Rio + 10 = Johannesburgo

20/08/2002
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O padrão de desenvolvimento do Brasil é insustentável. A afirmativa não é minha. É do IBGE, contida em seu primeiro relatório de "Indicadores de Desenvolvimento Sustentável", divulgado em junho. O debate sobre o padrão Brasil de desenvolvimento há muito calou-se na esfera política. Ficou restrito a universidades, centros de pesquisa, ONGs e círculos de intelectuais. E ele não é de agora. O "Discurso", de Baltasar da Silva Lisboa, primeiro ensaio ambiental escrito em nosso país, data de 1786. No Índice de Sustentabilidade Ambiental da ONU, entre 142 países o Brasil ocupa o 20º lugar, atrás de Uruguai, Costa Rica, Panamá, Botsuana e Argentina. Os EUA, que se recusam a assinar o Protocolo de Kyoto, por preferir envenenar a atmosfera com 25% de todo o dióxido de carbono emitido no mundo (8 bilhões de toneladas por ano), ocupam o 51º lugar. Quanto ao uso de pastagens, nosso país está entre os sete menos sustentáveis, E é o 24º na exploração florestal madeireira. Nossas florestas estão desaparecendo e isso pouco incomoda o poder público. Em 2000, o Ibama localizou 104 mil focos de queimadas. No ano passado, 145 mil. Arrancam-se as árvores, secam-se os rios, erradica-se a biodiversidade, para abrir espaço à sua majestade, o gado. A abertura de pastos e lavouras já pôs abaixo 14% da floresta amazônica, o equivalente a 16 Dinamarcas. Sem que a população local tenha obtido qualquer retorno em melhoria de suas condições de vida. Um quinto da água potável do planeta concentra-se na Amazônia. E 42% da população mundial não dispõe desse precioso bem. O censo 2000 constatou aumento da população indígena, agora estimada em 750 mil pessoas. Porém, a maior parte de suas terras ainda aguarda demarcação. E os índios engrossam, há tempos, o contingente dos pobres do país, como registrou Muniz de Souza: "Tenho ouvido alguns homens, que pensam filosoficamente, dizer que não há vida igual à dos índios, porque seguem a ordem da natureza. Porém, só enquanto não é interrompida por nós, ou pela nossa ordem social, a qual é toda contraditória com a ordem da natureza que eles seguem. Além disso, ocorre que nós lhes temos tomado grande parte de seus terrenos e matas e, por conseqüência, os temos privado de todos os socorros e comodidades que lhes franqueou a natureza. Por isso vivem em continuada miséria." O texto é de 1834. Dos 13,7 bilhões de hectares que os 6,1 bilhões de habitantes da Terra utilizam para produzir alimentos, água e energia, 2,3 bilhões estão saturados e não são renováveis. O que tende a reduzir a qualidade de vida do mundo até 2030, segundo o relatório Planeta Vivo, do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), divulgado em julho, em Genebra. O WWF denomina "pegadas ecológicas" os estragos que o ser humano imprime à natureza, destruindo os ecossistemas. Nos últimos 20 anos, 54% das espécies aquáticas (de água doce) ficaram ameaçadas de extinção. Das marinhas, 35%. Das florestais (aves, mamíferos e répteis), 15%. A capacidade de "pegada" suportável pela Terra é de 1,9 hectare por pessoa. A média, hoje, é de 2,3 ha, que é o índice brasileiro. Com "pegadas" superior a 6 ha destacam-se os Emirados Árabes Unidos, os EUA e o Canadá. A partir do dia 26 de agosto, ecologistas e autoridades governamentais do mundo todo estarão reunidos em Johannesburgo, na África do Sul, para a conferência da ONU sobre meio ambiente, intitulada Rio + 10, evocando a Eco 92, realizada no Rio de Janeiro. As decisões dos chefes de Estado presentes no Rio ficaram, na maior parte, no papel. Tentou-se um avanço em Kyoto, mas o governo Bush considera que o crescimento econômico de seu país está acima da prioridade de Kyoto: evitar mudanças climáticas bruscas e, sobretudo, o aquecimento do planeta. Para isso, bastaria que as 40 nações mais ricas tomassem providências despoluidoras. Bush, entretanto, prefere dividir com as nações mais pobres a pesada conta do clima. As emissões de dióxido de carbono dos EUA nos próximos 10 anos vão aumentar 12%. O que significa produzir, em 2010, 35% mais gases-estufa do que admite o Protocolo de Kyoto. O dióxido de carbono representa 76% dos gases-estufa. E Kyoto gostaria de vê-lo reduzido, até 2012, em 5,2%. As escolas brasileiras precisam intensificar a educação ambiental, sobretudo a partir do contato com iniciativas concretas que proliferam pelo país; o conhecimento mais aprofundado e menos folclórico da Amazônia; a visita a nações indígenas; e o resgate de figuras heróicas nessa área, como Noel Nutels, Augusto Ruschi e Chico Mendes. * Frei Betto é escritor, autor da novela ecológica "Uala, o amor" (FTD), entre outros livros.
https://www.alainet.org/pt/articulo/106263
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