Código Florestal: Dilma não vetou tudo, mas deu troco nos ruralistas

17/10/2012
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Porto Alegre - O objetivo de mais de 200 organizações da sociedade brasileira era que a presidenta Dilma Roussef vetasse toda a proposta de Código Florestal aprovada pelo Congresso Nacional, com amplo apoio das bancadas do norte e do centro-oeste, onde se concentra a maior produção de soja e algodão do país. Foram nove vetos já publicados no Diário Oficial da União, com a intenção básica, segundo a Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira de “não anistiar, não estimular desmatamentos ilegais e assegurar a justiça social, a inclusão social no campo, em torno dos direitos dos pequenos agricultores”.

Na verdade esse é o segundo tempo dos vetos presidenciais. A bancada ruralista depois dos primeiros 32 e mais as mudanças regulamentadas pelo governo na Medida Provisória resolveu peitar Dilma Roussef e fazer um novo arranjo do Código, com mais de 400 emendas. A essência dos vetos que atingiram o artigo 83 na íntegra e cortes parciais nos artigos 4º, 15º, 35º, 51º, 61º-A e 61º-B é o retorno à proposta inicial de recompor as margens de rios menores de 10 metros, mesmo que não sejam permanentes. Também eliminou a possibilidade de recompor a área de preservação permanente com espécies exóticas, como eucalipto ou pinus, ou frutíferas, como laranja e maçã.

O veto do artigo 61º-B, por exemplo, proibiu a possibilidade do proprietário com área superior a 10 módulos – um módulo tem menos de 10 hectares, dependendo de cada estado a definição exata – reflorestar apenas 25% da área total. Um tratamento diferenciado para quem tem mais terra. Aliás, dos quase 5,6 milhões de estabelecimentos rurais cadastrados no INCRA, 90% tem até quatro módulos fiscais. A grande maioria, cerca de 3,6 milhões tem apenas um módulo fiscal.

O novo Código também cria um Programa de Regularização Ambiental (PRA), que o interessado em recompor suas áreas de preservação permanente ou de reserva legal deverá se cadastrar, usando como referenciamento imagens de satélite da propriedade e terá um prazo de um ano para iniciar o replantio. As multas para quem desmatou antes de 2008 estão suspensas por um ano, mas todos tem que se enquadrar no PRA e no Cadastro Ambiental Rural (CRA).

O deputado federal Homero Pereira (PSD-MT), ex-presidente da Associação dos Criadores do Mato Grosso (Acrimat) disse que o “governo deu um golpe e aproveitou as partes do texto que lhe convinha. Esperávamos apenas vetos cirúrgicos, como na questão das árvores frutíferas, mas com os vetos a presidenta desconsiderou o posicionamento tomado por unanimidade pelo Congresso. A bancada ruralista vai dar uma resposta legislativa, jurídica e política ao governo”, disse ele em Brasília.

A argumentação principal da bancada ruralista e da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) é da necessidade de aumentar a área plantada no Brasil, já beira os 40 milhões de hectares sem contar os mais de 200 milhões de hectares de pastagens, com o objetivo de suprir o mercado internacional de alimentos. Seriam necessários mais 6,2 milhões de hectares para atingir um aumento de 30% em 2022. Isso é uma necessidade do agronegócio, principalmente nas regiões de expansão como na Amazônia e nas áreas do chamado Mapitoba, inclui os estados do Maranhão, Piauí, Bahia e Tocantins. Sem esquecer do Mato Grosso e do Pará que continuam liderando os desmatamentos no Brasil.

Dois pesquisadores ligados ao INPE (Instituto de Pesquisas Espaciais) e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, de São Paulo, Antonio Donato Nobre e Ricardo Ribeiro Rodrigues desmancharam a tese dos ruralista de que o país perderia área de produção de alimentos, se precisassem recompor áreas de preservação.

Segundo eles, a superfície que era destinada à proteção de matas ciliares em propriedades privadas, seguindo as estipulações do revogado Código Florestal de 1965 ocupava apenas de 7 a 9% da área total, para proteger todas as nascentes acrescentavam-se ínfimos 0,2%. A área ocupada por terrenos úmidos foi estimada em 17%, duas vezes maior do que a de preservação permanente, onde apenas o arroz irrigado poderia ser plantado. Embora os terrenos úmidos com lençol freático exposto sejam impróprios para a maioria das práticas agrícolas.

O arroz ocupa apenas 1,3 milhão de hectares de uma área de 144 milhões de hectares, isso é menos de 0,5% da área da ocupação agropecuária do país. Mas os arroios, riachos e igarapés dos altos cursos – com menos de 10 metros de largura – representam 86% da extensão dos rios. Era justamente nessa área, fundamental para a maioria dos nove milhões de quilômetros de rios, que os delirantes deputados e senadores da bancada ruralista queriam cortar a mata de proteção. Como se aumentar a área de plantio nas margens dos rios, com consequências desastrosas como erosão, perda de solo, inundações e escassez futura de chuva, incrementaria a produção de alimentos no país e tudo seguiria tranquilamente.

O aviso da bancada ruralista é bem claro: iremos ao STF reivindicar a inconstitucionalidade da lei. Pelo menos o veto presidencial definiu o tamanho de cada um, ou seja, a recomposição é de acordo com a área, o que diferencia milhões de pequenos estabelecimentos da agricultura familiar dos milhões de hectares do agronegócio.
 
 
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