E se o ser humano desaparecer?
10/03/2002
- Opinión
Poderia o ser humano desaparecer por causa de seu poder destrutivo e de
sua falta de sabedoria? Nomes notáveis das ciências não excluem esta
eventualidade. Stephen Hawking em seu recente livro "O universo numa
casca de noz" reconhece que em 2600 a população mundial ficará ombro a
ombro e o consumo de eletricidade deixará a Terra incandescente. Ela
poderá se destruir a si mesma. O prêmio Nobel, Christian de Duve, em seu
conhecido "Poeira Vital" (1997) atesta que "nosso tempo lembra uma
daquelas importantes rupturas na evolução, assinaladas por extinções
maciças". E Thódore Monod, talvez o último grande naturalista, deixou
como testamento um texto de reflexão com esse título: "E se a aventura
humana vier a falhar"(2000). Assevera: "somos capazes de uma conduta
insensata e demente; pode-se a partir de agora temer tudo, tudo mesmo,
inclusive a aniquilação da raça humana".
Se olharmos a crise social mundial e o crescente alarme ecológico esse
cenário de horror não é impensável.
Edward Wilson atesta em seu último e alarmante livro "O futuro da vida":
"O homem até hoje tem desempenhado o papel de assassino planetário…a
ética da conservação, na forma de tabu, totemismo ou ciência, quase
sempre chegou tarde demais; talvez ainda haja tempo para agir".
Lógico, precisamos ter paciência para com o ser humano. Ele não está
pronto ainda. Tem muito a aprender. Em relação ao tempo cósmico possui
menos de um minuto de vida. Mas com ele, a evolução deu um salto, de
inconsciente se fêz consciente. E com a consciência pode decidir que
destino quer para si. Nesta perspectiva, a situação atual representa
antes um desafio que um desastre possível, a travessia para um patamar
mais alto e não um mergulho na auto-destruição.
Mas haverá tempo para tal aprendizado? Na hipótese de que o ser humano
venha a desparecer como espécie, mesmo assim o princípio de
inteligibilidade e de amorização ficaria preservado. Ele está primeiro
no universo e depois nos seres humanos. Emergiria, um dia, em algum ser
mais complexo. T. Monod tem até um candidato já presente na evolução
atual, os cefalópodes, isto é, os moluscos como os polvos e as lulas.
Possuem um aperfeiçoamento anatômico notável, sua cabeça é dotada de
cápsula cartiginosa, funcionando como crânio e possuem olhos como os
vertebrados. Detém ainda um psiquismo altamente desenvolvido, até com
dupla memória, quando nós possuimos apenas uma. Evidentemente, eles não
sairão amanhã do mar e entrarão continente adentro. Precisariam de
milhões de anos de evolução. Mas já possuem a base biológica para um
salto rumo à consciência.
De todas as formas, urge escolher: ou o ser humano e seu futuro ou os
polvos e as lulas. Somos otimistas: vamos criar juizo e aprender a ser
sábios. Mas importa já agora mostrar amor à vida em sua majestática
diversidade, ter com-paixão com todos os que sofrem, realizar rapidamente
a justiça social necessária e amar a Grande Mãe, a Terra. Incentivam-nos
as Escrituras judaico-cristãs: "Escolha a vida e viverás". Andemos
depressa, pois não temos muito tempo a perder.
* Leonardo Boff é teólogo, filósofo e autor de Etica da vida.
https://www.alainet.org/pt/articulo/105754
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