Há um crime no ar nestas eleições. Ocultá-lo é outro crime, muito maior

27/08/2014
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Nem a metade dos negócios sombrios que envolveram a compra do jatinho  que matou Eduardo Campos e mudou o rumo da eleição presidencial já chegou ao  conhecimento público e já há, de sobra, elementos para dizer que houve a formação de uma quadrilha para a aquisição do aparelho, senão por ordem, ao menos em visando beneficiar o  ex-governador de Pernambuco, elevado com a morte a herói da nova e ética  política.
 
Os fatos evidenciam isso e os organizo de forma cartesiana, para o demonstrar.
 
Não se trata de um avião adquirido, tempos atrás, por dois ou três empresários inescrupulosos e aventureiros, que resolveram emprestá-lo a um candidato, de olho em vantagens.
 
O avião foi comprado, inequivocamente, para atender às necessidades de Eduardo Campos em sua campanha, com Marina Silva, à Presidência.
 
Era o mesmo grupo que fornecia, até o dia 15 de maio, na pré-campanha, o transporte aéreo para o senhor Eduardo Campos: o avião Learjet 45/40, matrícula PP-ASV, da Bandeirantes Pneus, o que está provado, inclusive, por fotos do candidato neste aparelho e fica mais evidente quando se rastreia seu uso.
 
Os mesmos empresários foram em busca de outro jato executivo, maior e mais confortável, com a finalidade específica de servi-lo na fase mais intensa da campanha. Se o fizeram por ordem de Campos, é impossível afirmar, a menos que um deles ou outra pessoa próxima o confesse.
 
Mas, mesmo que se admita que o fizeram por iniciativa própria, é certo que Eduardo Campos aprovou a aquisição pessoalmente, num vôo experimental, candidamente confessado pelo ex-co-piloto do aparelho, Fabiano de Camargo Peixoto, em entrevista à Folha, no dia seguinte ao acidente.
 
Não foi um “presente” da do ao candidato, como quem dá uma caneta bonita. Foi um ato partilhado entre todos, com um objeto que a ele e sua candidatura , acima de tudo, seria importantíssimo.
 
Há uma vantagem pessoal claramente estabelecida na transação e foi para obtê-la que se praticaram os atos fraudulentos.
 
Sim, fraudulentos.
 
Porque agora sabe-se que – além dos antecedentes de pelo menos dois dos compradores, o processado por contrabando Apolo Vieira e o operador de factoring e usineiro João Lyra Pessoa de Mello, já condenado e multado por não registrar operações de câmbio – a compra está povoada de laranjas e fantasmas, como mostrou a reportagem do Jornal Nacional com base nos procedimentos da Polícia Federal, que infelizmente só são acessíveis, como sempre, à Globo.
 
Os valores não são “uma bobagem”, uma tapioca: só na “entrada” da transação foram mais de R$ 1,7 milhão.
 
Há, na compra e no uso do avião fatal, materialidade e autoria já bem delineada de crime.
 
Mas não há, incompreensivelmente, nenhuma ação pública do Ministério Público, tão ativo no Brasil e – lembram da aprovação da PEC 39? – absolutamente autônomo para investigar e geralmente ansioso por opinar até sobre o vôo dos pássaros.
 
Não se pode confundir respeito aos mortos com encobrimento de crimes, cumplicidades e responsabilidades, inclusive as político-eleitorais, até porque disto se aproveitam os vivos, muito vivos.
 
Porque este encobrimento significa a negação do mais fundamental direito da sociedade: o direito à verdade.
 
Mais grave ainda quando a sonegação desta verdade por comprometer decisões que o povo brasileiro irá tomar.
 
- Fernando Brito é jornalista.
 
28/ago/2014
 
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