma intervenção militar, efetuada ou articulada pelos Estados Unidos. O Plano Colômbia, lançado pelo presidente Bill Clinton um dia antes da Reunião dos Presidentes da América do Sul, em Brasília, preocupou o governo brasileiro, uma vez que equacionava o conflito exclusivamente em sua dimensão armada, destinando mais de US$ 1,2 bilhão – cerca de 80% dos US$ 1,3 bilhão prometidos pelos EUA – à compra de material bélico, inclusive aviões, 30 helicópteros tipo Black Hawk e 33 tipo Huey[47], pelo Exército colombiano, e apenas US$ 238 milhões à promoção dos direitos humanos e ao reforço da democracia e do sistema judicial. Ele fora concebido como uma estratégia de guerra, e tudo indicava que os Estados Unidos repetiriam a tática usada em Kosovo, bombardeando intensamente as regiões dominadas pelas Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) e o Ejército de Libertación Nacional (ELN), juntamente com a aspersão de agentes biológicos sobre os cultivos de coca, dado que uma intervenção por terra nas províncias de Caquetá, Putumayo, na Amazônia colombiana, custaria muitas perdas de vida.

O Brasil temeu o impacto que a execução do Plano Colômbia produziria sobre seu território, levando guerrilheiros ou militares colombianos a invadi-lo, e receou que fungos (Fusarium orysporum) ou outras armas químicas e biológicas, eventualmente empregadas pelos Estados Unidos, para destruir as plantações de coca, contaminassem os rios da Amazônia. No seu entendimento, não se podia vincular a necessidade de combater o negócio das drogas com  o problema da insurgência, que era da competência interna da Colômbia e devia ser politicamente resolvido, embora esta posição não significasse simpatia por qualquer solução tendente a ceder às FARC e ao ELN as zonas conquistadas, por implicar uma renúncia do estado colombiano à soberania sobre seu território. Entretanto, o governo brasileiro considerava que a via militar, como os Estados Unidos  propunham, não resolveria a crise e recusou-se terminantemente a permitir a utilização de qualquer base ou outras instalações militares em seu território para operações na Colômbia.

A partir do final dos anos 90, as relações do Brasil com a Venezuela, onde Hugo Chávez ascendera ao governo, tenderam a estreitar-se cada vez mais. Na Cúpula das América, em Quebec entre 20 e 22 de abril, Hugo Chávez alinhou-se com Fernando Henrique Cardoso, nas críticas à ALCA, e compareceu à reunião da Cúpula do Mercosul, realizada em Assunção, em 21 e 22 de junho, quando formalizou o pedido para o ingresso da Venezuela no Mercosul e, referindo que Fernando Henrique Cardoso dissera que a “ALCA es opción y nuestro destino es el Mercosur”, endossou que “este es nuestro destino, el sur, la Cruz del Sur”[48]. Nos primeiros anos da década de 2000, a situação agravou-se, no entanto, em quase todos os países da América do Sul. O processo de paz fracassou na Colômbia, onde os  Estados Unidos aprofundaram sua intervenção na luta contra as FARC, não propriamente para combater o narcotráfico, mas, sobretudo, a fim de garantir o fluxo do petróleo, que saía de lá e do Equador. E, em dezembro de 2001, a Argentina entrou em colapso financeiro, bancarrota, em meio de dramática convulsão social e crise política tão profunda que levou Fernando Henrique Cardoso a advertir o presidente George W. Bush sobre o perigo de uma ruptura institucional, caso o governo de Eduardo Duhalde não recebesse ajuda internacional. Também no Equador a situação configurou-se instável e os indígenas, em fevereiro de 2002, anunciaram que realizariam novas manifestações de massa, em Quito, contra as privatizações promovidas pelo governo de Gustavo Noboa com o fito de protestar contra o não cumprimento do acordo que pôs fim ao levante, no início de 2001[49].

A Venezuela, com a qual o Brasil tratava de estreitar seu relacionamento, começou a enfrentar crescentes dificuldades políticas, fomentadas pela CIA, DIA e outros agências dos Estados Unidos. De 11 para 12 de abril de 2002, na Venezuela. três generais prenderam o presidente Hugo Chávez, levaram-no para o Forte Tiuna, e o general Lucas Rincón Romero, chefe do Estado Maior do Exército da Venezuela, anunciou sua renúncia à presidência da República. Pedro Carmona Estanca, presidente da Fedecámaras, assumiu o governo da Venezuela, com o apoio dos meios de comunicação e o respaldo não tanto encoberto da administração do presidente americano George W. Bush[50], que se dispunha a reconhecê-lo. E a fim de facilitar essa decisão, dado que a Carta Democrática Interamericana condenava qualquer ruptura da legalidade, Phillip Chicola, funcionário do Departamento de Estado, pediu, no dia 12, que a transição conservasse as formas constitucionais, ou seja, que a Assembléia Nacional e a Corte Suprema aprovassem a renúncia de Chávez[51] e novas eleições, com observadores da OEA, fossem convocadas para dentro de um prazo razoável. A manobra, no entanto, fracassou.  Enquanto as camadas mais pobres da população, favoráveis a Chávez, ocupavam as ruas de Caracas, saqueando as lojas, espraiando-se a agitação pelas cidades de Guarenas, Los Teques, Coro e Maracay, a brigada de pára-quedistas, comandada pelo general Raúl Baudel, bem como outros regimentos sublevaram-se contra a presidência de facto de Pedro Carmona.

