Os novos e perigosos apocalípticos
17/08/2006
- Opinión
Os dias conturbados atuais estão provocando uma onda de apocalípticos que vão dos simples cristãos da Igreja dos Santos dos Últimos dias até o Presidente Bush dos EUA. Também não é para menos. Textos apocalípticos do Novo Testamento parecem descrever a atualidade:"Ouvireis falar de guerras e notícias de guerras mas não vos perturbeis porque é preciso que isso aconteça; mas ainda não é o fim. Uma nação se levantará contra a outra e um reino contra outro e haverá fome e peste e terremotos em diversos lugares: mas isso é o começo dos sofrimentos… Depois da tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará sua claridade, as estrelas cairão do firmamento e as potências do céu serão abaladas"(São Mateus 24,4-8.29).
A situação atual parece coincidir com esta situação. Nossa geração criou, pela primeira vez na história humana, os meios de sua completa destruição através de armas químicas, biológicas e nucleares. Os efeitos das bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki e o acidente da usina atômica de Tschernobyl nos deram os terríveis sinais de uma Terra completamente devastada e inabitável para os seres humanos. Logicamente grande parte do sistema-vida (95% é invisível), feita de microorganismos, bactérias, fungos e virus continuaria quase indiferentes ao nosso trágico destino. Nós, porém, teríamos sido banidos do cenário da evolução.
Importa, entretanto, anotar uma diferença entre os apocalípticos bíblicos e os apocalípticos atuais. Apocalipse significa "revelação" acerca dos últimos dias. A exegese crítica e ecumênica tirou a limpo que os textos apocalípticos do Novo Testamento não são uma reportagem antecipada do fim. É um gênero literário e uma maneira de ver para mostrar que, no confronto irrefragável entre o bem e o mal, o bem triunfará. Podem cair estrelas do céu e se convulsionarem as energias cósmicas, Deus garantirá o fim bom da história.
Os apocalípticos atuais se baseiam em dados empíricos. Não se trata de um modo de dizer ou de uma metáfora, mas da identificação de fatores destrutivos capazes de pôr fim ao ensaio planetário humano. Por isso precisamos estar atentos, desenvolver muita sabedoria e amor à vida e à Terra para escaparmos desta eventual catátrofe. Será que teremos que admitir o que escreveu o economista ecólogo romeno-norte-americano Nicolas Georgescu-Roegen? "Possivelmente o destino humano", diz ele, "seja levar antes uma vida curta, fogosa, nervosa e estravagante do que uma existência longa, sem história e vegetativa. Deixemos que outras espécies como as amebas que não possuem nenhuma ambição espiritual herdem esta Terra e continuem banhando-se na plenitude da luz solar". Custa-nos aceitar este destino trágico. Preferimos entender o sentido do ser humano como momento do processo global, pelo qual este chegou à consciência e à amorização. Ele está em transição e não face à uma tragédia.
Os apocalípticos fundamentalistas atuais combinam os relatos bíblicos metafóricos com os empíricos e tiram suas conclusões. Como Reagan, Clinton e Bush acreditam no Armagedom, aquele lugar mítico do confronto final entre o bem e o mal. Segundo eles os EUA seriam os emissários de Deus para representar o bem e fazer guerra infinita ao mal. Estes que assim acreditam, podem pôr a humanidade diante de um terrível risco. Que mais nos resta senão rezar?
- Leonardo Boff é Teólogo.
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