Contra o crime, com Luiz!
05/10/2005
- Opinión
Foi num dia assim, como qualquer outro. Talvez ninguém mais se lembre,
faz tanto tempo. Sem dó nem piedade a gente do poder cometeu um crime
bárbaro. Com um golpe, apenas um golpe de mão, foram-se as sete quedas
de Iguaçu. Cenário da mais viva beleza que fazia do nosso país um
espaço único. A mágica queda das águas se perdeu num lago de barragem.
Crime perfeito, como já disse um poeta. "É necessário", diziam os
governantes. Com as sete quedas foram-se ainda milhares e milhares de
animais, plantas e gentes. Estas últimas, despejadas, alagadas,
tornadas viandantes, andarilhas, mendicantes. Bueno, gente pobre. Quem
se interessaria por sua sorte? Fariam o sacrifício em nome do
progresso. E naqueles tristes dias alguns poucos, os de sempre,
protestaram, gritaram, gemeram, clamaram e..nada. Tudo se deu!!!!
Agora vêm de novo os governantes, os homens do poder, a falar de
transposição do velho Chico. O rio São Francisco que corta Minas e
Bahia. Dizem eles que isso vai ser bom para a gente pobre do nordeste.
E tocam o coração dos mal informados. Se é para ajudar aos pobres,
quem será contra? Mas os homens do poder não falam das desapropriações,
dos sítios arqueológicos perdidos, das terras indígenas, da dor das
gentes ribeirinhas. Também não falam das idéias geniais para acabar
com a seca no nordeste que ficam trancadas nas gavetas, justamente
porque são boas demais e não trazem grandes custos aos cofres públicos.
Não! É preciso encher as burras das empreiteiras, movimentar a conta
bancária dos empresários da construção civil. Idéias de Bautista Vidal?
Não, esse cara é louco, dizem!!! É, louco, porque sabe como fazer,
porque não concede a nenhum filho da puta estrangeiro ou nacional.
O rio São Francisco é um espaço de vida que já está maltratado demais,
assoreado, poluído, ameaçado e já serve a cinco represas. É um rio
dadivoso que está se apagando, sugado pelas mentes doentias dos que
querem sempre mais e mais, dinheiro e poder. Agora, a proposta de
criar canais para desviar seu curso é a gota d'água da loucura do
poder. Como se não bastasse já estarem destruindo o curso de água que
representa a vida para milhares de seres que vivem nas suas margens
degradadas, ainda querem esparramar suas águas para outros cantos,
como se não houvessem outras saídas, muito mais baratas, inteligentes
e não-predadoras. E para que? Para ajudar os pobres? Não, as águas do
velho Chico serão desviadas para irrigar fazendas de agro-exportação,
de gente que planta monocultura para engordar vaca estadunidense. Que
ninguém se iluda. Os interesses não são os do povo pobre. Ou será que
alguém ainda acredita no coelhinho da páscoa?
É por isso que lá no meio do sertão, um homem, um bispo, um ser
comprometido com sua gente, está em greve de fome. Ele, na sua serena
pertinácia, é a denúncia viva do absurdo. Tal qual Gandhi, enfrenta a
violência com a paz, com o gesto poético de amor. Com a face tranqüila
e as palavras doces, é o retrato de uma gente que - a despeito de
todas as dores e dificuldades - nunca se entrega sem luta. Seu nome é
Luiz. Luiz Flávio Cappio. Que ninguém esqueça. Ele está disposto a dar
sua vida pela vida do rio e das gentes. Ele desvela, com sua decisão
singela, a truculência e a ignorância de um governo que se elegeu na
senda da esperança do povo, e que não está sendo digno.
As declarações do presidente Lula sobre a greve de fome do bispo
beiram ao patético. Vergonhosa figura que nos governa. Que esqueceu
sua origem, que olvidou sua classe, que se perdeu entre os tafetás e
as pompas da burguesia. Um presidente-escravo, servo das elites, do
capital. Triste figura que se apequena diante do humilde gesto do
religioso. A nós, agora, cabe unir nossas vozes ao desejo do bispo e
dos demais companheiros que estão se integrando no gesto extremo.
Fazer nossa parte, gritar, espernear, fazer outros gestos de amor que
impeçam o crime. O rio São Francisco tem que ficar onde está! Outras
saídas há para os fazendeiros e para as gentes do nordeste. Basta que
se tire das gavetas e se pense no bem comum. Governar para poucos tem
seu preço... e ele terá de ser pago, mais dia, menos dia... A história
é implacável e a verdade sempre vem...Todo apoio ao bispo Luiz. Não à
transposição do rio! Sim a vida do nordeste. As respostas existem e o
governo sabe onde buscá-las. Que busque!
E esse homem? Esse Luiz? Que seu gesto jesuânico, de dar a vida pelo
irmão, seja visto como uma luz...e que a gente o siga...salvando-o, e
a nós também!!!!
- Elaine Tavares - jornalista
https://www.alainet.org/pt/articulo/113148
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