Se não tinha condições internas de sustentar-se, apenas respaldado pelas classes médias e altas, o governo da coalizão empresarial-militar, emanado do golpe de 11/12 de abril, defrontou-se outrossim com enormes dificuldades externas para o seu reconhecimento. O Grupo do Rio, que realizava em Costa Rica a XVI Cimeira presidencial, reprovou prontamente a ruptura da ordem constitucional na Venezuela e solicitou ao embaixador César Gaviria, secretário-geral da OEA a convocação urgente do Conselho Permanente, de acordo com o Art. 20 da Carta Democrática Interamericana[52], aprovada na sessão plenária de 11 de setembro de 2001, incorporando a resolução AG/RES. 1080 (XXI-O/91)[53]. A questão fora levantada primeiramente pelo Brasil e os embaixadores na OEA aprovaram uma resolução, em que condenaram “a alteração da ordem constitucional na Venezuela”. Somente em face da atitude de todos os demais estados da região, inclusive México e Canadá, de repudiar o golpe contra o governo de Hugo Chávez, a delegação dos EUA resignou-se a subscrever a moção da OEA. Mas só o fez no sábado, 13 de abril, quando as manifestações de massa haviam compelido Carmona a renunciar e Chávez retornou ao poder[54].
nião de Nações Sul-Americanas

A crise na Venezuela não cessou. E o Brasil teve uma atuação ainda mais decisiva, visando a assegurar a estabilidade na Venezuela, em dezembro de 2002, quando o governo de Fernando Henrique Cardoso, com o endosso do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, decidiu vender ao governo do presidente Hugo Chávez  um navio petroleiro com 82 milhões de litros de combustível para enfrentar o desabastecimento provocado pela greve dos trabalhadores da Petróleo de Venezuela SA (PdVSA) e evitar a sua desestabilização. Apesar das críticas, por parte da oposição na Venezuela, à qual a iniciativa do Brasil desagradara, o governo de Lula, logo que inaugurado, tentou intermediar uma solução pacífica para a crise e enviou a Caracas o professor Marco Aurélio Garcia, assessor de Assuntos Internacionais do Presidente. O Brasil tinha investimentos na Venezuela, interesses econômicos, políticos e estratégicos, e não podia permitir a desestabilização do governo de Chávez, que fora eleito duas vezes e obtivera 60% dos votos, conforme o presidente Lula salientou. E daí porque propôs a formação de um grupo dos amigos da Venezuela (não só de Chávez) com a participação dos Estados Unidos e da Espanha, coordenado pelo secretário-geral da OEA, César Gaviria, com a finalidade de intermediar uma solução pacífica, legal e constitucional para o impasse que perdurava havia vários meses.

O presidente Lula, desde o início do seu mandato, demonstrou que sua política exterior trataria de robustecer a parceria estratégica com a Venezuela e aprofundar os vínculos com a Argentina, seu principal sócio no Mercosul, e que a integração da América do Sul era sua prioridade número um. Ele compreendeu que a base econômica e não exclusivamente política deveria lastrear a liderança do Brasil na América do Sul e que ela exigia o aumento das trocas comerciais, no contexto de um comércio regional mais equilibrado. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sob a direção do professor Carlos Lessa, desempenhou importante papel no adensamento dessa política. Foi aberta uma linha de crédito para  financiar a venda ao mercado brasileiro de máquinas, componentes e peças fabricadas no Mercosul, em especial na Argentina, ao mesmo tempo em que se previa dar tratamento semelhante aos do produto nacional nos financiamentos da Finame bens de capital fabricados na Argentina, Uruguai e Paraguai. O BNDES também aprovou um crédito de US$ 200 milhões para a ampliação de um gasoduto na Argentina, com a construção e montagem da tubulação, em um trecho de 508,85 quilômetros, expandindo a capacidade de transporte de gás natural da Companhia de Investimentos de Energia (Ciesa), ligada à filial da Petrobrás (Petrobrás Energia S/A, ex-Perez Companc), através dos gasodutos General San Martín e Neuba II, e ampliando a oferta de gás natural e eletricidade na região da Grande Buenos Aires.

Igualmente com a Venezuela, considerada um dos pilares da integração da América do Sul, o Brasil tratou de aprofundar a parceria principalmente na área energética. A Petrobrás e a PdVSA assinaram 15 acordo que incluíam, entre outros projetos, a exploração de gás e extração de petróleo pesado, pela indústria brasileira, na região do rio Orinoco, e a construção de uma nova refinaria no Brasil, com investimento previsto de cerca de US$ 2 bilhões, com capacidade para produção diária entre 150.000 e 220.000. A entrada de Petrobrás na exploração de gás na Venezuela rompeu o monopólio virtualmente exercido pelas empresas dos Estados Unidos e da Europa e a Companhia  Vale do Rio Doce projetou constituir com a venezuelana Corpozulia uma empresa binacional, para a exploração das reservas de carvão natural de Socuy, na Venezuela. Durante sua visita a Caracas, Lula firmou com Chávez vinte acordos de cooperação e investimentos, que incluíam a venda de 20 aviões militares, modelo Tucano, e créditos para a construção do metrô da cidade, bem como na área de defesa e vigilância da Amazônia, onde se previu a possibilidade de realização de exercícios  conjuntos dos exércitos do Brasil e da Venezuela. “A solução para a economia da Venezuela, do Brasil e de outros países da América do Sul não está no Norte, além do oceano, mas na nossa integração” – disse Lula. Esses entendimentos entre Brasília e Caracas causaram, decerto, a inquietação de Washington, que tentava abusivamente isolar o governo de Hugo Chávez, por não subordinar-se aos seus desígnios.

