A Vitória do Fórum
25/02/2002
- Opinión
As gerações, gêneros, etnias, religiões e nacionalidades que formam a
diversidade e a pluralidade humana mundial, protagonizaram no Rio Grande
do Sul o maior acontecimento político da atualidade, o II Fórum Social
Mundial. Durante este encontro, cerca de 100 mil pessoas ocuparam-se da
construção de alternativas de paz e justiça social, num contraponto ativo
à lógica inaceitável de guerra e exclusão a que está submetida a
humanidade.
O Fórum Social Mundial se firmou definitivamente como referência ética e
pólo político alternativo neste ambiente de "nova guerra fria" e de
"guerra infinita", em que o terror de Estado, o belicismo e a
militarização das relações internacionais substituem o diálogo, a relação
equilibrada entre nações e o respeito mínimo ao direito internacional. A
guerra e o terror, que hoje dinamizam a economia e preservam a supremacia
geopolítica norte-americana, não pertencem ao imaginário ético e
civilizacional da humanidade, que tem na vida - não na morte e na
destruição - a razão de sua existência.
Como bem disse o lingüista norte-americano Noam Chomsky: "Ou temos um
mundo sem guerras, ou simplesmente não teremos um mundo."
Aqueles - me refiro aqui aos apóstolos do fundamentalismo de mercado de
militam no Brasil e no mundo - que há mais de 20 anos difundem conceitos
e teses de um caminho e pensamento únicos e da inevitabilidade da
globalização, tal como a mesma vem se desenrolando, sofreram uma profunda
derrota; não só teórica, mas sobretudo política e moral.
Na realidade, estes fundamentalistas não defendem a globalização, apenas
utilizam-na como recurso retórico para sustentar os interesses
hegemônicos de potências imperialistas e de algumas poucas corporações
multinacionais. Não defendem a globalização, mas tão somente a
preservação de um clube fechado dos "senhores do mundo", a quem é
atribuído o papel de decidir, nada mais nada menos, do que os destinos de
toda a humanidade.
As conseqüências deste modelo são visíveis nos bilhões de famintos,
analfabetos e excluídos do mundo e, de forma ainda mais paradigmática,
seus efeitos podem ser observados na destruição completa de um país, como
é o caso da Argentina.
O Fórum Social Mundial se afigura como portador de um projeto verdadeiro
de globalização solidária e democrática, pois recuperou a noção histórica
do internacionalismo que une e aproxima povos e nações e ao mesmo tempo
apontou a existência de alternativas generosas à visão neoliberal do
mundo. Depois deste segundo Fórum, ficaram mais claros os impasses reais
deste nosso mundo contemporâneo e os diferentes caminhos que a humanidade
poderá escolher.
Enquanto no Encontro Rio+10 propusemos medidas para assegurar a
sustentabilidade ambiental e a qualidade de vida, os EUA recusaram a
assinatura do Protocolo de Kioto e anunciaram um plano alternativo que,
ao invés de reduzir, aumenta as emissões atmosféricas e a destruição
gradual das condições de vida do planeta.
Enquanto na Conferência "Um mundo sem guerras é possível" formulamos
planos de paz para 4 focos de conflitos regionais (Chiapas, País Basco,
Palestina e Colômbia), Bush expandiu sua estratégia de guerra para outras
3 regiões do globo.
Enquanto na Assembléia Pública Mundial do Orçamento Participativo os
participantes do Fórum votaram pela destinação prioritária do dinheiro da
guerra para eliminar a fome, o analfabetismo e o trabalho infantil no
mundo, o governo norte-americano elevou em 36 bilhões de dólares os
créditos de guerra para este ano.
Enquanto o Fórum se manifestou contra o processo de recolonização do
continente caracterizado na formação da ALCA (Área de Livre Comércio das
Américas) e convocou a realização de plebiscito continental, os governos
reafirmaram o calendário de implantação no mais absoluto silêncio e
clandestinidade.
Por fim, enquanto no Fórum Social Mundial, o Tribunal da Dívida propugnou
a anulação das dívidas ilegais e ilegítimas dos países pobres, os
organismos internacionais acentuaram as políticas de endividamento e
ajustes que convertem países e continentes em ruínas.
Um outro mundo é possível e um mundo sem guerras é essencial. Esta é a
nova pauta ? e a nova esperança ? que o Fórum Social Mundial oferece para
toda a humanidade.
* Miguel Rossetto é Vice-Governador do RS.
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