Raízes da exclusão
08/09/2003
- Opinión
Nesta semana o Celam - que é uma espécie de CNBB para
toda a América Latina, realiza mais um encontro sobre a
Dívida Externa, em Honduras, na América Central. A
questão da dívida continua sendo um tormento para os
países do terceiro mundo. A maioria deles caiu no conto
dos empréstimos fáceis, na década de setenta, e agora
está penando para pagar suas contas, que em vez de
diminuir, vão aumentando.
O endividamento externo continua sendo um fator evidente
de perturbação da economia mundial. A maneira como foi
feito não tem nada de inocente, nem de meramente casual.
Atribuí-lo ao jogo cego do mercado é tentativa de
encobrir as responsabilidades políticas que estão na sua
origem. Para desmascarar esta versão da inexorabilidade
do mercado, nada melhor do que proceder a rigorosas
auditorias, para apurar responsabilidades, que se
encontram não só do lado dos governos ou empresas que
tomaram empréstimos, mas também do lado dos que
astutamente induziram os tomadores a aceitarem os
empréstimos nas condições em que foram feitos.
O fato é que o endividamento dos países do terceiro mundo
se transformou em suporte da especulação mundial. Por
causa do forte endividamento, os países tem necessidade
urgente de novos empréstimos para pagar suas prestações.
Assim o dinheiro se torna mercadoria sobrevalorizada.
Desta maneira aumenta a margem para a exploração, e o
lucro dos especuladores ficam cada vez mais garantido,
para prejuízo de quem trabalha para pagar suas dívidas.
A dívida externa se tornou o fator mais importante para
produzir a chamada "financeirização do capitalismo". Cada
vez mais, quem define hoje os rumos da economia não são
mais os empreendimentos produtivos, mas os detentores do
capital financeiro, que auferem os maiores lucros, não
pelo trabalho, mas pela exploração dos empréstimos
financeiros. O forte endividamento mundial fornece o
suporte para esta situação de especulação financeira.
As próprias instituições supra nacionais, criadas logo
após a segunda guerra mundial para regular a economia
mundial, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário
Internacional, acabaram se tornando avalistas da
agiotagem internacional.
E' urgente exorcizar os pressupostos desta
financeirização da economia. Uma prioridade evidente é
re-equilibrar os termos das condições de amortização dos
empréstimos, num arranjo que precisa produzir um consenso
mundial, respaldado por vontade política que recolha o
posicionamento firme que precisa ser costurado pela
consciência cidadã em todos os países.
A dívida externa funciona para os especuladores como o
diabo para os falsos pregadores. Sem ele, não teriam
argumento para seus pretensos milagres. Sem a dependência
causada pelo endividamento, os agiotas não teriam tantas
oportunidades de exploração. Mas o pior é que o diabo
pode ser fruto de fantasia, mas a dívida é real, e a
especulação fatura alto em cima dela.
O primeiro suporte a ser removido é de ordem ideológica.
Atribuir a regulação da economia à "mão invisível do
mercado" é reafirmar o equívoco do determinismo
histórico. E' eximir o processo histórico das
responsabilidades humanas. E' colocar na conta de
pretensas casualidades o que é astutamente tramado nos
bastidores da corrupção, que produz os arranjos que
canalizam as vantagens da economia para direções muito
bem orquestradas.
Estes arranjos que viciam a economia mundial acabam tendo
respaldo nos organismos oficiais, onde recebem ares de
legitimidade. A Organização Mundial do Comércio, por
exemplo, acaba expressando o resultado dos que detêm o
poder de impor suas vantagens, não a expressão do que
seria melhor para a economia de todos os países.
Se a história é feita, não pelo acaso, mas por aqueles
que a decidem, é cada vez mais urgente articular a
participação consciente da cidadania universal, que
precisa ser arquitetada com lucidez e determinação. Esta
a nossa responsabilidade.
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