O presidente Lula deu continuidade ao projeto de integração física e energética, elaborado no governo de Fernando Henrique Cardoso, ampliando-o com a participação do BNDES. Porém, explicitou e enfatizou ainda mais  o projeto de formação de uma Comunidade Sul-Americana de Nações, criada na Terceira Reunião dos Presidentes da América do Sul, em 8 de dezembro de 2004, na cidade de Cuzco (Peru), quando foi assinada a Declaração de Cuzco pelos presidentes e representantes[55] dos 12 países da região, i. e., os quatro países do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), os cinco da Comunidade Andina (Venezuela, Colômbia, Peru, Equador e Bolívia), bem como o Chile, Suriname e Guiana.  Na ocasião o presidente Lula anunciou a construção da Rodovia Interoceânica, que o Brasil e o Peru estavam a implementar. Era muito mais do que um projeto bilateral,. Interessa a todos os países da região. E, segundo Lula declarou, mostra que a Comunidade Sul-Americana de Nações, que estavam a  inaugurar, não era mero exercício de retórica, pois exprimia o empenho dos países da região em superar as distâncias que ainda os separavam.

Essa obra, a Rodovia Interoceânica, com 1.100 quilômetros de extensão, ligando o estado do Acre aos portos peruanos de Matarani, Ilo e Maratani, na região de Madre de Díos, no sudeste peruano, visava a possibilitar que o Brasil alcançasse mais facilmente os mercados da Ásia, através do Pacífico, e levar mais de meio milhão de turistas ao sul do Peru, onde  o império inca nasceu e estão as ruínas de Machu Picchu. Ela fora orçada US$ 700 milhões, US$ 417 milhões (60%), financiados pelo Brasil por meio do Proex (Programa de Financiamento às Exportações, administrado pelo Banco do Brasil), e pelo Peru (40%), com o apoio da Corporação Andina de Fomento (CAF). Além da construção da construção da Rodovia Interoceânica foram assinados mais 31 projetos de infra-estrutura para a região, o que significava, em princípio, consolidar a agenda estratégica da integração física e energética que, desde havia alguns anos, estava sendo definida.

O chanceler Celso Amorim, em entrevista à imprensa, ressaltou que a Comunidade Sul-Americana de Nações, baseada inicialmente em uma área de livre comércio e em projetos de infra-estrutura, iria reforçar a capacidade de negociação dos países da região, aumentando seu poder de barganha vis-à-vis dos grandes blocos econômicos, e admitiu a possibilidade de que ela viesse a gerar um processo de integração semelhante ao da União Européia, objetivo estratégico do Brasil. Este projeto, porém, defrontava-se com uma situação bastante complicada em alguns países, como Equador, Bolívia e Peru, onde a turbulência social e política não cessava, além das incertezas no relacionamento entre a Colômbia, instigada pelos Estados Unidos, e a Venezuela, e entre o Chile e a Bolívia, cujo plano de exportar gás por território chileno havia gerado a crise que terminou com a renúncia do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada (17/10/2003) e em face da qual o Brasil decidiu não envolver-se, diretamente, como fizera no caso do golpe na Venezuela.

Essa conexão da Bolívia com o Chile não convinha virtualmente à Petrobrás, que não apenas era a sua maior compradora de gás, incorporando-o à matriz energética do Brasil e aliviando o consumo de petróleo do parque industrial, como também se dedicava à exploração, distribuição e comercialização do petróleo, através de duas subsidiárias – Empresa Boliviana de Refinamiento e Empresa Boliviana de Distribución. Seus investimentos na Bolívia somavam cerca de US$ 2 bilhões, entre 27 multinacionais que lá atuavam, com um peso equivalente a cerca de 10% do PIB boliviano. E o fracasso de Washington na tentativa de impedir a queda de Sánchez de Lozada, seu protegido, permitiu ao Brasil conquistar posição vital na região. Impedida a saída do combustível para o oeste e congelado o projeto de construção do gasoduto, que uniria Tarija ao Chile, as exportações da Bolívia deviam voltar-se para o leste, através de um gasoduto de 3.150 quilômetros, traçado pela Petrobrás desde Santa Cruz de la Sierra, com ramificações até Canoas, no Rio Grande do Sul, e capacidade para transportar 24 milhões de metros cúbicos diários, dos quais cerca de 4 milhões eram importados pela Argentina, onde a Petrobrás comprara a companhia petrolífera Pérez Companc. Quando, porém, a crise voltou a agravar-se, nos primeiros meses de 2005, o governo de Lula, temendo que o presidente Carlos Mesa fosse deposto e ocorresse uma quebra institucional, buscou intermediar o conflito entre o governo e Evo Morales, líder do Movimiento al Socialismo, ao mesmo tempo em que defendia os interesses da Petrobrás.

