Essas belas mulheres e seus corpos milionários
29/04/2006
- Opinión
Problema número um de saúde pública do século XXI, o tráfico de drogas é também o negócio que mais movimenta dinheiro em todo o mundo. Não se consegue calcular quantos infinitos milhões de dólares circulam de um lado a outro do planeta através do pó mágico da cocaína, da erva da maconha, das pílulas de ecstasy ou de outras substâncias químicas. Estas prometem aos deprimidos e entediados seres humanos o paraíso das sensações artificiais de bem-estar, euforia e prazer. Portanto, não têm preço. Ultimamente, no afã de transportar de um lado para outro as inebriantes drogas, o tráfico descobriu novo veículo: o corpo das mulheres. Não é de hoje que mulheres de todas as idades, de meninas quase crianças a senhoras respeitáveis, servem de "mula" para o tráfico. Ou seja, aceitam levar na bagagem um determinado contingente de droga em troca de remuneração (alta) a combinar. Agora, porém, parece que a bagagem não é mais meio de transporte tão seguro. A polícia anda alerta, os cachorros têm bom faro e a droga vai sendo descoberta mais frequentemente do que seria de desejar. As "mulas" acabam presas e o prejuízo para o traficante é enorme. Buscando um transporte mais imponderável e seguro, é agora nos próprios corpos femininos que a droga se aloja para chegar sã e salva a seu destino. Nas mais de dez mil mulheres que foram identificadas realizando esse tipo de ilegalidade na enorme via de mão dupla que se formou entre a América Latina e o hemisfério norte, quase 80% guardam o mesmo perfil: são jovens, bonitas e de classe média. Para carregarem seu precioso fardo, as belas moças aceitam fazer incisões cirúrgicas no próprio corpo, escondendo sob a pele mercadorias ilegais como cocaína e ecstasy. Pelo serviço, de acordo com a quantidade transportada e o tipo da mercadoria, recebem gordas quantias: nunca menos de US$ 1 mil podendo mesmo chegar a US$ 15 mil. Para carregar a cocaína elas entregam ao bisturi as coxas e os seios. Ali, naquelas partes do corpo feminino criadas e destinadas ao amor, ao carinho, à nutrição dos filhos, alojam-se quantidades gigantes de pasta de coca, que comprada a U$ 2000,00 o quilo em países latino-americanos podem chegar a ser revendidas na Europa por U$ 100 000. As cirurgias são realizadas em clínicas clandestinas bem escondidas em algum ponto de países latino-americanos. Dali as moças partem em direção à perigosa viagem que pode ser sem volta devido à carga milionária que levam nas entranhas. Já as pílulas de ecstasy se acomodam melhor no aparelho digestivo, seja no estômago ou no intestino, provocando graves distúrbios que afetam a saúde da mulher para sempre ou a levam inclusive à morte. A gravidade do fato espanta e provoca perguntas que não querem calar. Como mulheres jovens e bonitas são seduzidas pelos traficantes? Por que uma moça jovem e bela, que teria tudo para ter uma vida intensa e realizada procura tal descaminho deixando retalhar o próprio corpo para transportar droga. A resposta, veiculada recentemente por importante revista brasileira, torna ainda mais triste o fato já de si tão tenebroso. O tráfico em geral consegue aliciar as mulheres que têm algum ponto vulnerável ao nível dos afetos, ou estão passando por algum momento difícil em suas vidas. Os aliciadores do tráfico ganham por cada mulher recrutada, o que os estimula a investir na busca da quantidade cada vez maior para gerar lucros expressivos. Aonde vão eles buscar suas vítimas? Em shopping centers, filas de emprego e até mesmo portas de hospitais. Nesses lugares, seu olhar cúpido poderá identificar mulheres bonitas que sonhem conhecer o exterior, mas não possuam recursos suficientes para tal. Ou então mães solteiras com filhos doentes sem recursos para tratá-los. Essas parecem as mulheres mais fáceis de serem convencidas. A angústia com a vida dos filhos as podem levar facilmente a procurar saídas desesperadas como transformar o próprio corpo em lugar de carga para a droga sem pensar nas conseqüências. Muitas igualmente estavam desempregadas ou sem atividade regular remunerada. O desespero de não ter como garantir a sobrevivência as faz dizerem sim à proposta do traficante. O ingrediente da beleza corre por conta de poder mais facilmente captar a benevolência da polícia ou de outras instancias que pudessem impedir a conclusão da ilegalidade. Mulheres bonitas têm mais chance de burlar a fiscalização. Dignas de toda compaixão são essas belas "mulas" que vendem seus corpos e sua dignidade em um tipo de prostituição mais vil do que qualquer outro. Mas digna de toda indignação ética é a situação de uma humanidade que leva mulheres criadas por Deus para o amor e a maternidade a buscar um salto qualitativo na vida através de desvio tão profundo e equivocado! - Maria Clara Lucchetti Bingemer é teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, e autora de "A Igreja e os intelectuais: contribuição para a construção da sociedade" (EDUSC), entre outros livros. (wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape)
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