Governo libera transgênicos
10/04/2005
- Opinión
Sanção presidencial abre a possibilidade de produtos serem liberados sem estudos de impacto ambiental
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, dia 24 de março, a Lei de Biossegurança, possibilitando a liberação de produtos transgênicos sem a necessidade de estudo prévio de impacto ambiental. Com a decisão, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) passa a ser o único órgão responsável pela avaliação e liberação de organismos geneticamente modificados (OGMs) no Brasil.
Segundo Rubens Nodari, gerente de projeto da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), essa lei representa a retirada da competência tradicional do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), da Agênica Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Ministério da Agricultura para tratar das questões relativas a transgênicos.
A engenheira agrônoma Angela Cordeiro acredita que a decisão representa um retrocesso em relação à legislação, pois passa por cima da Constituição, da política nacional de meio ambiente e de decisões anteriores que dizem que o MMA deve pedir estudo de impacto ambiental nesse tipo de caso. “Antigamente, a CTNBio tinha um caráter técnico consultivo e os órgãos responsáveis tinham o direito de pedir estudos para garantir que os produtos não fizessem mal para a saúde e nem para o meio ambiente. Mas, agora, a CTNBio pode tudo”, analisa Angela.
A agrônoma entende que teremos um problema sério de contaminação genética, pior do que o que ocorreu com a soja, quando se contrabandeou sementes que foram plantadas ilegalmente no Rio Grande do Sul. “A soja é uma planta de auto-fecundação, com problemas de contaminação bem menores do que os do milho, uma planta de fecundação cruzada na qual o vento pode levar os transgênicos para vizinhos que fizeram a opção de plantar sementes tradicionais. A catástrofe é grande”, completa. Para Angela, talvez não consigamos nunca mais limpar nossa agricultura.
Mãe Joana
Para Nodari, a conseqüência disso pode ser um afrouxamento das exigências e menor rigor científico para a liberação comercial de produtos transgênicos. “Com esse respaldo legal, ainda que inconstitucional, esse país vai virar a casa da Mãe Joana. Vamos ser palco de testes para tudo”, prevê Angela.
Segundo Gabriela Couto, da campanha de consumidores do Greenpeace, vetar alguns artigos da Lei de Biossegurança era a última oportunidade que o presidente Lula tinha para garantir a necessidade dos estudos de impacto ambiental e a participação dos seus ministérios no processo de decisão a respeito dos OGMs. “Ele se eximiu dessa responsabilidade. O que o levou a isso? Existe uma posição clara dos partidos da base – inclusive do PT – que, dentro da Câmara e do Senado, sempre apoiaram o projeto de lei sem essas garantias”, analisa Gabriela.
Para Angela, não dá para colocar mais pano quente, dizendo que o presidente está pressionado. “É uma visão de mundo e de desenvolvimento que o governo tem. Não é só pressão porque teríamos amparo jurídico para barrar os transgênicos, como fizemos durante todo o governo Fernando Henrique Cardoso”, lembra. Segundo a engenheira, falta compromisso com a questão sócio-ambiental.
Ruralistas
Para o deputado federal (PT-RS) Adão Pretto, a bancada ruralista tem muita força nos ministérios e foi isso que levou o presidente a sancionar o projeto desta forma. “Esse governo está em disputa. Uma parte puxa para a esquerda e outra para a direita. Nesse caso, nós da esquerda saímos perdendo”, diz Pretto.
Já Nodari, do MMA, lembra que quando o projeto foi enviado ao Congresso (outubro de 2003), Lula fez uma reunião com 13 ministros e nove deles apoiaram a proposta. “Nós sempre defendemos a posição original do governo. Quem mudou de rumo foi a Casa Civil, a Agricultura, a Ciência e Tecnologia e alguns outros ministérios”, conta. Para Nodari, eles não respeitaram a decisão da época.
Dado o conflito existente entre a Lei de Biossegurança e a Constituição, Angela Cordeiro conclui que essa disputa só terá um fim na Justiça. “De um lado, temos as exigências constitucionais de estudo de impacto ambiental. De outro, essa lei diz que não precisa. Vai depender da interpretação do juiz, pois existem brechas dos dois lados”, relata.
Por sua vez, Gabriela, do Greenpeace, revela que vai sair um decreto para regulamentar a forma como a CTNBio será formada. Segundo ela, teoricamente, a composição será refeita e a sociedade civil poderá participar do processo. “Não é porque o presidente foi omisso que a sociedade brasileira vai deixar de ser responsável para lutar contra a presença de transgênicos no nosso dia-a-dia”, cobra Gabriela.
* Luís Brasilino. Brasil de Fato
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