A vitória de Tabaré Vázquez, no Uruguai, em 2004 tendeu a fortalecer a iniciativa para a consolidação da Comunidade Sul-Americana de Nações. Os acordos no setor energético, que os governos sul-americanos estavam a celebrar, cumpriam uma função estratégica para o projeto de fortalecimento da integração econômica e política no continente. Era previsto um acordo energético com a Venezuela que permitirá ao Uruguai receber petróleo a um preço mais barato, em parte pago através de uma linha especial de crédito e o restante, com o fornecimento de carnes, lãs e laticínios. O acordo de cooperação energética, firmado a 2 de março de 2005, em Montevidéu, onde a PdVSA  programava a abertura de um escritório, tinha como objetivo fundamental fortalecer os mecanismos de solidariedade, complementaridade e cooperação para dar respostas aos problemas de ambas as nações, e se inseria no esforço de criação da Comunidade Sul-Americana de Nações. Além dos acordos com o Brasil e o Uruguai, a Venezuela já firmou convênios com empresas petrolíferas do Paraguai e da Argentina. dando seqüência ao projeto da Venezuela de estabelecer acordos estratégicos com os países do Mercosul, e o presidente Chávez excogitava encorajar a formação de uma empresa petrolífera dos Estados sul-americanos, a Petrosur.

Era de incertezas e conflitos

A Venezuela, a partir do final do governo de Fernando Henrique Cardoso, passou a ocupar relevante papel na política exterior do Brasil, não apenas servindo de contrapeso para a Argentina como também conformando com ela o triângulo estratégico, no processo de integração da América do Sul, o estabelecimento de uma unidade econômica e política entre os países da região, condição necessária e indispensável a uma inserção equilibrada no cenário internacional. Entretanto, assim como a Alemanha e a França constituíram a força propulsora da União Européia, o Brasil e a Argentina, desde os primórdios, configuraram os pilares básicos do Mercosul, o núcleo da Comunidade Sul-Americana de Nações em construção. E a perspectiva era de que a Argentina executasse uma política externa coerente, constante, uma política externa de Estado, sem oscilar conforme os humores conjunturais, e funcionasse como fator de aglutinação dos países hispano-sulamericanos, o que ela teria condições de fazer, mas somente respaldada e coligada com o Brasil, o que significava unificar a América do Sul.

O Brasil estava a exercer a liderança em uma era de incertezas, em uma região marcada por crescente instabilidade econômica e política e tensões militares, devido em larga medida à presença dos Estados Unidos, particularmente na Colômbia, Equador e Bolívia. O Brasil não admitia que o Estado colombiano se desintegrasse, com as FARC a controlar 40% do seu território, mas se recusava a confundir o combate ao narcotráfico com a repressão da insurgência, e via com desconfiança a presença dos Estados Unidos nas repúblicas do Pacífico, na região da Amazônia. Daí porque procurou evitar que degenerasse em conflito militar o incidente diplomático entre a Colômbia e Venezuela, por causa da violação de sua soberania com a captura ilegal, possivelmente com o auxílio da CIA, de um dirigente das FARC em Caracas. A política do Brasil vis-à-vis da Colômbia manteve a mesma diretriz, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, consubstanciada no apoio ao processo de paz, que em verdade nunca avançou, desde a presidência de Andrés Pastrana (1998-2001), defesa da soberania nacional e repúdio à intervenção estrangeira nas questões internas do país.

Outrossim o Brasil continuou a condenar o embargo a que Cuba fora submetida pelos Estados Unidos, desde 1960, em meio de pressões e ameaças contra o regime de Fidel Castro. O presidente Lula, no entanto, visitou Havana, em 2003, onde assinou 12 acordos de cooperação, inclusive para a exploração de Petróleo pela Petrobrás, e rejeitou as pressões internacionais para que intercedesse pela liberdade de presos políticos em Cuba. “Não é boa política um chefe de Estado se meter em assuntos internos de outro país. Vou tratar dos interesses do Brasil. Não vou dar palpite em política interna de outro país”, afirmou Lula no México.[56] Posteriormente, ele apelou para que Castro entendesse que o “Brasil pode ajudar a construir o processo democrático em Cuba”, e reiterou a condenação do embargo imposto há mais de 40 anos pelos Estados Unidos, dizendo: “Temos muito a fazer pela democracia em Cuba. Temos que ajudar na luta contra o embargo (econômico imposto pelos norte-americanos há quatro décadas). O Brasil tem uma chance de ajudar a dar normalidade nas relações de Cuba.”[57] A questão do regime político em Cuba era o que mais dificultava sua aproximação, conforme desejada por Fidel Castro, devido à “cláusula democrática”.

