Movimentos africanos lançam articulação contra multinacionais

24/01/2007
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Organizações de cerca de 20 países lançaram nesta quarta (24) a Rede Africana da Água, uma declaração de guerra ao processo de privatização da gestão e das concessões de água às multinacionais européias. Falta de acesso de pobres e comunidades rurais à agua potavel e saneamento é causa freqüente de doenças e mortes.

Nairobi - Para as culturas ocidentais, pode ser um pouco difícil entender a relação entre escassez de água e violência doméstica. Mas, na África, onde a mulher é responsável por administrar o lar, em comunidades rurais onde se anda 20 quilômetros para buscar água e, mesmo assim, por vezes, se volta sem, espancamentos e até assassinatos de mulheres pelos homens, quando não foi possível cozinhar ou lavar a roupa, não são incomuns.

Pagamento pré-pago de água, da mesma forma que se carrega um celular no Brasil, é outro fenômeno de difícil compreensão para nós, mas que vem crescendo no continente. O sistema foi implantado primeiramente na África do Sul pela multinacional francesa Suez, que também ganhou na justiça o direito de exigir do governo o fechamento de todas as fontes públicas de água, argumentando concorrência desleal.

O caso do sistema pré-pago de água permite à gestora do recurso bloquear o fornecimento assim que se esgotaram os créditos pagos, o que tem deixado as famílias mais pobres, como as do bairro de Soweto, em Johanesburgo, sem água para banho e banheiro por semanas, criando uma situação de insalubridade sanitária extrema.

Outro drama advindo do apoderamento da água por empresas privadas é a extinção de rios ou sua completa privatização por grandes mineradoras multinacionais. Em países como Gana, Burkina Faso, Mali e Senegal, por exemplo, estas mineradoras têm recebido concessões de exploração ou de todo o curso ou das fontes nas montanhas, onde atuam, o que mata os rios e deixa comunidades interiras sem água ou com água extremamente contaminada. Em Gana, quatro rios já secaram completamente por conta da atividade mineira.

O processo de privatização da gestão dos recursos hídricos na África tem se acelerado com a política de financiamento de obras sanitárias por parte do Banco Mundial e do FMI, cujas condicionalidades contratuais incluem a gestão privada dos serviços de saneamento e água potável, explica o representante de Burkina Faso. Também fazem parte destes contratos cláusulas de risco zero para as empresas – o que leva o governo a reprimir mobilizações e organizações populares que questionem o sistema, para que não seja obrigado a ressarcir perdas econômicas.

Rede Africana pela Água

A articulação de organizações e movimentos sociais que lutam contra a privatização da água e pela gestão pública e participativa dos serviços de saneamento teve início no final do ano passado, já com vistas ao Fórum Social Mundial de Nairobi. Durante os últimos três dias, as várias questões envolvendo o tema foram vastamente discutidas em atividades propostas por cerca de 20 países que, nesta quarta (24), lançaram a Rede Africana pela Água e definiram uma plataforma de cinco pontos que deve orientar as lutas continentais daqui para frente:

Luta contra a privatização da água, assegurar o controle participativo e público da gestão dos recursos hídricos, oposição a todas as formas de sistema pré-pago, assegurar que o direito à água seja inserido nas Constituições de todos os Estados, e assegurar que o provisionamento de água esteja sob domínio público.

Atualmente, são majoritariamente as empresas francesas Vivendi, Suez e Saur, e a britânica Biwather, que têm atuado nas suas ex-colônias. A crescente pressão sobre estas multinacionais tem levado a tentativas de negociação com as maiores organizações de defesa da água, mas os movimentos sociais, que estão articulando um grande encontro continental paralelo ao próximo Fórum Mundial da Água (evento empresarial que acontece em Istambul, Turquia, em junho deste ano) deve reforçar os movimentos de resistência.

“O lançamento desta rede deveria colocar em alerta os privatizadores de água, os governos e as multinacionais de que os africanos vão resistir às privatizações”, avisou, no final do ato de lançamento, o representante de Gana, Al Hassan Adam.

Fonte: Carta Maior

http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13373

https://www.alainet.org/pt/articulo/118932
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