Fórum Social Mundial, a onda de participação social cresce
20/02/2002
- Opinión
Quem diria! A proposta única da globalização pelas grandes corporações
econômico-financeiras através dos mercados - tendo como concepção
legitimadora o neoliberalismo, após duas décadas de hegemonia - vê-se
contestada por poderoso movimento de opinião também global. Revertem-se
as expectativas rapidamente. Em pouquíssimo tempo, a crescente e
desordenada insatisfação social com os rumos da globalização acabou
decantando coalizões e redes com grande capacidade de aglutinação e
mobilização, forjando uma nova onda de aspirações e ideais coletivos, em
confronto direto com a proposta pelo mercado.
O Fórum Social Mundial é parte deste processo. Sua curta trajetória é
reveladora da mudança de expectativas em curso quanto à globalização.
Como Fórum, seu objetivo é exatamente permitir a construção da agenda
global no diálogo entre a diversidade de redes civis, campanhas públicas,
alianças e coalizões que, em suas especificidades e diferenças,
contrapõem-se à globalização dominante. Oportuno para isso foi se
constituir como anti-Davos, contra as idéias e perspectivas que emanam do
Fórum Econômico Mundial. Assim foi em 2001, no I Fórum Social Mundial, em
Porto Alegre, que surpreendeu pela novidade e potencialidades. Agora, de
31 de janeiro a 5 de fevereiro, no II Fórum Social Mundial, novamente em
Porto Alegre, a adesão à idéia e o grande impacto na mídia em termos
mundiais acabam invertendo as coisas. Apesar de existir há apenas dois
anos - quase nada em relação aos 32 do Fórum Econômico Mundial de Davos -
o Fórum Social Mundial parece estar ditando a agenda. Quem precisa ser
contra agora - anti-Porto Alegre - são eles, os de Davos.
Gostemos ou não, o fato é que o Fórum de Porto Alegre virou referência
global para uma emergente perspectiva de que "outro mundo é possível".
Isto é pouco? Certamente não é suficiente. Mas passar a acreditar
coletivamente que não estamos condenados a virar um grande cassino - nas
mãos de grandes corporações econômico-financeiras que mercantilizam a
vida e especulam sobre seres humanos e povos inteiros - desperta enormes
energias criativas. Mais, numa conjuntura reconhecidamente difícil,
recolocamos no centro dos debates mundiais a globalização em si, saindo
da armadilha da lógica do terror e da guerra, a que fundamentalistas
religiosos e mercantis estavam nos levando após o fatídico 11 de setembro
de 2001. Uma contundente resposta à globalização dominante pelo Fórum
Social Mundial foi demonstrar que expressões diversas de cultura são
constitutivas da globalização que queremos, fundada nos princípios éticos
da solidariedade humana, com liberdade e igualdade, na diversidade de
culturas e situações em que vivemos.
Raio-X social
Cobram-se propostas concretas a este movimento contestador da (des)ordem
mundial vigente. A sua primeira e fundamental resposta é construir uma
nova perspectiva, uma nova agenda. Trata-se de negar legitimidade às
prioridades economicistas impostas pela lógica da globalização econômico-
financeiras, fazendo propostas que simplesmente corrijam seus malefícios
sociais. Estamos engajados na construção de uma perspectiva social,
democrática e sustentável, da economia e da globalização que sirva para
promover a liberdade e dignidade humanas. Não ao direito absoluto do
comércio e dos mercados! Estamos diante da necessidade de radicalizar a
perspectiva de todos os direitos humanos a todos os seres humanos, como
fundamental prioridade capaz de dar conta da nova consciência de
humanidade. Romper o divórcio entre economia e sociedade, entre economia
e natureza, entre natureza e sociedade, são tarefas centrais na
construção de uma agenda global promotora da cidadania planetária.
O Fórum Social Mundial, como um dos pilares na construção de uma nova
agenda global, está começando a dar a sua contribuição. A ampla adesão
obtida - mais de 15 mil delegados de mais de 5 mil organizações da
sociedade civil, de mais de 130 países, além dos mais de 35 mil
participantes ouvintes - é reveladora da sua potencialidade. Iniciamos um
amplo mapeamento de questões, análises, propostas e dos sujeitos
coletivos, seus portadores, nos mais diversos domínios da atividade
humana. Estamos reconhecendo quem somos, o que fazemos e como agimos.
Os desafios estratégicos que temos pela frente são de monta. A agenda
global e cidadã que queremos depende da força da diversidade social e
cultural e das múltiplas respostas que dela emanam como contrapropostas
ao pensamento único da globalização dominante. A especificidade do Fórum
Social Mundial reside na capacidade de constituir o espaço necessário de
encontro, diálogo e troca entre redes e movimentos globais, fundado no
respeito e fortalecimento da sua própria diversidade e autonomia. O maior
desafio é a construção das pontes de convergência na diferença. Isso
estamos apenas começando a inventar. Mas só não vê os resultados e
impactos quem decididamente está do outro lado da trincheira ou, pior, é
dos que não crêem na diferença que faz a sua participação cidadã na
definição do rumo que o mundo toma. Estar entre os que acreditam que
outro mundo é possível já é muito gratificante e nos estimula a dar o
melhor para ver a onda crescer.
* Cândido Grzybowski. Sociólogo, diretor do Ibase.
https://www.alainet.org/pt/articulo/105625?language=en
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