Embora contrariasse a tradicional política exterior de não envolver-se militarmente em questões no Caribe e na América Central, tradição esta quebrada apenas quando o presidente, general Humberto Castelo Branco, também enviou tropa para Santo Domingo, em 1965, o governo de Lula decidiu despachar um contingente de 1.100 soldados para o Haiti, também como força internacional de paz (integrada por americanos, franceses, canadenses e dos países do Caribe), de acordo com resolução do Conselho de Segurança da ONU, com a missão de estabilizar o país após a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristides, com o velado suporte dos Estados Unidos, segundo tudo indicou. Essa iniciativa controvertida provocou fortes reações internas, da esquerda do PT, da CUT e MST, por ferir o princípio de não-intervenção nos assuntos internos de outros países, consolidado pela Constituição brasileira.  Segundo os críticos, o fato de o Haiti haver sofrido um golpe de Estado, apoiado pelos Estados Unidos, tornava qualquer tropa estrangeira no Haiti uma força de ocupação e não parte de uma missão de paz da ONU.

Indagado sobre a razão de tal iniciativa, o chanceler Celso Amorim explicou que o Haiti era um país latino, com as mesmas raízes culturais do Brasil e não lhe interessava vê-lo tornar-se um narco-Estado. O que o Brasil procurou, no entanto, foi dar uma demonstração de que se dispunha a exercer um proeminente papel internacional, pelo menos no âmbito do hemisfério, e a vigorar sua posição de candidato a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU. Esta questão, a pretendida vaga no Conselho de Segurança da ONU, era que alimentava um clima de desconfiança e fricções entre o Brasil e a Argentina, reacendendo uma rivalidade residual que não fazia qualquer sentido. Em primeiro lugar, não havia qualquer possibilidade imediata de uma reforma da ONU, apesar de que fosse necessária, pois os cinco membros permanentes, principalmente os Estados Unidos não se dispunham certamente a dar o mesmo poder de veto a outros países. Em segundo lugar, avaliando o peso específico, tanto econômico quanto político e estratégico, se a América Latina viesse a ter dois representantes no Conselho de Segurança da ONU, um seria, forçosamente, o Brasil, dado o seu status de potência regional que continuava a insistir na obtenção de uma vaga (prometida aliás pelo presidente Franklin D. Roosevelt ao presidente Getúlio Vargas, devido à sua participação na Segunda Guerra Mundial), com o objetivo de denunciar o congelamento do poder mundial, sua estratificação, favorecendo apenas cinco potências, que detinham capacidade nuclear.

A política exterior do México era conflitante com a do Brasil, país com o qual não mantinha um tratado de livre comércio. O México aceitara a subordinação aos Estados Unidos e estava a concorrer para a desarticulação política dos países do Terceiro Mundo nas negociações econômicas multilaterais e regionais, e, reforçando as pressões internas neoliberais, tratou de atraí-los para a órbita dos Estados Unidos, temendo o  isolamento do resto da América Latina. As negociações sobre livre comércio ou acordos preferenciais bilaterais com alguns países latino-americanos – como Colômbia e Venezuela, para formar o então G-3 – e o amplo acordo México-Uruguai, sem resultados comerciais mas que criou sérias dificuldades para o Mercosul, foram parte de uma estratégia para preservar as preferências comerciais que o México usufruía na ALADI, e amortecer as reações à mudança radical na política externa mexicana e até para abrir caminho para as futuras negociações da ALCA.[58] O exemplo do México possibilitou que outros governos latino-americanos aceitassem a proposta dos Estados Unidos para negociar a criação da ALCA. No entanto, como o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães salientou, “a posição geográfica especial do México e o acesso (legal ou ilegal) de sua população ao mercado de trabalho dos Estados Unidos, com as conseqüentes remessas de dinheiro dos imigrantes, não são válidas para outros países latino-americanos”.[59] O mesmo se podia dizer com respeito aos demais países da América Central e do Caribe, todos dependentes dos Estados Unidos, particularmente das remessas de dólares, feitas pelos seus nacionais que para lá emigraram. Em tais circunstâncias, não fazia o menor sentido pensar na unidade de uma América Latina, separada não apenas pelo Canal do Panamá, mas dividida efetivamente por interesses e vínculos econômicos e fatores geopolíticos conflitantes..

O que ao Brasil convinha, assim como à Argentina, era conduzir, de maneira realista, a consolidação do Mercosul e a formação da Comunidade Sul-Americana de Nações como um sistema econômico e político unificado, dentro de um sistema mundial, fortemente competitivo e violento, em que os Estados Unidos tratavam de concentrar e congelar o poder mundial. O processo de globalização  sempre significou o crescente domínio das mega-corporações americanas, o esforço de modelar um novo tipo de Império, com a transformação dos exércitos dos países neo-colonizados em forças de polícia, para defender os interesses do capital financeiro e a dolarização de suas economias. Não obstante, o sistema mundial tendia a evoluir para a multipolaridade, apesar da preeminência conjuntural dos Estados Unidos. E nem o Brasil nem a Argentina deviam considerar essa preeminência como definitiva e aceitar o destino de províncias avançadas do grande Império. A previsão do banco Goldman Sachs era a de que, por volta do ano 2025, as economias do grupo conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China, juntas, representariam mais de metade da economia do G6, formado por Estados Unidos, Japão, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Itália, tendendo a suplantá-la até o ano 2050. [60]

O Brasil, ao encorajar, na reunião de Cuzco, o lançamento da União Sul-Americana de Nações, depois denominada União de Nações  Sul-americanas (UNASUL), teve um objetivo estratégico, visando a tornar não propriamente a si próprio, mas o conjunto dos países do sub-continente, uma potência mundial, não só econômica, como também política.  Sua dimensão ultrapassava, de longe, o caráter meramente comercial. O Brasil não abdicara do projeto de tornar-se potência mundial, porém, compreendera que a consecução de tal objetivo passava pela sua integração com a Argentina e, em uma segunda etapa, com todos os demais países da América do Sul. A união da Argentina e do Brasil não significava uma soma de dois países, mas uma multiplicação de fatores, como certa vez o presidente Arturo Frondizi (1958-1962) ressaltou.[61] E a união dos demais países da América do Sul com o Brasil e a Argentina, em uma comunidade econômica e política, conformaria uma grande potência, como enorme peso no cenário mundial.

Tornava-se necessário, portanto, criar um quadro institucional, um organismo mais amplo, para abarcar e agregar todas as nações da América do Sul que não participam plenamente del Mercosul, com o objetivo de promover a realização de vários projetos de integração, não só econômica e comercial, mas também de comunicação, infra-estrutura, transporte, energética, educacional, cultural, científica e tecnológica. A celebração do Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-americanas (UNASUL) foi um fato de grande  significação histórica. A UNASUL passou a ter uma personalidade jurídica, com a forma de uma organização internacional, com um Conselho de Chefes de Estado e de Governo, um Conselho de Ministros de Relações Exteriores e um Conselho de Delegados. Constitui um avanço no sentido da coordenação de políticas. E dentro desse marco institucional deve concretizar-se o projeto do Banco do Sul e do gasoduto desde Venezuela, passando pelo Brasil, até a Argentina. Dificuldades, divergências, contradições há e sempre haverá, em virtude da enorme assimetria que existe entre os países da América do Sul, principalmente entre o Brasil e seus vizinhos. Não há, porém, qualquer perspectiva para os países pequenos se não se unirem e formarem um amplo espaço econômico comum, de modo a alcançarem melhor inserção nacional.

O Brasil constituiu, por si só, um enorme espaço econômico, não obstante a assimetria existente entre os 26 Estados que o compõem. Adquire um peso internacional maior. Maior, porém, seria o peso da América do Sul integrada. Composta por doze Estados, dentro de um espaço contíguo, possuía, em 2007, uma população total de 360 milhões de habitantes, cerca de 67% de toda a América Latina e o equivalente a 6% da população mundial (6.706.993.152 – 2008 est.), com integração lingüística, pois imensa maioria falava português ou espanhol, e detinha uma das maiores reservas de água doce e biodiversidade do planeta, além de imensas riquezas em recursos minerais, pesca e agricultura. E não apenas sua população era maior que a dos Estados Unidos (303.027.571, est. 2008). Seu território, cerca de 17 milhões de quilômetros quadrados, era o dobro do território americano, com 9.631.418 quilômetros quadrados. Em tais circunstâncias, a União de Nações Sul-Americanas, uma vez politicamente unificada, com um PIB da ordem US$ 3,5 trilhões (para o qual o Brasil concorria com US$ 1,849 trilhão (est. 007)[62], pode representar extraordinária força econômica e política, como demonstrada em 2008 na crise desencadeada pela tentativa separatista de Santa Cruz de la Sierra e demais departamentos da Media Luna da Bolívia. Evidenciou-se assim sua capacidade de influenciar e obter importantes resultados no sistema internacional, em que prevalecerão os grandes blocos, constituídos pelos Estados Unidos, União Européia, Rússia, China e Índia.

Também publicado em http://www.espacoacademico.com.br/091/91bandeira.htm

Titulo original: O Brasil como potência regional e a importância estratégica da América do Sul na sua política exterior

* Texto para o seminário sobre “A política exterior do Brasil em sua própria visão e na dos parceiros”. Consulado-Geral do Brasil em Munique, 7 de novembro de 2008.


* Luiz Alberto Moniz Bandeira é cientista político, professor titular de história da política exterior do Brasil, na Universidade de Brasília (aposentado) e autor de mais de 20 obras, entre as quais Formação do Império Americano (Da guerra contra a Espanha à guerra no Iraque), pela qual recebeu o Troféu Juca Pato, eleito pela União Brasileira de Escritores (UBE) Intelectual do Ano 2005.

[1] GRAMSCI, Antonio – Maquiavel, a Política e o Estado Moderno, 2a. ed., Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1976, p. 191.


[2] DEUTSCH, Karl W. –  “On the Concepts of Politics and Power”, in Farrel, John C. & Smith, Asa P. (editors) – Theory and Reality in International Relations, New York – London, Columbia University Press, 1967, p. 52-54.

[3] http://www2.petrobras.com.br/Petrobras/

[4] Ibid.

[5]
https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/uk.html

[6] KISSINGER, Henry. Does America Need a Foreign Policy. Toward a Diplomacy for 21st Century. Nova York: Simon and Schuster, 2001, pp. 159-160.

[7] “Brazil saw itself organizing Latin America while the United States performed the same task in the North America, the two enterprises to work in harmony through frequent exchanges aimed at articulating a common set of purposes.”
Id., ibid., p. 159

[8] Id., ibid., p. 159.

[9] “Exposição aos estagiários da Escola Superior de Guerra”. Washington, 22.06.1974; “Exposição aos estagiários da Escola Superior de Guerra”. Washington, 17.06.1975,  in Araújo Castro, J. A. – Araújo Castro (Coletânea de Discursos). Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1982, pp. 283-284 e 315-316..

[10] “Exposição aos estagiários da Escola Superior de Guerra”. Washington, 22.06.1974; “Exposição aos estagiários da Escola Superior de Guerra”. Washington, 17.06.1975,  in Araújo Castro, 1982, pp. 283-284 e 315-316.

[11] Despacho nº 17, M. Maillefer a Drouyn de Lhuys, Montevidéu, 05.03.1854, in Revista Histórica nº 51, 449.

[12] “Amerika ist somit das Land der Zukunft, in welchem sich in vor uns liegenden Zeiten, etwa im Streite von Nord- und Südamerika, die weltgeschichtliche Wichtigkeit offenbaren soll”.
Hegel, Band I, 1994, p.208.

[13] Id. Ibid., p.208.

[14] Chevalier, Michel. Lettres sur l’Amérique du Nord.
Librairie de Charles Gosselin et Cie, 1837. 2 vol.

[15] PINHEIRO GUIMARÃES, Samuel. Quinhentos anos de periferia. Rio de Janeiro-Porto Alegre: Editora Contraponto – Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1ª. edição, 1999, p. 146.

[16] Moniz Bandeira, 3ª. Edição, 1998, pp. 21-87.

[17] Teixeira Soares, 1972, p. 213. Santos, 2002, pp. 75-86, 99-109.

[18] Vide Teixeira Soares, 1971, pp. 17-21.

[19] Cervo  & Bueno, 2ª edição, 2002, pp. 87-107

[20] Teixeira Soares, 1971, pp. 17-21.

[21] Dom Pedro II, 1956, p. 62.

[22] Ofício de Miguel Maria Lisboa a Benevenuto Augusto de Magalhães Taques, Washington, 20/10/1961. Taques a Lisboa, 07/11/1861. Missões Diplomáticas Brasileiras.  Legações Imperiais na Europa. Arquivo Histórico do Itamaraty 233/3/11 e 235/2/1.

[23] Telegrama de Rio Branco a Joaquim Nabuco, Embajador de Brasil em Washington. 10.11.1908. Ibid.

[24] Entrevista do Embaixador José Joaquim de Lima e Silva Moniz de Aragão, que foi secretário particular do Barão do Rio Branco. Rio de Janeiro, 1971.

[25] Telegrama de Rio Branco a la Embajada de Brasil en Washington, 16.6.1910. Telegramas expedidos – AHI – 235/4/1.

[26] Vide Moniz Bandeira, Luiz Alberto. Brasil, Argentina e Estados Unidos: conflito e integração na América do Sul. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1993.

[27] Relatório Reservado sobre a Política Exterior do Brasil e dos países da América do Sul. Organizado por ordem de Sua Excia. o senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores pelo 1° official da Secretaria de Estados, Ronald de Carvalho (Do Gabinete do Ministro). Rio de Janeiro, 1927. Arquivo do Autor.

[28] Carta de Oswaldo Aranha a Getúlio Vargas, Washington, 9.4.1935. AGV – doc.18, vol. 18.

[29] Vargas, 1995, p. 454.

[30] Discurso, in Correio da Manhã, 22/06/1958, última página. Vide Moniz Bandeira, 2ª. Edição, 1978, pp. 382-382

[31] Ricupero, janeiro/março, 1984, Senado Federal, p. 63.

[32] Moniz Bandeira, 2003, 2ª. Edição, p. 458. Moniz Bandeira, 2004, pp. 164-165.

[33] Entrevista do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães a Valor Econômico, 2.2.2001.

[34] Ibid.

[35] Cardoso, Fernando Henrique – “O Brasil e uma nova América do Sul”, Valor Econômico, 30 de agosto de 2000.


[36] Ibid.

[37] Kissinger, Henry. Does America Needs a Foreign Policy? New York: Simon & Schuster, 2001, p. 152 - 163.

[38] Em abril de 1998, os quatro estados do Mercosul celebraram os estados da Comunidade Andina de Nações (CAN) um acordo-quadro que previa a criação de uma zona de livre comércio entre os dois blocos a partir de janeiro de 2000. O intercâmbio com o CAN, no ano 2000, alcançou um montante da ordem de US$ 5,5 milhões, 29% maior do que em 1999, sendo os fluxos de comércio mais importantes os registrados entre Brasil e Venezuela e Brasil e Colômbia[38]. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Brasília.

[39] Cardoso, Fernando Henrique  – “O Brasil e uma nova América do Sul”, Valor Econômico, 30 de agosto de 2000.

[40] Discurso do Presidente Fernando Henrique Cardoso, na Reunido de Cúpula do MERCOSUR, na ocasião do da Reunião do Conselho do Mercado Comum, Assunção, 22 de junho de 2001.


[41] Rohter, Larry – “South American Trade Bloc Called Mercosur Under Siege”, in The New York Times, New York, 24.3.2001.

[42] Kissinger, Henry. Does America Needs a Foreign Policy? New York: Simon & Schuster, 2001, p. 152 – 163.

[43] Id., ibid., p. 152.

[44] Id., ibid., p. 163.

[45] Cervo, Amado Luiz & Bueno, Clodoaldo.
História da Política Exterior do Brasil. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais-Editora da Universidade de Brasília, 2002, pp. 486-487.

[46] O general Lino César Oviedo Silva fez rápida carreira no Exército, desde a queda de Stroessener em 1989. Naquela época, era simples coronel e foi ajudante do general Andrés Rodríguez, comandante do Primeiro Corpo do Exército. Em 1992, converteu-se em chefe da campanha da candidatura de Juan Carlos Wasmosy e influiu para que ele derrotasse Luiz Maria Argaña. Certa vez declarou: “Fuerzas Armadas y Partido Colorado cogobernaremos siempre, chille quien chille, llore quien llore, moleste a quien moleste”. E em 1993 começou sua carreira política.

[47] A United Technologies produzia o poderoso helicóptero UH-60L Black Hawk, o Falcão Negro, e a Bell Textron procurava vender helicóptero UH-1H Huey. Ambas corporações investiram nas campanhas eleitorais dos EUA. Constava que, nas campanhas de 1996 e 1998, a Bell Textron deu uma contribuição de US$ 551,816 ao Partido Republicano e US$ 364,420 ao Partido Democrata; a United Technologies contribuiu com US$ 362,340 para o Partido Republicano e US$ 347,200 dólares para o Partido Democrata.

[48] La Nación, Buenos Aires, 22.6.2001.

[49] El Universal, Caracas, 08.0, 2002.

[50] Wayne Madsen, antigo agente do  serviço de inteligência da marinha norte-americana, revelou ao jornal inglês The Guardian que, desde junho de 2001, os EUA estavam a considerar a possibilidade de derrubar Chávez, e seus navios, estacionados no Caribe, entre 11 e 12 de abril, não apenas intervieram nas comunicações das embaixadas de Cuba, Líbia, Irã e Iraque, como permaneceram em estado de alerta, com o objetivo de evacuar os cidadãos americanos,  se necessário.
Campbell, Duncan – “American navy ‘helped Venezuelan coup’”, The Guardian, Londres, 29.04.2002. O presidente Hugo Chávez revelou a uma comitiva de deputados brasileiros, chefiada pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP), presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, que o governo venezuelano tem registros da presença de oficiais do exercito americano no Forte Tiúna no dia do golpe. ”Ele tem tudo anotado, a que horas os adidos militares americanos saíram dos quartéis e a que horas chegaram ao forte”, disse o deputado Aldo Rebelo. “Chávez volta a acusar EUA” , Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 01.05.2002.

[51] Na mesma sexta-feira, 12 de abril, os advogados do Departamento de Estado,  estudando a constituição da Venezuela, notaram que a renúncia do presidente da República não era válida  até que fosse aceita pela Assembléia Nacional, que tinha o poder de instalar um novo chefe de governo.

[52] O Art. 20 da Carta Democrática Interamericana dispõe que, “caso num Estado membro ocorra uma alteração da ordem constitucional que afete gravemente sua ordem democrática, qualquer Estado membro ou o Secretário-Geral poderá solicitar a convocação imediata do Conselho Permanente para realizar uma avaliação coletiva da situação e adotar as decisões que julgar conveniente”.


[53] Consejo Permanente de la Organización de los Estados Americanos, Acta de la Sesión Extraordinaria celebrada el 21 de Enero de 2000. A OEA, mediante a resolução AG/RES. 1080 (XXI-O/91), estabelecera um mecanismo para ajudar a restabelecer a democracia representativa onde ela sofresse uma interrupção.  Essa resolução foi aprovada na quinta sessão plenária da OEA, ocorrida em 5 de junho de 1991.

[54] Marquis, Christopher – “U.S. Cautioned Leader of Plot Against Chávez” , The New York Times, 17.04.2002

[55] Os presidentes, Néstor Kirchner, da Argentina; Lucio Gutiérrez Equador; Nicanor Duarte, Paraguai; e Jorge Batlle, do Uruguai, não participaram da reunião por diversos motivos, mas deixaram claro seu apoio à decisão.

[56] Fraga, Plínio. “Não vou palpitar na política de Cuba, diz Lula. Folha de São Paulo, 26/09/2003

[57] Gielow, Igor Lula diz que ajudará Cuba a ter democracia. Folha de S. Paulo, 09/04/2005

[58] Guimarães, Samuel Pinheiro. “O papel político internacional do Mercosul”.
12 de julho de 2004.

[59] Ibid.

[60] The Goldman Sachs Group, Inc – Global Economics Paper No. 99: Dreaming with BRICs: The Path to 2050

[61] Entrevista ao Autor, Buenos Aires, 1975.


[62] De acordo com o método da paridade do poder de compra.
https://www.alainet.org/pt/active/40362
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